Por Arthur Cagliari e Victor Rezende
Valor — São Paulo
13/03/2024 15h22 Atualizado há 17 horas
A sensação de que o câmbio não se mexe, com o dólar preso no intervalo entre R$ 4,90 e R$ 5,00, vai além de uma mera percepção. A volatilidade realizada do real atingiu a mínima em pouco mais de quatro anos em fevereiro e, agora em março, alcançou níveis ainda mais baixos. E as perspectivas continuam a apontar para um câmbio bem comportado no mercado brasileiro, já que a volatilidade implícita da moeda brasileira para um mês, por exemplo, está tão baixa que já se assemelha aos níveis sustentados pelo iene japonês.
A volatilidade implícita é um indicador que parte dos preços de derivativos e que serve como um termômetro para se saber a variação projetada da moeda em um determinado período à frente. Já a volatilidade realizada é uma métrica que avalia a variação de uma moeda em um período que já passou.
Ao menos até agora o ano de 2024 tem sido bastante estável na dinâmica do câmbio. A volatilidade realizada do real ficou, em média, em 9,26% em janeiro e em 8,38% em fevereiro, o menor nível mensal desde dezembro de 2019. E, ao menos até agora, o mês de março caminha para ter ainda menos instabilidade no câmbio, ao estar em 6,63% até ontem.
“Quando olhamos os fundamentos do real, eles são muito positivos. A balança comercial está forte; o déficit em conta corrente deve ser menor do que 1% [do PIB] neste ano; e ainda temos um diferencial de juros atrativo”, diz o diretor da tesouraria do Travelex Bank, Marcos Weigt. “Fora que estamos vendo uma queda geral da volatilidade dos ativos de risco do mundo todo. Isso principalmente após ficar claro que o Federal Reserve (Fed) não iria mais elevar os juros e poderia iniciar os cortes das taxas por lá”, afirma. “Não sabemos quando eles vão reduzir os juros, mas eles vão reduzir. Isso dá uma segurança e ajuda os ativos de risco.”
Diante desse ambiente que ajuda a conter a movimentação do real, Weigt aponta que a volatilidade da moeda brasileira se assemelha a de outros mercados, que são reconhecidos por serem bastante estáveis. “Está surpreendendo o real ter uma volatilidade que se assemelha ao iene japonês. É algo inusitado”, diz. “O iene tinha uma volatilidade histórica abaixo de 5% em 2021. No ano seguinte subiu para quase 12% e agora está em 7,5%, bem perto do real”, acrescenta.
A queda da volatilidade da moeda tende a beneficiar o real neste momento de diferencial de juros ainda bastante alto. Quando o investidor busca operar o “carry trade”, ao tomar dinheiro em um lugar com juros mais baixos para aplicar em um mercado com juros mais altos e, assim, ganhar na diferença, ele costuma acompanhar a volatilidade da moeda, já que movimentos bruscos tendem a limitar os ganhos – sendo assim a chamada estratégia “carry-to-vol”. Para Weigt, “o real se mantém atrativo se conseguir manter a volatilidade realizada de 30 dias abaixo de 12%”.
Se não fossem o prêmio de risco e as incertezas sobre o fiscal, o real poderia estar em níveis até mais baixos, na visão do executivo da Travelex. “Nos últimos meses, apesar dos fundamentos positivos da moeda, há incertezas criadas pelo governo, seja com intervencionismo na Petrobras e na Vale; seja com menções a mais gastos, mas nenhuma proposta de cortes”, diz. “Com esse contraponto [no lado das incertezas], o mercado fica ‘de lado’, porque, embora tenha motivos para o real valorizar, há também razões para desvalorizar.”
Na visão da chefe de estratégia de câmbio e juros para Américas do Barclays, Andrea Kiguel, o ambiente segue construtivo para o real. Ela, porém, elenca fatores altistas e baixistas no comportamento da moeda brasileira, que têm feito o real se manter em níveis comportados e com volatilidade reduzida nos últimos meses. As projeções do Barclays, inclusive, apontam para uma estabilidade da moeda. O banco espera que o dólar encerre 2024 cotado a R$ 4,90, nível próximo ao que tem sido negociado neste início de ano, e que chegue a R$ 4,75 no primeiro trimestre de 2025.
No campo favorável ao câmbio doméstico, Kiguel cita um ciclo de redução da Selic “lento e constante”, que evita uma erosão acelerada do diferencial de juros, e um “forte histórico” nas contas externas, além do contexto de aumento estrutural da produção de petróleo. “Achamos que a narrativa deve servir de âncora para a taxa de câmbio real no médio prazo, impulsionada, também, pela história agrícola”, diz.
A estrategista, porém, ressalta que os vetores positivos não são suficientes para dissociar a dinâmica do real do contexto mais amplo do dólar no curto prazo e, assim, o Barclays espera que o câmbio doméstico continue ligado à narrativa global, “da qual raramente se dissocia”. “Mas a história do petróleo proporciona uma compensação para fatores negativos, e esperamos, por enquanto, um desempenho mais forte do real em relação aos seus pares, apoiado, também, pelo ‘carry’ elevado e pelo Banco Central cauteloso.”
Fonte: Valor Econômico

