Por Eduardo Magossi e Arthur Cagliari, Valor — São Paulo
05/11/2022 10h41 Atualizado
Desde os primeiros sinais de que o Federal Reserve (Fed) poderia reduzir seu ritmo nas altas de juros no fim deste ano, os investidores passaram a flertar com a perspectiva do BC americano mudar de direção, o que investidores estrangeiros chamam de “pivô” (pivot, em inglês).
Nesta semana, no entanto, Jerome Powell, o presidente do Fed, frustrou expectativas ao mostrar que, ainda que o foco seja reduzir o ritmo nos próximos encontros, o tamanho do caminho até o fim do aperto deve ser maior do que o projetado anteriormente, com taxa final mais alta do que a estimativa da última projeção do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc), em setembro.
Na avaliação de Diogo Silveira, sócio e economista da Blueline, foi criada a narrativa de que um “pivô” estaria próximo, mas tanto os comentários de Powell como os dados do payroll mostraram que esse ainda não é o cenário. Além de apontar para um prolongamento do processo de aperto com taxa maior no fim do ciclo, o chairman do Fed disse que ainda é cedo para falar de pausa no aumento dos juros. Já os dados de emprego mostraram que o mercado de trabalho segue apertado e com força, com geração de 261 mil vagas (contra projeção de 205 mil) em outubro e ganhos salariais ainda fortes. A taxa de desemprego, entretanto, subiu de 3,5% para 3,7%.
Segundo Silveira, tendo em vista a criação de vagas, que é um indicador mais consistente em razão de sua metodologia, o BC americano terá que elevar os juros até o intervalo de 5,25% a 5,50% para conseguir controlar a inflação. “Talvez até um pouco mais de 5,5% dependendo dos dados de inflação que ainda serão divulgados antes da reunião do Fed de 14 de dezembro”, disse.
Na mesma linha, o economista-chefe do TS Lombard, Steven Blitz, diz que os dados de emprego vieram robustos demais. “O forte ritmo sustentado de crescimento de vagas bem acima do neutro (100 mil por mês, ou próximo disso), a baixa taxa de desemprego e o ritmo ainda elevado de aumentos salariais somam-se à continuidade da forte demanda por mão de obra”, disse, acrescentando que espera ver o Fomc elevar as taxas mais uma vez em 0,75 ponto percentual em dezembro. “Acabar com o otimismo ‘dovish’ do mercado tornou-se uma espécie de esporte neste ano e, com base na reação do mercado de sexta-feira, o jogo parece continuar”, afirmou Blitz em nota.
Contrapondo a perspectiva de que os investidores estariam mais otimistas do que o necessário, Angelo Polydoro, economista da ASA Investments, afirmou que o mercado não está tentando deliberadamente ser mais “dovish”, mas apenas tentando acertar o que está caro e o que está barato na bolsa diante da expectativa de o Fed subir ainda mais os juros. “Não é à toa que o Treasury de 2 anos está com o rendimento em nível recorde de 4,7% e as bolsas já começam a realizar uma correção”, disse.
Apesar da alta registrada nas bolsas americanas na sexta-feira, na semana encerrada em 4 de novembro, o índice Dow Jones caiu 1,40%, o S&P 500 recuou 3,35% e Nasdaq perdeu 5,65%. “A bolsa também está reagindo a balanços corporativos mais positivos e a expectativa de reabertura da China e tentando encontrar um equilíbrio de tudo isso com o discurso conservador de Powell”, disse o economista, que espera uma alta de 0,75 ponto na reunião de dezembro. Para ele, os dados de inflação ainda a serem divulgados vão ser mais importantes nessa dinâmica.
Ao Valor, David Mericle, economista-chefe para os Estados Unidos do Goldman Sachs, disse que ao sinalizar um ritmo menor nas altas em dezembro e uma taxa terminal maior em 2023, Powell deu, sim, uma mensagem “dovish” ao mercado. Segundo ele, a orientação do Fed sobre o que ele fará no curto prazo é muito mais significativa do que uma especulação do que ele vai fazer daqui a seis meses. Mericle também faz uma leitura com uma outra lente sobre os números do payroll. “Embora os dados possam parecer confusos, a mensagem importante é que o crescimento das vagas e dos salários está desacelerando. Os dois precisam continuar assim para deixar a inflação sob controle, mas estamos indo na direção certa.”
Seja um copo meio cheio ou meio vazio, a verdade é que o mercado já precifica a mudança do humor e da perspectiva do investidor. Rafaela Vitória, economista-chefe do Inter, disse que um possível movimento do Fed em subir os juros para além de 5% já provocou uma reprecificação no mercado de juros. “Acredito que com sinais de inflação desacelerando, principalmente a inflação de serviços do CPI, pode ser um gatilho para o mercado ter um alívio maior e uma clareza de até onde vai o ciclo de aperto”, disse ela. Na próxima quinta-feira, o Departamento de Comércio deve divulgar os dados do índice de preços ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) do mês de outubro.
Fonte: Valor Econômico

