09/04/2024 05h02 Atualizado há 5 horas
A demora do Federal Reserve (Fed, banco central americano) para iniciar o afrouxamento monetário e a volatilidade que essa indefinição trouxe aos mercados empurraram para a frente a reabertura da temporada de ofertas públicas iniciais (IPOs na sigla em inglês) no Brasil, depois de mais de dois anos de seca. Inicialmente esperadas para o período entre abril e junho, as previsões agora são de que a janela acontecerá no segundo semestre, mas há quem veja as operações somente no fim do ano, entre setembro e dezembro, sendo que a maioria ficaria mesmo para fevereiro de 2025.
Chefe global do banco de investimento do Itaú BBA, Roderick Greenlees mantém, por enquanto, seus cálculos de que serão de três a cinco emissões primárias neste ano. Se considerados os “follow-ons” (quando a empresa já listada faz novas ofertas), o total chega a 25 a 35 operações, num volume entre R$ 35 bilhões e R$ 50 bilhões. No entanto, se o primeiro corte dos juros americanos não vier em junho, afirma Greenlees, ele vai rever as previsões.
“Há uma enorme demanda reprimida por parte tanto dos emissores quanto dos investidores. Temos boas companhias querendo acessar o mercado”, avalia Greenlees. Entre as candidatas a chegar à bolsa estão a Inspirali, negócio de faculdades de medicina do grupo educacional Ânima, as construtoras Pacaembu e Tegra e a Cimed, a terceira maior farmacêutica do país em volume, que já avisou que a oferta deve ficar para 2025. O mercado, por sua vez, espera a chegada de Aegea (saneamento) e Votorantim Cimentos, entre outros.
Marcelo Millen, responsável pela área de renda variável do Citi na América Latina, diz que o banco vem conversando com “uma série de companhias” que estão se preparando para ir à bolsa neste ano. Ele não quis revelar os setores, mas diz que, em comum, as empresas são “grandes, avaliadas em no mínimo R$ 5 bilhões, com forte histórico de execução e resiliência na entrega de resultados” e que farão uma oferta de no mínimo R$ 2 bilhões, para garantir liquidez no mercado secundário. “Estamos construtivos com cortes de juros nos Estados Unidos”, diz.
O executivo do Citi diz que o mercado americano também veio patinando e agora apresenta uma retomada gradativa. Em março, gerou euforia por lá a oferta do Reddit, plataforma de mídia social e de compartilhamento de notícias, que fechou a cotação no topo da faixa de preço e ainda subiu quase 50% no primeiro dia de negociações. A expectativa é que seja uma espécie de abre-alas, mas, como 2024 é ano de eleição, explica ele, o mercado americano terá menos janelas para operações.
Segundo Greenlees, portanto, é uma questão de tempo para sair a primeira operação no Brasil desde 2021. Ele afirma que muitas empresas mantiveram seus registros de companhia aberta em dia e que estão em vantagem porque conseguem colocar a emissão de pé em três semanas. As que não têm o processo pronto precisam de três a seis meses, dependendo do estágio da empresa.
“Por isso, o tempo começa a ficar comprimido. Eu achava que poderia haver um ou dois no segundo trimestre, mas não trabalho mais com essa possibilidade. O risco de não haver nenhum por enquanto é baixo”, diz Greenlees. Victor Rosa, chefe do banco de investimentos do Scotiabank Brasil, explica que o mercado de ações é muito sensível à previsibilidade, portanto, se algum fator mexer com as expectativas, pode adiar a abertura do mercado para o fim do ano ou 2025.
Rodrigo Guedes, sócio-líder da área de mercado de ações da KPMG no Brasil, comenta que a empresa está com quatro novos mandatos, firmados no fim de janeiro, e vê potencial em infraestrutura e logística, saneamento, serviços financeiros (fintechs), varejo não eletrônico, indústria e agricultura.
Nas mãos da consultoria Grant Thornton, o perfil é parecido, acrescentando ainda biotecnologia e construção civil. Em processo de preparação quase pronto deixado em banho-maria, aguardando a janela, eram cinco empresas. Novas candidatas, que chegaram nesse início de ano, somam outras quatro, comenta Octavio Zampirollo, sócio de auditoria na empresa. Na G5 Partners, foram dois mandatos assinados em fevereiro, provenientes de conversas adormecidas há dois anos, e que foram reativadas com a melhora das condições de mercado, diz o sócio Levindo Santos.
“Temos operações interessantes que virão a mercado com números do primeiro trimestre, melhores por causa da queda dos juros”, diz Greenlees. Os setores também são conhecidos por terem menos risco e mais liquidez, o que é atraente para os estrangeiros, frisa Rosa. De acordo com Guedes, de 2020 para cá, a participação externa nas ofertas, que costumava ser de 60% a 70%, inverteu e os investidores domésticos assumiram maior peso.
Ele espera que a reabertura do mercado aconteça “mais para dezembro”, porque para definir o preço da oferta em setembro a empresa teria que estar pronta em um mês e meio. “Com a conjuntura econômica e geopolítica internacional complexa, não sei se temos muitas prontas. Se as janelas deste ano forem perdidas, a próxima chance fica para fevereiro de 2025.”
Millen, do Citi, diz que já percebe investidores dispostos a avaliar oportunidades de IPOs. E frisa que o mercado está “100% funcional para follow-ons.” Guedes, da KPMG, lembra que também o perfil das ofertas subsequentes este ano vai começar a mudar, com mais operações com objetivos de investimento, enquanto no ano passado foi basicamente para redução de endividamento.
Embora tenha encerrado com apenas cinco ofertas até março, uma delas foi a da Energisa, que levantou R$ 2,5 bilhões. Os recursos serão usados, além da redução da alavancagem, para investimentos em concessões potenciais fusões e aquisições. “Nos próximos meses, veremos transações ainda para capitalizar companhias, mas também para novos projetos e investimentos”, afirma Greenlees.
Fonte: Valor Econômico
