Os títulos emitidos por alguns dos países mais pobres do mundo têm tido os melhores desempenhos nos mercados de dívida soberana este ano, ignorando o impacto das altas taxas de empréstimos nos EUA, que frequentemente assustam os investidores em economias mais arriscadas.
Bônus soberanos de mercados emergentes, denominados em moedas estrangeiras – principalmente em dólar – e com classificação “junk” (de alto risco) de BBB ou inferior, entregaram um retorno total de 4,9% ao investidor neste ano. Isso se compara a uma perda de 3,3 % de um índice de Treasuries dos EUA.
Os ganhos vieram à medida que a resiliência da economia global surpreendeu investidores, enquanto preços mais altos de commodities beneficiaram países como os exportadores de petróleo Nigéria e Angola e o produtor de cobre Zâmbia. Enquanto isso, o apoio de credores como o FMI ajudou aqueles em dificuldades financeiras ou em “default”, como Sri Lanka e Zâmbia.
“Os mercados emergentes se saíram muito melhor do que qualquer um esperava”, disse David Hauner, chefe de estratégia de renda fixa de mercados emergentes globais no Bank of America.
“Claramente, o componente de crédito dos títulos soberanos de emergentes se saiu bem porque os fundamentos econômicos têm melhorado”, acrescentou, referindo-se ao prêmio que investidores exigem para manter dívidas mais arriscadas em vez de Treasuries.
Rendimentos mais altos dos títulos nos EUA e na Europa geralmente são um problema para países em desenvolvimento, porque o capital é atraído de volta aos mercados domésticos com o aumento dos retornos ali, e porque o custo de refinanciamento da dívida em dólar ou euro sobe.
Neste ano, investidores retiraram cerca de US$ 12 bilhões de fundos de dívida de emergentes, enquanto buscam retornos em outros lugares, por exemplo, em fundos de dívida de alto rendimento dos EUA, que tiveram entradas líquidas de US$ 2 bilhões, segundo o J.P. Morgan.
No entanto, alguns investidores acreditam que essas saídas estão prestes a se reverter, especialmente se a perspectiva para as empresas dos EUA piorar.
“À medida que o capital flui de volta aos mercados emergentes, isso deve ser favorável para a classe de ativos. Em contraste, a maré que elevou o mercado de alto rendimento dos EUA está diminuindo”, disse Grant Webster, co-chefe de mercados emergentes e soberanos na gestora de investimentos Ninety One.
A resiliência nas economias emergentes ocorreu ao lado do progresso nas reformas domésticas e nas negociações de reestruturação em diversos países.
Os títulos da Argentina estiveram entre os melhores desempenhos, com ganhos de 39% no acumulado do ano, à medida que os investidores receberam bem o pacote de austeridade radical e desregulamentação do presidente Javier Milei.
Enquanto isso, os títulos em dólares de Sri Lanka, Gana e Zâmbia entregaram todos retornos de dois dígitos este ano, à medida que entram na fase final do processo de reestruturação.
“Os países mais frágeis nos mercados emergentes estão se tornando menos frágeis”, disse Paul Greer, gestor de portfólio de dívida de mercados emergentes da Fidelity International. “Muito disso se deve a reformas e mudanças de políticas domésticas.”
O apoio significativo do FMI e de outros credores oficiais nos últimos meses também ajudou, reduzindo a probabilidade de mais defaults de dívida soberana este ano, dizem os investidores.
O credor aumentou o tamanho de seu empréstimo de resgate ao Egito para US$ 8 bilhões, enquanto os Emirados Árabes Unidos investiram US$ 35 bilhões para ajudar o país a enfrentar consequências da guerra em Gaza. No mês passado, o fundo aprovou a liberação da última tranche de US$ 1,1 bilhão de um empréstimo de resgate de US$ 3 bilhões ao Paquistão.
“Egito, Paquistão e Quênia eram os três grandes vencimentos aguardados em 2024, mas não são mais vistos como tendo um alto risco de default”, disse Kevin Daly, diretor de investimentos da Abrdn.
Greer, da Fidelity, disse que o acesso para parte da dívida de economias de fronteira também melhorou, com Costa do Marfim, Quênia, Benin e El Salvador acessando os mercados internacionais este ano, “algo impensável há quatro meses”.
O forte desempenho de alguns países emergentes de alto rendimento ajudou a elevar o índice de títulos soberanos de mercados emergentes em moeda estrangeira do J.P. Morgan em 1,4%. Isso se compara a uma queda de 3% para um índice de títulos globais de alto grau.
O desempenho robusto ocorre apesar das previsões do FMI de que o crescimento econômico nos mercados emergentes será ligeiramente menor neste ano do que no passado.
Os títulos de mercados emergentes em moeda local sofreram mais do que seus pares em dólar. A força da moeda dos EUA pesou sobre os retornos para os investidores ocidentais e limitou a capacidade de outros bancos centrais de reduzir as taxas de juros sem correr o risco de uma ressurgência da inflação.
O índice de mercados emergentes em moeda local do J.P. Morgan caiu 2,2 % este ano, com algumas das maiores quedas no Chile, Turquia e Tailândia. Os títulos na Indonésia caíram 3% desde janeiro, após um aumento surpresa na taxa de juros no fim de abril, para 6,25 %.
Ainda assim, Hauner, do BofA, disse que a venda foi relativamente contida e que, embora os retornos pareçam ruins em termos de dólar, “muitos investidores na Europa e no Japão ainda estão satisfeitos com sua dívida de emergentes”.
fonte: valor econômico

