Por Jéssica Sant’Ana e Guilherme Pimenta — De Brasília
23/11/2023 05h02 Atualizado há 5 horas
Os ministérios da Fazenda e do Planejamento e Orçamento pioraram a previsão de resultado para as contas públicas deste ano, e agora calculam que o governo central deve encerrar o ano com um déficit primário de R$ 177,4 bilhões, valor R$ 35,9 bilhões superior à estimativa anterior, feita em setembro. O resultado, se confirmado, representaria um déficit de 1,7% do Produto Interno Bruto (PIB), percentual cada vez mais distante do prometido rombo de, no máximo, 1% do PIB.
Os valores, contudo, são levando em consideração a metodologia de cálculo “acima da linha”, usada pelo Tesouro Nacional. Pela metodologia “abaixo da linha”, usada pelo Banco Central para de fato aferir a meta fiscal, a projeção de déficit foi para R$ 203,4 bilhões, o equivalente a 1,9% do PIB. A discrepância de valores é explicada porque o Tesouro incorporou no seu resultado primário uma receita de R$ 26 bilhões de recursos do PIS/Pasep que foram abandonados pelas pessoas que tinham direito. Já pela metodologia do BC, esses valores não entram como receita primária.
A Lei de Diretrizes Orçamentárias deste ano admite um déficit de até R$ 213,6 bilhões, ou 2% do PIB. Ou seja, até o momento, o governo tem um espaço de apenas R$ 10,2 bilhões de sobra para cumprimento da meta. O secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, afirmou que não há motivos para preocupação, porque o empoçamento de recursos federais (verba autorizada, mas não gasta) deve ficar em R$ 30 bilhões, o que ajudará o governo a reduzir o rombo previsto e a ficar dentro da meta
Considerando o empoçamento, o déficit primário deve ser de 1,3% do Produto Interno Bruto (PIB), disse o secretário, pela metodologia de cálculo usada pelo Tesouro Nacional. Ele não informou o percentual pela metodologia do BC.
Ceron também afirmou que uma eventual decisão favorável do Supremo Tribunal Federal (STF) para permitir ao governo quitar R$ 95 bilhões de estoque de precatórios em 2023 não afetará o cumprimento da meta de resultado primário, porque o governo pediu à corte uma diferenciação de classificação entre primário e financeiro no montante de precatórios.
A piora nas projeções para as contas do governo central consta do Relatório Bimestral de Avaliação de Receitas e Despesas relativo ao quinto bimestre deste ano, divulgado ontem pelos ministérios. O aumento do déficit previsto é resultado de uma combinação de alta nas projeções das despesas e queda nas estimativas de receitas.
No caso das receitas, a projeção para as administradas pela Receita Federal caiu R$ 22,2 bilhões do relatório de setembro para este de novembro. São dois os principais motivos: redução de R$ 9 bilhões na projeção de arrecadação com o Imposto de Importação, Imposto de Renda, Cofins e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), o que, segundo o secretário de Orçamento Federal, Paulo Bijos, é um reflexo da redução nos índices de inflação.
O segundo fator que explica a queda de receitas administradas é a retirada da previsão de entrada de R$ 12,6 bilhões de depósitos judiciais da Caixa Econômica Federal, transferência que não deve mais acontecer em 2023, admitiu ontem o governo, conforme havia antecipado o Valor. O montante ainda está sendo analisado pela área jurídica do banco para haver certeza se a cifra pertence à União.
Já a previsão para as despesas primárias aumentou R$ 21,9 bilhões de um relatório para o outro, dos quais R$ 16,3 bilhões são referentes a compensações para Estados e municípios em virtude da redução da alíquota modal (padrão) de ICMS que incide sobre combustíveis, e R$ 4,3 bilhões para aumento do piso mínimo de investimento em saúde neste ano, conforme já havia antecipado o Valor.
Apesar da piora dos dados, o secretário do Tesouro não vê contaminação para 2024 e diz que a equipe econômica continuará perseguindo o déficit zero. “Nada muda em relação a 2024 [buscar o déficit zero]. Estamos tomando todas as medidas para recompor as receitas”, afirmou em entrevista coletiva.
O economista Marcos Mendes avalia que “era de se esperar uma estratégia de antecipar despesas e postergar receitas, piorando o resultado de 2023 para facilitar a execução orçamentária de 2024, visto que a meta de déficit zero para 2024 é desafiadora”. Ele cita a antecipação do apoio financeiro a Estados e municípios para este ano, algo que seria pago ao longo de três anos, e os depósitos da Caixa, que podem entrar como receita no ano que vem.
Os ministérios também anunciaram ontem a necessidade de aumentar o bloqueio de recursos do Orçamento em R$ 1,1 bilhão, chegando a R$ 5 bilhões, para cumprimento do teto de gastos, regra ainda em vigor neste ano. O detalhamento de quais pastas serão atingidas sairá na próxima semana, por meio do decreto de programação orçamentária e financeira.
Fonte: Valor Econômico

