A expansão da Inteligência Artificial (IA) está gerando transformações profundas em diversos setores da economia, e um dos maiores desafios que ela traz é a necessidade de infraestrutura robusta. Como afirmou Jensen Huang, CEO da Nvidia, os investimentos globais em data centers devem dobrar nos próximos anos, chegando a US$ 2 trilhões. No World Government Summit, em Dubai, Huang destacou que a crescente demanda por poder computacional, especialmente para suportar a IA, está pressionando a construção de uma base de infraestrutura tecnológica nunca antes vista.
O impacto da IA vai muito além do desenvolvimento de software. O que sustenta essa tecnologia são os data centers e, segundo Huang, haverá US$ 1 trilhão em infraestrutura e hardware de data centers construídos globalmente nos próximos cinco anos. Um exemplo é a busca da OpenAI por US$ 7 trilhões para construir uma estrutura que possa apoiar o desenvolvimento da tão aguardada inteligência artificial geral. Para Huang, embora a escala dos investimentos seja impressionante, os avanços em computação podem, eventualmente, reduzir a necessidade total de investimentos à medida que os sistemas se tornam mais rápidos e eficientes.
Esses centros de dados robustos são essenciais para sustentar modelos de IA, especialmente aqueles focados em aprendizado profundo e processamento de grandes volumes de dados. Isso significa que, além de equipamentos mais avançados, é fundamental otimizar a eficiência energética. A transição para sistemas de computação acelerada com o uso de GPUs (Unidades de Processamento Gráfico) promete reduzir o consumo de energia de data centers em até 40 terawatts-hora por ano – o equivalente ao consumo elétrico de 5 milhões de lares nos EUA.
A importância da eficiência energética não é um tema secundário. Segundo o Lisbon Council Research, embora os data centers representem cerca de 4% do consumo global de energia, as melhorias trazidas pela IA podem impactar diretamente os 96% restantes. A utilização de GPUs para processamento paralelo acelera o desempenho e reduz o tempo necessário para concluir tarefas complexas, ao mesmo tempo em que economiza energia.
Um exemplo claro disso é o supercomputador italiano Leonardo, equipado com quase 14.000 GPUs da Nvidia. Ele está transformando indústrias como automotiva, farmacêutica e até meteorológica. A Murex, uma empresa de serviços financeiros em Paris, testou o novo Superchip Grace Hopper da Nvidia e relatou uma melhoria de sete vezes no tempo de conclusão de tarefas e uma redução de quatro vezes no consumo de energia em comparação com sistemas tradicionais baseados em CPUs. Segundo Pierre Spatz, chefe de pesquisa quantitativa da Murex, o novo processador é não apenas mais rápido, mas também muito mais eficiente energeticamente, aproximando a realidade da TI verde.
A eficiência energética também foi um foco na indústria de manufatura. A Wistron, em Taiwan, criou uma cópia digital de sua sala de testes térmicos dos sistemas DGX da Nvidia, resultando em um aumento de 10% na eficiência energética, economizando 120.000 kWh por ano e reduzindo 60.000 kg nas emissões de carbono. A RAPIDS Accelerator da Nvidia para Apache Spark está ajudando empresas como Adobe e AT&T a analisar grandes volumes de dados com uma pegada de carbono reduzida em até 80%.
No setor de saúde, a Insilico Medicine, usando IA baseada em tecnologia Nvidia, descobriu um novo candidato a medicamento para doenças respiratórias raras. Com métodos tradicionais, esse processo teria levado seis anos e custado mais de US$ 400 milhões. A IA reduziu esse tempo para um terço e o custo para um décimo, mostrando o enorme potencial dessa tecnologia para acelerar o progresso científico.
A importância da infraestrutura computacional não se limita à eficiência. Ela é um pilar central da inovação. O National Energy Research Scientific Computing Center (NERSC) dos EUA obteve um aumento de cinco vezes na eficiência energética utilizando servidores com quatro GPUs Nvidia A100, enquanto em aplicações de previsão do tempo, os ganhos chegaram a dez vezes. Esse tipo de melhoria destaca o quanto a evolução tecnológica está ligada à capacidade de otimizar recursos e tornar o processamento de dados cada vez mais sustentável.
Entre 2010 e 2018, data centers globais viram um aumento de 550% na demanda de computação e 2.400% na capacidade de armazenamento. Contudo, o consumo de energia cresceu apenas 6%, um feito impressionante que reflete os avanços em hardware e software. Como observou o escritor Nassim Nicholas Taleb, “A complexidade não é o oposto da simplicidade, mas da superficialidade.” A infraestrutura subjacente à IA não deve ser subestimada; ela representa a espinha dorsal da inovação, com impactos que se estendem por todas as indústrias.
O desenvolvimento de soluções mais eficientes, como o Earth-2, um supercomputador de IA dedicado à ciência climática, reforça essa conexão entre inovação e sustentabilidade. Projetos como esse, apoiados por um subsídio de US$ 5 milhões do Departamento de Energia dos EUA, pretendem criar novos sistemas de resfriamento líquido para data centers que operem com 20% mais eficiência do que os atuais resfriadores a ar. Se a IA pode melhorar a eficiência em áreas críticas como a computação, os efeitos positivos também se estendem à luta contra as mudanças climáticas.
A sustentabilidade energética e a otimização dos data centers estão intimamente ligadas ao potencial econômico da IA. Se a eficiência dos carros melhorasse no mesmo ritmo que a das plataformas de IA da Nvidia, poderíamos ter automóveis rodando 280.000 milhas por galão. Além disso, inovações como o TensorRT-LLM, que reduzem em até três vezes o consumo de energia dos grandes modelos de linguagem, são exemplos de como a otimização está diretamente conectada ao avanço da IA.
Outro ponto essencial para garantir essa eficiência são os DPUs (Unidades de Processamento de Dados) da Nvidia, que podem reduzir em até 30% o consumo de energia ao descarregar funções essenciais de rede e infraestrutura dos servidores. Isso destaca o papel crucial que a infraestrutura desempenha na viabilização de uma IA sustentável e eficiente.
Com os avanços da IA, o foco em infraestrutura não pode ser negligenciado. Os data centers são o coração dessa revolução, e seu desenvolvimento é indispensável para atender à crescente demanda por poder computacional. O investimento em sistemas de computação acelerada é a chave para desbloquear o verdadeiro potencial da IA. As implicações não se limitam ao retorno financeiro, mas abrangem também a construção de um futuro mais eficiente e sustentável.
O desenvolvimento da infraestrutura revela-se como o ponto central para sustentar a evolução da IA. Esse investimento estratégico nos permitirá explorar todo o potencial transformador da IA, avançando tanto em direção ao crescimento econômico quanto em soluções mais ecológicas para os desafios do futuro.
Gustavo Pessoa é CEO da Actus Asset.
gustavo.pessoa@actusasset.com
Fonte: Valor Econômico