Por Anaïs Fernandes e Victor Rezende — De São Paulo
06/09/2022 05h01 Atualizado há 5 horas
A desaceleração da economia brasileira esperada para a segunda metade do ano, em linha com condições financeiras mais apertadas e um enfraquecimento global, está mais para uma “pisada no freio” do que para uma “recessão substancial”, afirma Caio Megale, economista-chefe da XP. Isso, somado a uma “herança” mais forte da atividade no primeiro semestre, levou a casa a revisar sua projeção de PIB para o país em 2022, de 2,2% para 2,8%.
A alta de 1,2% do PIB no segundo trimestre em relação ao primeiro, divulgada na semana passada pelo IBGE, sinalizou uma dinâmica de recuperação consistente, aponta a XP em relatório antecipado ao Valor. “A principal razão da revisão é um primeiro semestre que foi muito mais forte do que a gente imaginava, especialmente o setor de serviços, mas também consumo, investimento”, diz Megale.
Para o terceiro trimestre, a retomada do mercado de trabalho, estímulos fiscais adicionais de curto prazo (como o aumento do Auxílio Brasil) e alívio na pressão inflacionária tendem a permitir um arrefecimento da economia mais suave do que o inicialmente esperado, segundo a XP. A estimativa é de uma taxa de desemprego de 8,5% no fim de 2022 e de 8,2% em 2023 – as previsões anteriores eram de 9% e 9,2%, pela ordem.
“Não vemos quedas importantes do consumo, de investimentos à frente. A gente vê uma pisada no freio, talvez um zero a zero, alguns meses de queda, mas é a tendência de desaceleração que já está acontecendo em alguns setores”, observa Megale.
Ainda assim, segundo ele, essa perspectiva torna, por ora, mais difícil ter projeções de PIB para 2022 em 3% ou mais. “Em algum momento o juro de 14%, a inflação alta fazem a diferença. Foi um aumento [do PIB no primeiro semestre] mais forte, ligado a fatores cíclicos e alguns estruturais, mas isso não vai nos livrar de uma desaceleração no segundo semestre.”
A XP também elevou sua previsão para o PIB em 2023 de 0,5% para 1%. Com o novo cenário deste ano, o carregamento estatístico de 2022 para 2023 – o efeito assumindo taxas de variação trimestral seguintes nulas – passou de 0,2 para 0,7 ponto percentual, nos cálculos da XP. A “herança estatística” mais favorável e impulsos fiscais devem mais do que compensar a desaceleração da atividade econômica global e a política monetária doméstica no campo amplamente contracionista em 2023.
A XP revisou ainda suas projeções de inflação, de 6,8% para 6,1% em 2022 e de 5,5% para 5,3% em 2023, devido à menor inércia inflacionária. A redução para este ano não se baseia apenas nas medidas de corte de impostos do governo. “Nossa projeção já foi de 9%, está caminhando para 6%, mas as desonerações, no melhor cenário, deixariam em 7%, então, tem uma tendência de desinflação que vai além“, diz Megale, citando a queda nos preços dos combustíveis e das commodities no exterior. A inflação de alimentação e a de bens industriais já demonstram descompressão, nota ele. “Minha impressão é que a tendência de inflação global e brasileira virou. Não é que vai cair na mesma velocidade que subiu, mas virou.”
Mesmo assim, Megale considera difícil um corte da Selic já no primeiro semestre de 2023. “Acho que seria forçar um pouco a barra, porque ainda vamos estar com projeções de inflação para o ano no topo da banda”, diz. A XP projeta taxa básica de juros de 13,75% no fim deste ano e de 10% no próximo.
No cenário de inflação para 2023, a XP não inclui, por enquanto, a extensão da desoneração de impostos federais sobre combustíveis, embora haja espaço reservado para isso no Orçamento apresentado. A medida retiraria 0,44 ponto da projeção de IPCA do ano que vem, segundo a XP.
“É uma hipótese política, mas tem um fundamento econômico nas contas públicas. A desoneração de PIS/Cofins custa mais de R$ 50 bilhões por ano, é muito dinheiro. Vamos começar 2023 elevando despesas, mantendo os R$ 600 de Auxílio Brasil, provavelmente aumentando o salário de servidores. Tem quase R$ 200 bilhões de despesas adicionais na conta, acho que o próximo governo não vai conseguir manter esse PIS/Cofins zerado nos quatro anos, é muito difícil retomar credibilidade fiscal assim”, afirma Megale.
Fonte: Valor Econômico

