Por Victor Rezende e Gabriel Roca — De São Paulo
31/07/2023 05h02 Atualizado há 4 horas
Se, naturalmente, as decisões do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central já atraem o foco dos participantes do mercado, a reunião de quarta-feira promete estar ainda mais no centro das atenções. O início de um ciclo de flexibilização monetária é certo, mas a magnitude do ajuste a ser promovido pelo colegiado é um ponto que divide os agentes, que também não indicam consenso em relação à votação do Copom e à comunicação do colegiado. Para alguns, é possível que a decisão seja unânime, mas uma ala no mercado espera dissenso com a chegada de novos diretores ao comitê.
No levantamento conduzido entre os dias 25 e 28 de julho pelo Valor, com 128 instituições financeiras e consultorias, 82 casas (ou 64,6% do total) projetam uma redução de 0,25 ponto percentual na Selic, que já a começa a se despedir dos 13,75% após quase um ano nesse nível. Já a aposta em uma queda de 0,5 ponto na taxa básica de juros é defendida por 44 casas (ou 34,6% do total).
O consenso nas expectativas dos economistas para a Selic difere do que está precificado no mercado. As opções digitais para a decisão de quarta-feira indicavam, no fechamento de sexta-feira, 55% de possibilidade de uma redução de 0,5 ponto e 42% de probabilidade de um corte de 0,25 ponto.
Há motivos de sobra para a divisão e a incerteza no mercado sobre o resultado da reunião do Copom de quarta-feira. A chegada dos diretores Gabriel Galípolo e Aílton Aquino ao comitê adiciona imprevisibilidade, ao mesmo tempo em que o cenário econômico sanciona o tom de dúvidas dos agentes.
Por um lado, houve uma evolução favorável na dinâmica inflacionária, com os preços correntes em trajetória mais branda e redução no grau de desancoragem das expectativas de médio e longo prazo. Além disso, sinais de enfraquecimento da atividade se acumularam e os prêmios de risco do Brasil sofreram redução adicional nas últimas semanas. Por outro lado, a força do mercado de trabalho e a dinâmica da inflação de serviços ainda geram dúvidas, ao mesmo tempo em que a comunicação do BC indicou parcimônia nos cortes.
“Há argumentos bons para os dois lados”, diz o economista-chefe da JGP, Fernando Rocha, que vê espaço para um início de desaperto mais célere, ao esperar que a maioria dos integrantes do Copom opte por um corte de 0,5 ponto na Selic. “Acredito que, na reunião passada, a discussão no colegiado para a decisão de agosto era sobre entregar um corte de 0,25 ponto ou manter a Selic parada. Penso que haverá uma evolução: quem estava pensando em manutenção pode ver espaço para um corte de 0,25 ponto e quem, em junho, esperava um corte de 0,25 ponto pode votar por uma redução de 0,5 ponto.”
Rocha, assim, diz esperar um placar que mostre divisão dos diretores do BC, mas ressalta que o nível de incerteza na expectativa para a decisão é alto. “É uma reunião que tem deixado opiniões bem divididas no mercado”, ressalta.
Em relação ao sentimento do mercado para a reunião, há uma indefinição sobre a distribuição de votos no Copom, o que alimenta as dúvidas sobre a decisão em si. Há, no mercado, agentes que esperam divisão acentuada no comitê; há quem pense que apenas os dois novos integrantes do colegiado votarão de forma diferente; e há uma parcela dos agentes que espera que o presidente do BC, Roberto Campos Neto, consiga costurar um consenso no colegiado.
Pesquisa do BTG Pactual conduzida com 107 participantes do mercado, incluindo economistas, traders, gestores e estrategistas, mostra que a maioria dos entrevistados (70%) acredita em uma decisão dividida na quarta-feira.
O economista-chefe do Banco BV, Roberto Padovani, partilha da sensação de incerteza em torno da decisão. Em seu cenário básico, ele espera uma redução de 0,25 ponto na Selic, em linha com o consenso dos economistas de mercado, ao dar ênfase ao comportamento dos núcleos de inflação e da inflação de serviços, cujos níveis ainda são incompatíveis com o cumprimento da meta.
Para Padovani, os juros nominais estão tão acima do nível neutro que o BC poderia começar o ciclo com um corte de 0,5 ponto, “o que seria um ritmo absolutamente cabível”. No entanto, haveria uma dificuldade adicional de comunicação, na avaliação do profissional. “Se o BC começar com corte de 0,5 ponto, o mercado provavelmente vai achar que o Copom vai acelerar para um ritmo maior. Acho que é uma estratégia de coordenação das expectativas, e a opção por cortar em 0,25 ponto seria mostrar que ainda há desafios.”
Como exemplos, Padovani cita a desinflação lenta dos preços de serviços; a incerteza sobre os efeitos do El Niño e as dúvidas que mantêm as expectativas inflacionárias de médio e de longo prazo desancoradas no Boletim Focus.
Assim, para Padovani, a comunicação deve soar como um corte de juros “hawkish” (conservador). “Como ele costura isso? Justamente chamando atenção para o fato de os núcleos de inflação estarem elevados e mostrando uma desinflação mais lenta, alertando que a ancoragem das expectativas não está completa e que isso exige, portanto, uma postura vigilante.”
A avaliação se assemelha à visão defendida pelo economista-chefe da Reag Investimentos, Marcelo Fonseca. Embora acredite que o ciclo de flexibilização deveria ter início com um corte parcimonioso da Selic, de 0,25 ponto, Fonseca espera que o Copom entregue uma redução de 0,5 ponto. “Ainda temos problemas. Os núcleos de serviços estão bem mais altos que a meta. Além disso, os salários nominais têm rodado em um patamar muito alto, o que coloca uma dificuldade adicional para uma desinflação nos preços de serviços”, diz.
Apesar disso, o economista da Reag lista três motivos que podem dar base ao corte mais agressivo dos juros, que está contemplado em seu cenário: uma desaceleração mais evidente da atividade; o nível apertado das condições monetárias, com o juro real bem acima do nível neutro; e uma avaliação, pelo BC, do total do ciclo de flexibilização, que poderia permitir um início mais célere dos cortes. “O ‘orçamento implícito’ no Focus está em torno de 4 pontos de corte. Assim, uma redução de 0,5 ponto seria um passo mais compatível.”
O nível elevado dos juros e o “orçamento” grande de cortes à frente são pontos citados pela economista-chefe do Bocom BBM, Cecília Machado, para defender uma redução de 0,5 ponto na taxa de juros. Ela, além disso, enfatiza que houve uma melhora do cenário.
“O BC queria observar as expectativas mais longas de inflação convergindo para a meta, queria ver uma desaceleração da atividade consistente com o grau de aperto já produzido e queria ter mais confiança no processo da dinâmica desinflacionária”, enumera. E, nos três aspectos, para a economista, houve melhoras substanciais.
“A meta foi mantida em 3% e, depois disso, vimos alguma convergência das expectativas mais longas. O segundo ponto é em relação à desaceleração da economia e já estamos vendo sinais de que a política monetária está atuando. É possível perguntar se é suficiente, mas a trajetória está indo na direção dos cortes”, aponta.
Fonte: Valor Econômico

