A União Europeia (UE) está se esforçando para conter a influência crescente da China em todo o mundo, com Pequim se mostrando mais ágil em fornecer investimentos em infraestrutura a países do Sul global. O alerta é da maior autoridade de desenvolvimento do bloco.
Jutta Urpilainen, comissária europeia para parcerias internacionais, diz que a burocracia e as condições sócio-ambientais atreladas aos financiamentos da UE tornam mais difícil para o bloco contrabalançar a Iniciativa do Cinturão e da Rota (BRI, na sigla em inglês).
“Estamos vivendo uma era de competição geopolítica”, disse Urpilainen ao “Financial Times”. “Enfrentamos uma batalha de narrativas, mas cada vez mais enfrentamos uma batalha de ofertas”, afirmou ela, referindo-se às promessas da China de financiamento ágil e conclusão rápida de projetos.
“É verdade que podemos não ser o parceiro mais rápido. A China tem sido muito estratégica. Se você viaja pela África, por exemplo, pode ver resultados palpáveis da cooperação com a China, seja em estádios de futebol, ferrovias, portos ou rodovias”, afirmou ela.
Como parte da BRI, a China investiu quase € 1 trilhão em 152 países entre 2013 e a metade de 2023, segundo o centro de estudos American Enterprise Institute. Porém, esse financiamentos caíram drasticamente em termos anuais com o crescente número países deixando de honrar seus pagamentos a partir de 2020. A China renegociou ou deu como perdidos cerca de US$ 78,5 bilhões em empréstimos entre 2020 e março de 2023.
Urpilainen reconheceu que os parceiros da UE também recebem bem os investimentos de Pequim. Mas ela observou que as empresas chinesas muitas vezes constroem projetos que também financiam, e insistiu que a UE é uma parceria melhor no longo prazo. “Essa parceria criou uma dependência enorme da China. Nosso objetivo – e isso é do nosso próprio interesse – é fortalecer a resiliência, a autossuficiência e a independência dos nossos parceiros”, disse ela.
A UE busca ajudar os países parceiros a subirem na escala de valor, diz ela. Por exemplo, os investidores da UE interessados em desenvolver uma mina em um país também precisam se comprometer em processar o minério nesse país.
O Global Gateway da UE, concebido para funcionar entre 2021 e 2027, busca mobilizar até € 300 bilhões em investimentos em projetos infraestrutura em países de baixa renda. Visa estabelecer parcerias internacionais que evitem que os beneficiados formem “dependências” dos doadores, “enquanto nós, como doadores, estamos impondo e dizendo o que eles devem fazer”, afirmou Urpilainen.
Os países pobres “não querem ser objeto de ajuda. Eles querem ter uma parceria igualitária”, acrescentou ela.
O Global Gateway reúne bancos de desenvolvimento da UE, governos nacionais e a Comissão Europeia, além do setor privado, para investimentos em infraestrutura, mineração e outros projetos industriais. Até agora, empenhou cerca de € 100 bilhões em 225 projetos e Urpilainen diz estar confiante de que o projeto atingirá a meta de € 300 bilhões até 2027.
Mas ela afirma que as novas regras ambientais da UE que dificultam a exportação de produtos como cacau e aço para o bloco vêm alienando parceiros. Estas incluem a lei de desmatamento que obriga os exportadores de seis commodities, como café, óleo de palma e borracha, a provar que eles não foram produzidos em terras recentemente desmatadas.
Vários governos da Ásia, África e América Latina reclamam que as regras são onerosas e poderão destruir os meios de subsistência de dezenas de milhares de pequenos agricultores incapazes de lidar com os complicados procedimentos de certificação, que incluem a geolocalização de suas culturas. O comissário europeu da Agricultura, Janusz Wojciechowski, e os ministros de 20 Estados-membros também pediram a suspensão da lei, que se aplica ao bloco todo.
Embora a UE tenha flexibilizado temporariamente as exigências da lei, em resposta às preocupações, Urpilainen disse ser favorável em adiar a implementação. “Talvez devêssemos considerar isso. Acho que é importante ter um diálogo e depois ajudar os nossos parceiros a cumprir as condições.”
A comissária também rebateu as críticas de que a UE está condicionando os financiamentos a medidas dos países para combater a migração, assinando acordos com regimes autocráticos na Tunísia e Egito. Os dois países são rotas de passagem para migrantes que tentam chegar a Europa atravessando o mar Mediterrâneo. “Existe esse objetivo de impedir a migração? Não”, afirmou disse ela.
Mas observando que a África deverá ter uma população de 2,5 bilhões até 2050, comparado a cerca de 450 milhões na UE, ela acrescentou: “É do nosso interesse melhorar os meios de subsistência e criar oportunidades para os cidadãos da África, especialmente para os jovens”.
fonte: valor econômico

