A divulgação do projeto de lei de diretrizes orçamentárias (PLDO) para 2025 em meados de abril foi uma mudança de jogo para um cenário que aparentava ser benigno para o Brasil, segundo Luis Stuhlberger, executivo-chefe (CEO) e de investimentos (CIO) da Verde Asset. Em apresentação a investidores nesta terça-feira, o gestor disse que as estimativas de gastos e receitas versus o crescimento da economia fizeram do plano fiscal uma “peça de ficção”.
“A gente via o governo petista, com o Lula falando para a plateia” comentou. “Mas o [ministro da Fazenda Fernando] Haddad vinha segurando as pontas. E o governo fez um arcabouço fiscal que o mercado acreditou”, afirmou. “Eu me penitencio por ter acreditado que o PT poderia minimamente ter alguma seriedade fiscal para valer.”
O ciclo de reformas realizadas pelos governos dos antecessores Michel Temer, Jair Bolsonaro e mesmo por Luiz Inácio Lula da Silva no início do terceiro mandato tinha pavimentado um ambiente relativamente positivo para o país, com desinflação significativa, aceleração da demanda por crédito, contas externas em “ótimo estado e evidências de um PIB potencial maior”, listou Stuhlberger. “Mas voltamos ao risco fiscal. A grande facilidade para alterar o arcabouço colocou em xeque a sua credibilidade.”
Para um PIB esperado de 2% a 2,5%, o governo calculou que as receitas seriam equivalentes a 3,5%, e “logo, posso gastar o máximo do arcabouço”. Aquilo que antes ele considerava ruído, parece agora ser sinal, com a percepção de que o governo vai lançar mão de todo e qualquer esforço para ganhar as eleições, “pode rasgar o arcabouço, ele é uma peça de ficção”.
O extinto teto de gastos já tinha sido derrubado por “culpa não só do PT, o governo Bolsonaro fez uma boa parte disso”. As despesas do Brasil pelo teto seriam de R$ 1,9 trilhão e este ano já vão rodar a R$ 300 bilhões acima disso. Para gastar a mais, receitas adicionais tiveram de ser criadas, chegando a R$ 150 bilhões, com algumas de caráter transitório, como foi a antecipação de impostos dos ganhos auferidos em fundos fechados exclusivos e restritos e dos veículos fora do Brasil (“offshore”).
Ele citou o Bolsa Família para gestantes, crianças e adolescentes, pagamento “fast track” de precatórios, reajuste do salário mínimo acima da inflação, o programa Pé de Meia para 3,7 milhões de estudantes ganharem um bônus em dinheiro na conclusão do ensino médio.
“É um bom programa social, não vou criticar, mas é eleitoreiro, e é fabuloso. Você tem 17 anos de idade, só tem que fazer Enem, pode até tirar zero, o que estatisticamente não é possível, e vai ganhar no dia que fizer, na véspera da eleição, um cheque de R$ 3 mil. Em quem você vai votar? É um negócio que é feito com o dinheiro dos nossos impostos.” Em tempos de perda de popularidade, “Lula pensa todos os dias do ano como ‘posso fazer mais disso, eu vou tentar conquistar mais eleitores’”.
Para 2025, Stuhlberger acha que o governo pode recorrer à contabilidade criativa para pagar despesas fora do orçamento, retirando do limite do arcabouço gastos com saúde, educação, prevenção de calamidades. Trata-se de um orçamento irrealista, com despesas obrigatórias subestimadas, disse.
Só a Previdência pública traz implícita um novo dilema à frente e que está fora do controle do governo. Ele citou que, caso os entrantes na Previdência e o pagamento do Benefício de Prestação Continuada (BPC) sigam crescendo no ritmo atual, esse avanço das despesas sobe para 3,4% e 3,7%, pela ordem, em 2025 e 2026. “Não acho que agora tenha muito espaço para arrecadar mais, aumentar a carga tributária”, afirmou.
Com tal cenário, Stuhlberger fez mudanças razoáveis na carteira do multimercado Verde. A parcela em renda variável no Brasil foi reduzida de 15% para 10% e a exposição em Notas do Tesouro Nacional série B (NTN-B), historicamente relevante, que representava até 27% do patrimônio, foi inteiramente vendida. Simultaneamente, a casa elevou a fatia nas Treasury Inflation-Protected Securities (TIPS, dos EUA, equivalentes às ‘Bs’ locais).
“É ter o mesmo ativo, mas estamos saindo do risco fiscal [no Brasil] nos próximos dois anos”, afirmou o gestor. Ele disse ainda ter posições em prefixados com vencimentos em 2025 e 2026. “Tem prêmio, é bom, não é pouco, mas não sei se quero ficar.”
Com o fiscal mais frágil, a resposta da política monetária no Brasil tende a ser mais dura, disse. “E o mercado já colocou isso no preço. O próprio presidente [do BC] reduziu o ‘forward guidance’ [orientação futura] de 50 para 25 [pontos-base], mas vamos ver a mensagem no pós-25”, afirmou. “Olhando o histórico do Roberto Campos e como ele trata isso, imagino que ele possa ser mais ‘hawk’ [pró-aperto] do que se imagina.”
O Copom anuncia nesta quarta-feira a sua decisão para o juro básico da economia, hoje em 10,75%. A Verde estima que, ao fim do ciclo, a Selic estará em 9,75% ao ano.
Uma regra não escrita que os formuladores de política monetária costumam seguir, segundo Stuhlberger, é ter uma Selic entre 4 e 5 pontos acima das “Fed funds”, as taxas referenciais dos Estados Unidos. Com mais um corte hoje, o diferencial cai para 5,20 pontos percentuais. Quando tinha o teto de gastos, a avaliação era que o juro real de equilíbrio poderia ser menor, mas num BC petista, com a saída de Campos Neto no fim do ano, ele disse ser difícil imaginar que a autoridade monetária não vá avançar esse sinal. O fiel da balança tende a ser o câmbio.
Mas se o mercado estiver certo nos juros negociados nos EUA nos preços atuais, Stuhlberger disse que o jeito de pensar investimentos vai ter de mudar permanentemente, “porque vamos ter de conviver com um juro de um ativo sem risco muito maior do que estávamos acostumados”.
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_63b422c2caee4269b8b34177e8876b93/internal_photos/bs/2022/B/E/lCyElaRy6OzDVPSAbw0Q/200617verde42.jpg)
Luis Stuhlberger, CEO e CIO da Verde Asset — Foto: Silvia Costanti / Valor
fonte: valor econômico

