19 Aug 2022• ADRIANA FERNANDES
Ex-secretário do Tesouro afirma que a medida precisaria vir acompanhada de um superávit primário.
Ex-secretário do Tesouro Nacional e hoje economista-chefe do BTG Pactual, Mansueto Almeida avalia que a aprovação de uma licença para ampliar os gastos em 2023 teria de ser em valor pequeno e acompanhada de um superávit primário (o saldo positivo entre as receitas e as despesas, excetuando gastos com pagamento de juros) no primeiro ano do próximo governo.
A discussão de uma licença para gastos, chamada pelos economistas de waiver (perdão ao descumprir uma meta, na sigla em inglês), entrou no debate de política fiscal na campanha eleitoral para tornar permanente o adicional de R$ 200 do piso do Auxílio Brasil, de R$ 400 para R$ 600.
A licença seria temporária até a definição de nova regra fiscal pelo próximo governo e a aprovação pelo Congresso.
“Dá para avançar alguma coisa, mas é difícil saber o quê. Se for algo pequeno e desde que seja acompanhado, já no primeiro ano, por um aumento do superávit primário, podese até debater”, avalia ele, que no governo Michel Temer trabalhou na equipe do ex-ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Foi o time de Temer que projetou e conseguiu a aprovação pelo Congresso do teto de gastos, que limita o crescimento das despesas de um ano para outro à variação da inflação.
Ao Estadão, Mansueto disse que, se o próximo governo não deixar clara a estratégia para continuar com o ajuste fiscal, “tudo o mais ficará em risco”. É uma referência às condições macroeconômicas para garantir uma trajetória sustentável da dívida pública.
Para o Brasil melhorar, disse o economista, o próximo governo terá de mostrar alguma regra fiscal com metas anuais que o mercado financeiro possa acompanhar. “Se for apenas waiver para gastar mais durante um ou dois anos e termos um resultado primário pior, acho preocupante”, alertou.
De acordo com ele, qualquer que seja o governo só haverá ganhos em definir e mostrar alguma regra fiscal. Esse movimento poderá levar à redução do risco Brasil, ajudar na valorização do real, reduzir juros longos e atrair mais investimento.
Na avaliação do economista, o desafio para o próximo governo continua sendo mudar a composição do gasto para tornar a despesa mais distributiva. “Mesmo assim, ainda há risco aqui no Brasil de aumento de impostos, se a arrecadação cair nos próximos anos”, ponderou.
INCERTEZA EM 2023. Mansueto destacou que o problema que ronda o quadro fiscal é a incerteza em relação à evolução da arrecadação do governo num cenário de queda da inflação e a perspectiva de redução de preço de commodities, como o petróleo.
A elevação das receitas do governo vinculadas à alta internacional de commodities (produtos básicos, como petróleo) e o efeito da inflação contribuíram para o aumento das receitas e a melhoria das contas públicas ao longo deste ano.
Agenda Para ex-secretário do Tesouro, regra fiscal e reforma tributária devem ser prioridades
As commodities representam quase 80% das exportações brasileiras. Se, por um lado, o aumento de preço de commodities é ruim para inflação, por outro ajuda na arrecadação, na balança comercial e na melhoria das contas públicas.
Ele considera prioridades para 2023 definir a nova regra fiscal e aprovar a reforma tributária. Para ele, as duas propostas podem tramitar juntas porque tradicionalmente no primeiro ano de governo há sempre uma maior vontade de votar projetos mais difíceis. Ele lembrou que, em 2019, o governo Bolsonaro, sem base política, conseguiu aprovar a reforma da Previdência que se tentava havia 20 anos.
Fonte: Valor Econômico

