Por Fernanda Guimarães — De São Paulo
07/12/2023 05h03 Atualizado há 5 horas
Depois de um período morno, os fundos imobiliários estão voltando a olhar o mercado em busca de recursos por meio de ofertas de cotas, em um momento em que o ciclo de corte de juros pelo Banco Central (BC) começa a colocar combustível nessa indústria. Hoje há mais de R$ 16 bilhões em emissões à espera de uma janela no pipeline, segundo dados coletados pela gestora Hedge. A projeção, segundo especialistas, é a de que os fundos de tijolos, que são aqueles que investem diretamente nos empreendimentos, voltem a ganhar destaque, após um período dominado pelos fundos de recebíveis. Até o fim de outubro as captações no ano somaram R$ 18,3 bilhões, sempre considerando os fundos listados.
O sócio da XP Asset, Pedro Carraz, aponta que já era esperado um ano mais difícil para levantar mais capital, tendo os juros em 13,75% em janeiro, patamar de Selic que machuca a indústria. No entanto, ao longo do ano, foram abertas algumas janelas, ainda que restritas. Uma delas ocorreu a partir de maio, com números mais otimistas no mercado local. Naquele momento, os fundos maiores – e mais líquidos -, que já aguardavam uma brecha para levantar capital, foram para a rua depois de observarem valorização de suas cotas. Nesse espaço, a XPMalls, por exemplo, conseguiu captar. “Estávamos com a documentação em estágio avançado e conseguimos emendar duas captações, a primeira para o investidor institucional, cujo processo é mais rápido, e depois para o varejo”, afirma Carraz. Juntas, o fundo colocou R$ 942 milhões no caixa. “Ainda estamos terminando de alocar o caixa e vamos anunciar mais duas transações ainda neste ano”, afirma o executivo.
Para 2024, segundo Carraz, a projeção é positiva, não só em termos de momento mais adequado para emissões de cotas, mas também de olho na valorização dos fundos. E isso de forma mais ampla em toda a indústria. Dentre os fundos de tijolos que conseguiram acessar o mercado, além dos investidores em shoppings, um setor que tem sido muito demandado dadas as estimativas positivas e movimento de fusões e aquisições dentro do segmento, outro destaque foi o de logística. Os demais tendem a ganhar tração no próximo ano, afirma o executivo.
O sócio da RBR, Bruno Nardo, explica que uma característica técnica da indústria de fundos imobiliários também deve ajudar a dar uma tração adicional já no início do ano, especialmente aos fundos de tijolos, que investem diretamente nos empreendimentos. Ao final de cada exercício, as gestoras precisam contratar um laudo de avaliação para revisar o valor patrimonial do fundo, ou seja, atualizar o valor de cada ativo. Como os juros estão menores do que o último laudo realizado, no fim de 2022, o novo documento mostrará valorização dos ativos.
“Com isso, a diferença entre o valor patrimonial e o valor de mercado dos fundos ficará ainda mais distante, ou seja, eles estarão mais baratos e isso tende a contribuir para uma valorização”, diz. Atualmente, segundo os dados mais recentes da B3, referentes ao mês de setembro, o valor de mercado dos fundos imobiliários listados somava R$ 150 bilhões, ao passo que o valor patrimonial, R$ 223 bilhões.
Nardo estima, ainda, um nova janela ainda no fim deste ano e projeta novas emissões no período. Sua estimativa é a de que em termos de captação a indústria feche com ofertas entre R$ 22 bilhões e R$ 24 bilhões, o que demonstra uma janela ainda ativa em dezembro. Para 2024, a projeção do executivo é de um bom ano, com as emissões por fundos imobiliários indo para até R$ 28 bilhões. Em 2022, a captação total foi de R$ 21,4 bilhões.
Além da rápida janela para emissões de cotas que se abriu em maio, houve uma expectativa para emissões entre setembro e outubro, o que não se confirmou após dados negativos de inflação nos Estados Unidos, frustrando uma fila de operações que estavam engatilhadas. Algumas ofertas ficaram, com isso, represadas, mas tendem a vir a partir de agora, diante da melhora do cenário de juros por lá, após divulgações mais recentes. “No Brasil as condições estão postas para se baixar a Selic mais do que o anunciado pelo BC. E, com isso, se torna os produtos incentivados ainda mais atrativos”, afirma o sócio da gestora Hedge, André Freitas, um veterano nessa indústria.
Freitas mostra um dado que traz a indicação de que os fundos de tijolos já começaram a ganhar alguma tração neste ano: as emissões de fundos de Certiticados de Recebíveis Imobiliários (CRIs), papel de renda fixa que ganha mais fôlego em momentos de juros altos, correspondem neste ano, até o momento, a 44% do volume total captado pela indústria. No ano passado, esse percentual foi de 57%.
Já o sócio da Paramis Capital, Ricardo Mateoli, aponta que o cenário de corte de juros é um impulsionador para o mercado de fundos imobiliários e que depois de um longo período de espera a janela de captação finalmente reabriu, com os investidores voltando a demonstrar apetite pelo produto. A Paramis, que em novembro lançou um novo fundo e captou R$ 125 milhões, registrou demanda dos investidores suficiente para vender o lote adicional. “Vínhamos mapeando o mercado, mas antes não tinha condição de se fazer a oferta”, comenta.
Gustavo Rassi, sócio da Cy Capital, gestora que possui a incorporadora Cyrela como acionista majoritária, destaca, ainda, que esses fundos imobiliários híbridos, que tem liberdade em seus mandatos, conseguem navegar os diferentes econômicos, mas ainda enfrentam um menor entendimento por parte do investidor, visto que o produto é novo.
“Sob a ótica do gestor, tenho mais liberdade de aproveitar as oportunidades do mercado. Sob a ótica do investidor, temos percebido uma demanda, mas às vezes ele acaba preferindo os fundos temáticos, porque entende melhor no que ele está investimento”, comenta Rassi. A gestora está com um fundo na rua para captação, mas não pode comentar por estar em período de silêncio.
O sócio da Jive e CIO dos fundos Mauá, Brunno Bagnariolli, frisa o destaque dos fundos de recebíveis, que navegam melhor em cenário de mais incertezas e juro mais alto. “Essa é uma classe mais defensiva. Melhorando o mercado, os fundos de tijolo aparecem. Esse mercado está represado”, diz. Segundo ele, o mercado ainda deve ser dominado pelos recebíveis, mas a previsão é de um ano mais positivo para captações dos fundos de tijolos.
No ano, as ofertas de fundos já listados (“follow-on) predominaram, com maior dificuldade para novos fundos por meio de IPOs (ofertas iniciais). Algumas dessas novas captações que foram bem-sucedidas vieram de fundos cetipados, como são conhecidos os fundos não listados, como a da Manatí Capital.
“São mais de 500 fundos listados em bolsa e temos trabalhado com teses para trazer produtos diferenciados ao mercado”, diz Eduardo Mekbekian, sócio da gestora. A opção, após identificar demanda por crédito no mercado, foi de lançar um produto estruturado de crédito. “Grande parte das ofertas foram pautadas em fundos de papel, seja CRI ou ‘hedge funds’, exatamente porque eles acabam tendo uma capacidade de se posicionar no momento atual da economia.”
Fonte: Valor Econômico

