O culpado talvez seja o vírus sincicial respiratório, conhecido como RSV, que está aumentando nesta temporada
Por Kimiko de Freytas-Tamura e Nate Schweber
23/12/2022 | 05h00
NOVA YORK – Há quase um mês Sean Merriam está andando pela cidade com o nariz entupido e uma tosse misteriosa que continua batendo nos pulmões. Ele sabe que não é covid-19, porque faz exames regularmente, e que não é gripe, da qual se recuperou algumas semanas atrás.
O culpado talvez seja o vírus sincicial respiratório, conhecido como RSV, que está aumentando nesta temporada, mas ele não tem certeza. Pode ser qualquer coisa, na verdade.
“Passo por períodos em que acho que já passou, depois fico tossindo e penso, é, ainda não passou”, disse Merriam, 55 anos, editor de vídeo que ofegava pelo McCarren Park, no Brooklyn, na quinta-feira. “Simplesmente não vai embora”.
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Seu vírus misterioso está entre um redemoinho de doenças que atacam os nova-iorquinos neste inverno com sintomas desconcertantes e lastimáveis – um coquetel tóxico agravado por apartamentos, vagões de metrô e salas de aula apertados, onde as máscaras agora são opcionais.
Diante de um ataque tão implacável, os nova-iorquinos parecem ter emoções confusas, sentindo-se apreensivos, cansados e resignados a um novo “novo normal”. Eles estão vivendo não apenas entre o coronavírus e suas variantes aparentemente intermináveis, mas também com um monte de outros vírus. Especialistas em doenças infecciosas notaram que outras doenças respiratórias, como rinovírus e adenovírus, também estão circulando.
“Tem sempre uma doença por aí”, disse Lester Sykes, 35 anos, que mora no bairro de Bedford-Stuyvesant, no Brooklyn, e que estava passeando com Raja, seu cachorro. “Todo mundo está hiperconsciente da saúde agora”, disse ele.
“Tudo tem a ver com as sensações que você tem até ficar doente”, disse ele. “Então, quando você fica doente, você tem que lidar com a situação”.
De acordo com dados da cidade, o número de casos de covid aumentou cerca de 31% desde o Dia de Ação de Graças e agora está em cerca de 3.600 por dia. O número total de casos é muito maior, porque esse número não inclui testes feitos em casa, que agora são predominantes. Enquanto isso, os casos de gripe dispararam nas últimas duas semanas e estão em níveis mais altos do que em qualquer outro momento desde 2018. Uma boa notícia: o RSV parece ter atingido o pico em meados de novembro e está em declínio, embora seus níveis ainda estejam altos.
Embora as autoridades municipais recomendem que os nova-iorquinos usem máscaras em espaços públicos internos, poucos estão atendendo a esse apelo. A frequência escolar também permanece relativamente alta, embora tenha caído um pouco recentemente. Restaurantes e cafés estão cheios e os escritórios não mostram sinais de fechamento. As pessoas ainda vão ao cinema, bares e casas de shows.
Ainda assim, os pais e mães estão preocupados, especialmente os de crianças que nasceram no início ou durante a pandemia, quando o lockdown as protegeu de germes e pode tê-las deixado mais vulneráveis à atual safra de vírus.
As duas filhas de Merriam, 10 e 13 anos, tiveram coronavírus e gripe. Ele nunca se preocupou com a faringite estreptocócica, mas agora que a doença está no noticiário – após casos fatais na Grã-Bretanha, onde quase 20 crianças morreram de estreptococo A, uma infecção bacteriana que causa faringite estreptocócica – ele está mais atento.
O Dr. Matthew Harris, médico da Northwell Health especializado em medicina de emergência pediátrica no Cohen Children’s Medical Center em Queens, disse que a gripe e o RSV apareceram mais cedo do que o esperado no outono e em maior volume e gravidade. O RSV historicamente começa a atingir o pico em meados de novembro e permanece até a primavera, disse ele, mas este ano o vírus chegou um mês antes.
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O RSV foi a causa viral predominante de internação no Cohen, seguido pela gripe, disse ele, enquanto a covid não foi um contribuinte significativo. Nos últimos sete dias, disse ele, o hospital atendeu em média 260 crianças no pronto-socorro diariamente e está operando entre 105% e 120% da capacidade.
Ele acrescentou que muitas crianças vieram com vários vírus ao mesmo tempo, por exemplo, uma combinação de gripe e coronavírus.
“Provavelmente, parte disso tem a ver com o fato de que as crianças agora estão sendo expostas a vírus aos quais não tiveram nenhuma exposição imunológica nos últimos dois anos, por causa das máscaras e do distanciamento social e assim por diante”, disse Harris. “A própria natureza dessas doenças virais mudou por causa das estratégias de mitigação que foram adotadas”.
No hospital Cohen, os funcionários estão “sobrecarregados”, disse ele, com o aumento de visitas e internações em pronto-socorro e precisam lidar com a escassez de pediatras, uma tendência nacional.
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“A porcentagem de crianças que precisam de internação na UTI não é substancialmente maior do que no passado”, acrescentou ele, “mas o número total de crianças que aparecem está muito além de qualquer coisa que eu já tenha visto. Posso dizer que, se você olhar para os últimos dez anos de nosso hospital infantil, os sete dias mais movimentados foram no último mês”.
Judith Cabanas, 28 anos, mãe de dois filhos que mora em Astoria, Queens, disse que está ansiosa porque seu filho de 5 anos, Benjamin, está doente há meses.
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“Toda semana ele fica doente, com febre, tosse, coriza”, disse ela. “Estou assustada”.
Cabanas teve de manter Benjamin em casa e disse que precisa procurar Tylenol infantil no Facebook, porque o produto está esgotado nas farmácias. Embora esteja aliviada por sua filha de 2 anos, Lily, parecer saudável até agora, ela espera que a temporada piore.
“Só quero que o inverno acabe”, disse ela.
Este artigo foi publicado originalmente no New York Times. /TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU
Fonte: O Estado de S. Paulo