O Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil deve apresentar nova desaceleração relevante no dado do terceiro trimestre, que será divulgado nesta quinta-feira, 4, pelo IBGE. A expectativa mediana de 70 instituições financeiras e consultorias ouvidas pelo Valor é de crescimento de 0,2% da atividade entre julho e setembro, com ajuste sazonal, após subir 0,4% no segundo trimestre e 1,3% no primeiro. A dispersão das estimativas é grande, de queda de 0,5% a alta de 1,4%.
Em relação ao terceiro trimestre de 2024, a mediana de 68 estimativas indica alta de 1,7%, com projeções variando de 0,3% a 3,2%. Na comparação com igual período do ano anterior, o PIB vem crescendo a um ritmo acima de 2% desde o segundo trimestre de 2022, registrando a 4,4% no primeiro trimestre de 2023 e a 4% no terceiro trimestre de 2024.
Para 2025, a expectativa mediana é de crescimento de 2,1% e, para 2026, de 1,8%. O PIB anual do Brasil cresce pelo menos 3% desde 2021, após o choque da pandemia em 2020.
“Para o segundo semestre de 2025, começamos a ver uma desaceleração mais evidente”, diz Cecilia Machado, economista-chefe do banco Bocom BBM, que tem projeção em linha com a mediana para o PIB do terceiro trimestre. “A desaceleração expressiva é combinação de uma expansão fiscal mais limitada do que em anos anteriores, ainda que haja programas sendo ampliados e criados, com a restrição de política monetária”, afirma.
Pelo lado da oferta, a agropecuária deve recuar 1,8% no terceiro trimestre, ante o segundo, refletindo a sazonalidade do setor, cujo efeito no PIB se concentra na primeira metade do ano. No primeiro trimestre de 2025, por exemplo, a agropecuária cresceu 12,3%, em relação aos três meses imediatamente anteriores. Na comparação com 2024, o agro deve desacelerar das taxas de crescimento ao redor de 10% na primeira metade deste ano, mas ainda cresceria 5,1% pela mediana das projeções.
Não vejo os investimentos tendo outra variação negativa”
A indústria deve desacelerar para uma alta de 0,3% de julho a setembro, na comparação trimestral. De abril a junho, a atividade cresceu 0,5%. “É o setor mais penalizado pelas condições monetárias muito restritivas, pelo tarifaço dos Estados Unidos”, diz João Savignon, economista da Kínitro Capital.
Segundo ele, o desempenho deve ser heterogêneo entre os componentes da indústria no terceiro trimestre. A extrativa, diz, pode ter queda, mas porque a base de comparação ficou muito elevada. O segmento de “utilities” (eletricidade, gás, água, esgoto e gestão de resíduos) também deve recuar no terceiro trimestre, segundo Savignon. “A transformação pode ter um ligeiro crescimento, enquanto a construção deve continuar próxima da estabilidade”, afirma.
Vitor Vidal, economista e fundador da consultoria VVC, tem uma projeção mais alta para o PIB do terceiro trimestre, de 0,4% e diz ver a indústria crescendo 0,8%. O número conta com a indústria de manufatura voltando a um nível parecido com o que fechou em 2024. “A mesma coisa vale para a construção civil e para utilidade pública. A estrela do ano, que foi a extrativa, parece que parou de crescer naquelas taxas mais fortes”, afirma.
Os serviços devem apresentar resiliência, sobretudo por causa do mercado de trabalho apertado, mas com desaceleração para alta de 0,4%, após subirem 0,6% no segundo trimestre, de acordo com a mediana das estimativas.
“O mercado de trabalho aquecido acaba sustentando a expansão da massa de rendimentos. Além disso, vimos alguns estímulos no período de liberação de precatórios, e o segmento de transportes ainda teve impulso junto com a safra de grãos”, afirma Savignon. Ele tem uma projeção para o PIB do terceiro trimestre na mediana, mas uma previsão para serviços até mais forte, de 0,7%. “Alguns itens vão se destacar, como serviços de informação e de intermediação financeira. Já o comércio é o elo mais fraco e pode ser negativo”, diz.
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Savignon estima que, sem considerar a contribuição negativa do agro, o PIB do terceiro trimestre subiria 0,4%, como observado de abril a junho. Ele lembra que, tradicionalmente, o IBGE anuncia revisões na série na divulgação do PIB do terceiro trimestre. “Houve revisões significativas ao longo do ano da projeção de safra, o que pode levar a ajustes no PIB do primeiro e do segundo trimestre. Se tiver um resultado anterior maior, o número agora pode ser menor”, pondera Savignon.
Também no sentido de resiliência, economistas acham que o consumo das famílias deve desacelerar pouco no terceiro trimestre, para 0,4%, de 0,5% no segundo – mas, no primeiro trimestre, chegou a subir 1%.
“A política monetária bate no crédito e esse crédito bate na indústria, por exemplo, principalmente na intensiva em capital. Mas quando eu olho os dados de demanda, vemos que ela está ainda relativamente aquecida. Mesmo com o capital mais caro, a demanda da economia, principalmente pensando em renda e trabalho, continua boa”, afirma Vidal.
Os dados de crédito, diz, mostram que o consignado privado, por exemplo, começou a “pegar corpo” e que a oferta de crédito subiu para grandes empresas. O endividamento das famílias, aponta, tem inércia e demora um pouco para fazer efeito maior na demanda. “O Brasil não é Estados Unidos nem Europa, a ponto de a política monetária subir juros e ter um repasse em preços de crédito muito rápido”, diz Vidal.
Ainda pela ótica da demanda, o consumo do governo, por outro lado, deve compensar a queda de 0,6% do segundo trimestre e subir 0,7% no terceiro, de acordo com a mediana das projeções.
A Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) – medidas para os investimentos no PIB – também deve apresentar uma devolução, ainda parcial, da queda de 2,2% observada no segundo trimestre ao subir 0,7% no terceiro, pela mediana. “Não vejo os investimentos tendo outra variação negativa. No primeiro trimestre, o efeito de [compra de] plataformas de petróleo puxou muito o dado para cima. Isso foi seguido de queda muito forte no segundo trimestre. Teremos um pouco de uma volta, até pelos dados da construção civil, que é muito calcada em trabalho e capital”, diz Vidal. No primeiro trimestre de 2025, a FBCF havia crescido 3,2%, em relação aos três meses imediatamente anteriores.
Por fim, o setor externo deve dar uma segunda contribuição positiva para o PIB, já que a estimativa é de exportações crescendo 3,2% no terceiro trimestre, ante o segundo, e importações avançando menos, 1,3%. “As exportações foram favorecidas pelas vendas de milho. As importações também mantêm um desempenho ainda robusto, mas menor do que as exportações”, diz Savignon, da Kínitro. No segundo trimestre de 2025, as exportações haviam crescido 0,7%, enquanto as importações caíram 2,9%.
Olhando à frente, a mediana das projeções indica nova desaceleração do PIB, para apenas 0,1% no quarto trimestre. “São números pequenos e próximos no terceiro e no quarto trimestre”, diz Machado, do Bocom, ponderando que a sazonalidade de fim de ano até pode surpreender um pouco para cima.
Para Vidal, os dados já divulgados mostram uma aceleração no quarto trimestre, principalmente da indústria. Já os serviços, diz, devem apresentar inércia. E até a agropecuária pode fazer a diferença, segundo ele. “Ao contrário de outros períodos, ao longo de 2025, a safra não está sendo tão fraca no segundo, terceiro e quarto trimestres”, afirma. Por isso, ele projeta alta de 0,5% no PIB do quarto trimestre, ante o terceiro.
Vidal diz que, se o PIB do terceiro trimestre mostrar uma economia ainda muito calcada em serviços, que pode demorar a desacelerar, isso terá impacto no número do quarto trimestre e, consequentemente, no PIB de 2026.
A Austin Rating projeta contração de 0,5% no PIB do terceiro trimestre de 2025 e queda de 0,1% no quarto, o que, se realizado, configuraria recessão técnica.
Apesar de a renda seguir relativamente alta, alguns indicadores mostram que o consumo das famílias, por exemplo, está começando a perder ímpeto, por causa do endividamento, gerando comprometimento de renda, afirma Rodolpho Sartori, economista da Austin Rating. “Isso em algum momento vai ter que chegar às famílias em termos de consumo”, diz ele, projetando queda de 0,3% para o consumo das famílias já no terceiro trimestre do ano.
Fonte: Valor Econômico
