Por meio de um comunicado com poucas novidades, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central decidiu de forma unânime manter a taxa Selic em 15% pela segunda reunião consecutiva e reforçou que os juros seguirão em patamar restritivo por período “bastante prolongado”.
Mesmo após uma rodada de melhora das expectativas de inflação compiladas no Boletim Focus e uma apreciação adicional da taxa de câmbio doméstica desde a reunião anterior do colegiado, em julho, a autarquia fez apenas algumas mudanças na comunicação, o que ajudou a reiterar a sua atual postura conservadora. Na visão de economistas do mercado, isso tende a afastar a expectativa por um corte de juros ainda neste ano.
Segundo o Copom, o cenário permanece marcado por expectativas de inflação desancoradas da meta de 3%, resiliência na atividade econômica doméstica e um mercado de trabalho forte. O colegiado voltou a dizer que o cenário atual, “marcado por elevada incerteza, exige cautela na condução da política monetária” e afirmou que “não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso julgue apropriado.”
De acordo com o BC, o cenário doméstico “segue apresentando” certa moderação no crescimento, “mas o mercado de trabalho ainda mostra dinamismo”.
“O comunicado preservou o tom conservador do Copom, mas não foi necessariamente mais duro do que a gente esperava”, diz Iana Ferrão, sócia e economista do BTG Pactual.
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Entre os pontos que considera como “ajustes marginais” para o lado mais conservador, ela cita a repetição da menção ao “período bastante prolongado” de juros elevados; a caracterização de uma atividade doméstica ainda forte, com apenas “certa moderação”; e a manutenção da projeção de inflação do horizonte relevante (primeiro trimestre de 2027) em 3,4%.
Na avaliação de Ferrão, a projeção de inflação estável em 3,4% foi uma surpresa, ainda que pequena, já que o mercado esperava alguma redução por conta da apreciação da taxa de câmbio doméstica e o recuo das expectativas do Focus.
Para Paulo Val, economista-chefe da Occam, esse foi o ponto mais conservador e o destaque do comunicado. Segundo ele, é provável que uma revisão da estimativa do BC para o hiato do produto (capacidade ociosa da economia) tenha motivado a manutenção da projeção do IPCA no horizonte relevante.
No geral, Val afirma que a decisão de ontem do Copom foi um pouco mais dura do que se esperava e afasta ainda mais a possibilidade de cortes de juros em 2025.
“[O comunicado] tem essa consequência de postergar ou pelo menos diminuir muito a probabilidade de cortes em dezembro. Considerando o atual discurso do Copom, para reduzir a Selic esse ano precisaria de algo muito forte, como uma apreciação maior do real ou uma surpresa para baixo da atividade econômica”, diz Val.
O cenário-base da Occam contempla um primeiro corte da Selic em março, de 0,5 ponto percentual, e uma taxa de 13% no fim de 2026. Para Val, a projeção é consistente com o comunicado do Copom e cumpriria a sinalização do comitê de juros elevados por “período bastante prolongado”.
Ferrão, do BTG, concorda que a decisão desta quarta-feira reforça a perspectiva de juros estáveis até o fim do ano, mas não descarta completamente a possibilidade de corte ainda em 2025. Para ela, a aceleração dos núcleos da inflação e dos preços no setor de serviços em agosto já havia diminuído a chance de que o Copom antecipasse o início do ciclo de flexibilização monetária.
Na avaliação de Ferrão, o Copom teria que observar ao menos dois dos seguintes fatores para antecipar o primeiro corte de juros para dezembro: uma desaceleração mais clara do mercado de trabalho; surpresas baixistas relevantes no IPCA “cheio” ou uma retomada da trajetória de desaceleração da inflação de serviços, após a aceleração de agosto; e um avanço adicional, ainda que parcial, na ancoragem das expectativas de inflação. “Ou seja, teremos que ter surpresas no cenário. Como está hoje, não vemos espaço [para corte de juros em 2025]. Mas não é algo que deve ser descartado, até lá dá tempo de ajustar a comunicação.”
Dentre as poucas mudanças notáveis do comunicado, o Copom retirou a sinalização de que antecipa uma “continuação na interrupção no ciclo de alta de juros”. Para Ferrão e Val, essa alteração mostra que o comitê está mais confiante de que a Selic em 15% é suficiente para levar a inflação à meta de 3% ao longo do tempo.
“Apesar de retirar isso e aparentemente estar mais convicto com os juros de 15%, me parece que a redação que ele fez diminui muito a possibilidade de um corte mais cedo”, reforça o economista-chefe da Occam ao referir-se ao fato de que o Copom manteve a indicação de que poderá voltar a elevar a Selic, caso avalie como necessário.
Segundo Ferrão, o fato de que o Copom manteve em aberto a possibilidade de voltar a elevar os juros indica “cuidado para que o ajuste na comunicação não soasse suave demais”.
Fonte: Valor Econômico

