Copom tende a manter tom preocupado em reunião que deve reduzir juro a 12,25%
Por Victor Rezende e Gabriel Roca — De São Paulo
Embora o mercado seja unânime ao esperar uma redução de 0,5 ponto percentual na Selic nesta semana, o espaço remanescente para cortar a taxa básica de juros diminuiu. A percepção de que os Estados Unidos devem continuar sob o efeito de uma política monetária restritiva nos próximos anos chacoalhou os mercados financeiros globais e fortificou a sensação de que o nível contracionista da Selic no fim do ciclo pode ser um pouco mais alto, em um ambiente que ainda contempla riscos fiscais relevantes e expectativas de inflação acima do centro da meta.
Em levantamento elaborado pelo Valor com 140 instituições financeiras e consultorias, foi unânime a aposta em uma redução de 0,5 ponto na taxa básica nesta semana, que deve sair, portanto, de 12,75% para 12,25%. Além disso, a grande maioria dos agentes (96,4%) espera um novo corte de 0,5 ponto no fim deste ano, o que levaria o juro a 11,75%. Em relação a dezembro de 2024, porém, a pesquisa indica um aumento na mediana das projeções dos economistas para a Selic, que passou de 9% na pesquisa de setembro para 9,25%.
O movimento observado nas projeções dos economistas de mercado para a taxa de juros no fim do ciclo guarda alguma semelhança com o estresse visto nas taxas futuras de juros, embora tenha sido bem menos intenso. Casas como Citi, Kinea Investimentos, Ace Capital, Truxt Investimentos e WHG incorporaram em seus cenários uma Selic mais alta no encerramento do ciclo. Já a curva de juros, nas últimas semanas, chegou a precificar uma taxa de 11% no fim do ciclo, o que foi lido por agentes do mercado como “exagero” derivado de movimentos técnicos e de correlação elevada com os Treasuries.
“Eliminamos do nosso cenário qualquer tipo de aceleração do ritmo de cortes e acreditamos que o juro cairá até 10%, não mais 9%”, diz o economista-chefe do Citi Brasil, Leonardo Porto. “Já estávamos preocupados com esse processo de corte de juros por duas variáveis: a atividade econômica, já que não temos sinais de esfriamento no mercado de trabalho; e a percepção de que o período benigno da inflação está ficando para trás.”
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Porto argumenta que, apesar de alguns sinais de fraqueza nos dados de atividade de agosto, o mercado de trabalho segue resiliente. “Isso é hiato do produto [medida da ociosidade da economia] fechando e pressão inflacionária à frente ficando mais forte, especialmente a inflação de serviços”, diz. Ele observa que as surpresas positivas na inflação corrente recentemente apontam “tranquilidade maior” no cenário, mas ressalta a importância do hiato do produto para a definição da inflação de serviços.
Além disso, Porto ressalta a incerteza gerada pela troca de membros da diretoria do Comitê de Política Monetária (Copom), ao observar que dois dirigentes mais conservadores, Fernanda Guardado e Maurício Moura, serão substituídos no fim deste ano. “Sempre que se muda um diretor do Copom se gera incerteza, e substituir um diretor mais ‘hawkish’ [conservador] cria riscos de o processo ficar mais frouxo.” O profissional, assim, diz ter mais certeza de uma pausa no processo de ancoragem das expectativas inflacionárias. “É de 3,5% para cima, o que, por sua vez, dificulta ainda mais o trabalho do BC.”
O elemento externo, representado especialmente pela disparada dos rendimentos dos Treasuries, torna o cenário mais complexo e desafiador para a condução da política monetária. Desde a decisão do Copom de setembro, a taxa da T-note de dez anos disparou de 4,414% para 5,022% na semana passada.
Não por acaso, a economista Daniela Lima, da Kinea Investimentos, acredita que o Copom dará ênfase aos riscos exercidos pelo cenário internacional na reunião desta semana. “Podemos ver mudanças no parágrafo inicial. Com base no que os diretores vêm falando, caso as taxas longas de juros nos EUA subam mais, isso acarretaria um cenário mais desafiador para emergentes e, assim, o Copom poderia destacar quais seriam esses riscos”, diz. A Kinea elevou a projeção para a Selic em 2024 de 9% para 10%.
A economista, no entanto, lembra que a taxa de câmbio, principal canal de transmissão do cenário externo para a política monetária doméstica, não exibiu movimentos agudos de depreciação. “Por enquanto, o câmbio tem se mantido comportado. Se você nos perguntasse há dois meses onde estaria o câmbio com o juro da Treasury de dez anos a 5%, dificilmente alguém diria que ele estaria onde está.”
Assim, em um cenário de poucas alterações nos componentes que afetariam os modelos de inflação do Copom, tanto as projeções como a comunicação para os próximos passos do Copom não devem sofrer grandes alterações na quarta-feira. “O dólar saiu de R$ 4,90 para R$ 5,00 e as commodities permaneceram de lado. Houve melhora na inflação corrente, especialmente na parte de serviços e nos componentes mais inerciais, mas o Copom deve continuar sinalizando o ritmo de cortes de 0,5 ponto e não vemos grandes mudanças para as próximas reuniões”, diz Lima.
Eliminamos qualquer tipo de aceleração do ritmo de cortes e acreditamos que o juro cairá até 10%”
— Leonardo Porto
E é justamente ao citar a melhora na inflação corrente tanto no índice cheio quanto nos núcleos e os dados de atividade mais fracos que o economista-chefe do Bradesco, Fernando Honorato Barbosa, defende a manutenção do plano de voo da autoridade monetária neste momento. Para ele, apesar de o aumento da volatilidade externa ter sido relevante, os fatores que guiam a condução da política monetária melhoraram, o que deve levar o Copom a deixar a sinalização futura “bastante parecida” com a do encontro de setembro.
“Quando olhamos para o canal de contágio da economia global no Brasil, que é principalmente o câmbio, o real tem tido uma performance bastante melhor que os pares. A depreciação nominal foi muito pequena e deveria jogar luz para o fato de que tivemos uma piora substancial dos juros lá fora e uma performance boa aqui”, diz.
Assim, ao pensar no balanço de riscos do Copom, Honorato espera que a piora na dinâmica dos Treasuries seja incluída, mas ressalta o bom desempenho do real. Na métrica utilizada pela autoridade monetária na elaboração das projeções de inflação, o câmbio deve passar de R$ 4,90 por dólar em setembro para R$ 4,99 por dólar na reunião desta semana.
“Não acho que caiba uma aceleração neste momento, porque o balanço de riscos foi piorado, mas os fatos objetivos não autorizam uma discussão de redução do passo, na nossa visão”, diz Honorato, ao notar, adicionalmente, que houve um aperto das condições monetárias desde a reunião de setembro. “O juro real ex-ante subiu no Brasil. A política monetária foi apertada, não afrouxada. E, na métrica de todos os economistas e do BC, o juro está acima do nível neutro e existe espaço até chegar lá.”
O mercado, no momento, avalia as consequências de declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre as dificuldades para o Brasil cumprir a meta de um resultado primário equilibrado em 2024. “Dificilmente chegaremos à meta zero, até porque eu não quero fazer cortes em investimentos e obras”, disse o presidente na sexta-feira. Na visão de alguns agentes, é possível que o Copom reforce a “importância da firme persecução dessas metas [fiscais]”, assim como no comunicado de setembro.
Para Luiz Eduardo Portella, sócio e gestor da Novus Capital, com um comitê já preocupado com o cenário externo e, agora, com a possibilidade de elevação da meta fiscal, a probabilidade de o Copom não se comprometer com a magnitude de 0,5 ponto de redução nos juros nas próximas reuniões aumenta. “Pode ser que venha um discurso de que vão decidir a cada reunião se os cortes vão ser de 0,5 ponto ou se serão menores”, aponta o gestor.
Nesse contexto, o economista-chefe da Ativa Investimentos, Étore Sanchez, reforça o sentimento de que o espaço para reduzir o grau de aperto monetário diminuiu. Com as expectativas de inflação de longo prazo desancoradas e os núcleos ainda elevados, “não há evidências que justifiquem cortes mais intensos”.
“A minha posição de uma Selic em dois dígitos, de 10,5% ao fim do ciclo, se pauta na desancoragem de inflação para prazos mais dilatados. Nossa visão era de que, em agosto, não havia espaço para começar os cortes e, por isso, o início do ciclo precisaria ser postergado. O nosso pensamento acabou se frustrando e migramos para uma visão de que a interrupção [do ciclo] será precoce”, afirma Sanchez. Mais recente Próxima Setor de pagamentos não estava acostumado com competição, diz Worldpay
Fonte: Valor Econômico