A pergunta que todos devem fazer sobre o tema é aonde a empresa quer chegar com a transformação digital, destaca Rodolfo Eschenbach, presidente da consultoria Accenture para Brasil e América Latina. “Sem clareza e alinhamento de propósitos, as chefias encontrarão conflitos internos e reuniões improdutivas que vão atrasar os resultados”, diz.
Prova disso aparece em uma recente pesquisa da Accenture e do centro de estudos global PMI Brightline com 363 executivos que trabalharam com programas de adesão digital – os dados indicam que sete de cada dez esforços na área não conseguem atender às expectativas das equipes envolvidas.
O mais difícil no caminho da mudança é conseguir colocar em prática uma nova cultura na empresa, afirma Eschenbach. Esse movimento, segundo ele, deve reunir práticas como a utilização correta dos dados obtidos nas rotinas on-line e uma atitude mais colaborativa das chefias, para que o trabalho evolua rapidamente.
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Eschenbach, da Accenture: acabou o tempo de isolamento na área de inovação — Foto: Divulgação
“O ‘status quo’ [dos negócios] deve ser desafiado para estimular o uso de novas abordagens e parcerias externas com startups e universidades”, diz o executivo. “Acabou o tempo de isolamento da área de inovação.”
O presidente da Accenture também destaca que, para funcionar, uma cultura digital deve contar não só com o apoio da média gerência, mas também do C-level. “As lideranças precisam estar genuinamente comprometidas”, orienta. “E treinamentos serão necessários para adquirir novos conhecimentos [sobre negócios] nessa fase da organização.”
Para que as recomendações sejam seguidas à risca, a companhia de saneamento privado Aegea, optou por reforçar o envolvimento do quadro na agenda de mudanças. “A transformação digital é um processo irreversível, que vai além da implementação de tecnologias”, observa Eduardo Mendes, diretor de TI da Aegea. “As pessoas são as peças-chave, e é preciso preparar gestores, líderes e colaboradores.”
De acordo com Mendes, os desafios de uma gestão digital podem ser minimizados com planejamento. O executivo diz que um projeto formal de transformação da empresa foi elaborado há dois anos, após um diagnóstico da infraestrutura de sistemas, de processos e de pessoas. “Isso resultou em um plano estratégico para os próximos cinco anos”, afirma.
A diretriz foi dividida em três grandes frentes, como a atualização dos recursos tecnológicos, a integração das plataformas comercial, de operações e corporativa e o esforço para trabalhar com análises preditivas e sistemas autônomos no dia a dia. Houve uma atenção especial para a capacitação dos funcionários e no entendimento das equipes sobre o que estava chegando, explica Mendes.
No último ano, o treinamento ganhou tração por meio da Academia Aegea, braço de educação corporativa lançado em 2014. A unidade oferece programas de graduação e MBAs, além de colaborar no desenvolvimento da carreira dos times com aulas técnicas sobre habilidades comportamentais e de preparação para posições de liderança.
Entre janeiro e dezembro de 2022, foram oferecidas mais de 333 mil horas de capacitação remota e presencial. Durante os anos de pico da pandemia, 80% das sessões aconteceram a distância, lembra Mendes.
Ele afirma que a agenda de transformação digital recebe cerca de 50% do orçamento da área de TI ou de 3% a 4% do faturamento da empresa. O suporte financeiro é importante: o executivo destaca que companhias envolvidas na adoção de frentes on-line se deparam também com desafios ligados ao “core business”.
“A área de saneamento, dentro do universo de utilities, é a que mais demorou a entrar nos programas de transformação, pelas particularidades de que não eram tão conhecidas dos fornecedores de tecnologia”, explica Mendes. “Por isso, temos uma parcela relevante de aplicações desenvolvidas internamente, o que faz com que o tempo de implementação dos projetos também aumente.”
Nos próximos meses, Mendes garante que a companhia, que opera em 13 estados, continuará avançando no cronograma de transição. Entre as novidades, o aplicativo “Águas” deve ganhar mais funções para ajudar os clientes a monitorar o consumo, enquanto o setor de operações vai receber uma ferramenta de monitoramento de mananciais, a fim de acompanhar a saúde ambiental das regiões onde o grupo atua.
O tamanho da empresa que entra na era virtual também pode ser um entrave para o avanço das alterações necessárias, sustenta o argentino Pablo D’Amico, diretor de TI da Bayer para a América Latina. “No nosso caso, um dos principais desafios foi fortalecer uma cultura focada na transformação digital”, revela. “No começo, havia muitos países desenvolvendo as mesmas iniciativas, o que não era eficiente em termos de recursos.”
D’Amico diz que a multinacional alemã, com mais de cinco mil funcionários no Brasil, conseguiu driblar as dificuldades com a escuta ativa dos feedbacks das equipes. “Desenvolvemos treinamentos, como bate-papos na hora do café, em que os gestores falam sobre ‘dores’ e resoluções de problemas. E um projeto que percorre as unidades da Bayer no país, com palestras sobre tecnologia”, detalha o executivo, na empresa desde 2001 e com passagens pelas operações da Argentina e da Alemanha. “Entre 2020 e 2022, considerando apenas essas ações, foram cerca de 70 atividades, atingindo 60% dos times”, diz.
Na visão do diretor, a conversão digital é um processo sem prazo para ser concluído. “Já implementamos ações transformadoras, como a construção de um hub digital na Polônia, e logo teremos [um similar] na América Latina, além de novas plataformas que dão suporte a negócios nas áreas de agro, consumer health e farma”, diz. “Ainda estamos no meio da jornada.”
Fonte: Valor Econômico