29 Apr 2024 CÍCERO COTRIM MARIANNA GUALTER
A percepção de que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) pode demorar mais para cortar os juros nos Estados Unidos e o novo aumento da tensão fiscal no Brasil, deflagrado pela mudança das metas de resultado primário, já fazem o mercado vislumbrar uma chance crescente de o Banco Central (BC) ser forçado a encerrar o ciclo de afrouxamento monetário com uma taxa Selic de dois dígitos, provavelmente em 10%.
Embora não seja majoritária, essa projeção já aparece nos cenários do Citi, da XP Investimentos e do JPMorgan. A A.C. Pastore & Associados aumentou recentemente a estimativa de 9,25% para 10%, passando a considerar no cenário três cortes de 0,25 ponto porcentual – incluindo a próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), em maio. O consenso do mercado está em 9,5% nas pesquisas Focus e do Projeções Broadcast.
O economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor do BC e consultor da A.C. Pastore, diz que a combinação de economia forte, incerteza fiscal e valorização do dólar restringiu o espaço de redução dos juros. Ele elevou a projeção de expansão da economia este ano, de 1,8% para 2,3%.
“Trabalhamos com um crescimento do PIB superior a 2% este ano, que é maior do que o potencial e significa um fechamento adicional do hiato do produto”, afirma ele. “Também temos um fiscal complicado e com sinalização de que a trajetória de resultados primários vai ser pior daqui para a frente.”
Na ata da reunião de novembro, o Comitê de Política Monetária já havia subido o tom em relação à importância das metas fiscais, lembra Schwartsman. Em um trecho do documento, o colegiado reconheceu um aumento da incerteza em relação a esses alvos, com consequente elevação do prêmio de risco.
REVERSÃO DE EXPECTATIVAS. A essas pressões internas soma-se o cenário internacional. Nas últimas duas semanas, após a divulgação da inflação ao consumidor americano de março, houve uma forte reprecificação das apostas do mercado na trajetória dos juros do País, que chegaram a indicar até seis cortes este ano – e, agora, sugerem algo entre um e dois, se houver. O dólar subiu quase 2% e se consolidou acima da marca de R$ 5, sinalizando pressão na inflação doméstica.
“No último semestre do ano passado houve um cenário mais benigno que abria espaço para uma queda de juros maior, mas ele foi revertido”, afirma o economista-chefe da XP Investimentos, Caio Megale. A corretora elevou a projeção de taxa Selic no fim do ciclo, de 9% para 10%. •
Fonte: O Estado de S. Paulo

