A disposição de alguns bancos de assumir perdas com os chamados créditos imobiliários em dia chega na esteira de várias advertências de que essa classe de ativos é a “próxima bola da vez”, após as recentes turbulências no setor bancário regional americano.
“O fato de que os bancos querem vender créditos está sendo citado em muitas conversas”, disse Chad Littell, analista da CoStar, uma firma de análises especializada em imóveis comerciais. “Estou ouvindo mais sobre isso do que em qualquer outro momento nos últimos dez anos.”
O HSBC USA está em processo de venda de centenas de milhões de dólares em créditos imobiliários comerciais, possivelmente com algum desconto, como parte de seu esforço para sair do segmento de créditos diretos a incorporadoras imobiliárias dos EUA, segundo três fontes a par do assunto.
Enquanto isso, em maio, o PacWest vendeu, com prejuízo, um total de US$ 2,6 bilhões em créditos para construtoras. E vários outros bancos estão alterando a forma como contabilizam as dívidas imobiliárias comerciais, o que facilitará vendas semelhantes no futuro.
Normalmente, os bancos relutam em aceitar perdas em grandes conjuntos de créditos que, se os devedores pagassem em dia, manteriam seu valor de face. Ainda assim, alguns bancos estão sendo convencidos a dar esse passo, em meio ao temor de aumento na inadimplência – em especial no segmento de dívidas garantidas por propriedades de escritórios, cuja procura entrou em queda, uma vez que a adesão ao trabalho remoto se manteve alta.
Ao mesmo tempo, uma desaceleração na demanda por títulos lastreados em hipotecas comerciais deixou bancos de todos os tamanhos detendo um volume de dívidas imobiliárias maior do que eles ou as autoridades reguladoras gostariam.
Embora as vendas de créditos com pagamentos em dia não estejam no mesmo patamar visto durante a crise financeira mundial de 2008, muitos participantes do mercado preveem que o volume de negócios aumentará em 2023 e 2024.
Enquanto os bancos se preparam para fechar o segundo trimestre, “eles estão superfocados em manter uma carteira de empréstimos limpa”, disse David Aviram, diretor da Maverick Real Estate Partners, um fundo de private equity especializado em créditos imobiliários comerciais. “Os bancos não querem aumentar as preocupações dos reguladores ou investidores.”
A movimentação dos bancos para vender os créditos se dá enquanto executivos e reguladores estão soando mais alarmes sobre a saúde do setor imobiliário comercial.
Na semana passada, o executivo-chefe do Wells Fargo, Charlie Scharf, disse a analistas e investidores que o banco, que tem US$ 142 bilhões em créditos imobiliários comerciais por vencer, vem administrando sua exposição ao segmento. “Veremos perdas, sem dúvida”, disse Scharf.
Por sua vez, também na semana passada, Martin Gruenberg, presidente do conselho de administração do Federal Deposit Insurance Corp. (FDIC), agência do governo dos EUA que garante depósitos bancários, advertiu que os créditos imobiliários — em especial aqueles garantidos por prédios de escritórios — se depararão com desafios, se a demanda continuar fraca e “os valores continuarem a perder força”.
“Serão questões de atenção contínua da FDIC na supervisão”, acrescentou.
Outros bancos vêm mudando a forma como contabilizam os créditos, mudando sua designação, que antes era de “manter até o vencimento”, para “disponível para venda”, um passo que facilita a venda da dívida no futuro.
O Citizens, que vem reduzindo seus créditos para propriedades comerciais, mais que dobrou seu estoque de empréstimos disponíveis para venda, para US$ 1,8 bilhão, durante o primeiro trimestre. Assim como muitos outros bancos, o Citizens não revela qual porcentagem desses créditos se refere a captadores de créditos imobiliários comerciais.
O Customers Bancorp, com sede na periferia da Filadélfia, reduziu seus créditos imobiliários comerciais em quase US$ 25 milhões no primeiro trimestre. Também recategorizou US$ 16 milhões desses créditos para uma designação de “mantidos para venda”, sendo que no trimestre anterior não tinha nenhum empréstimo nessa categoria.
Uma corretora de créditos informou estar se preparando para levar ao mercado várias operações nas próximas semanas e que vem detectando a maior atividade em três anos.
Fora do segmento de prédios de escritórios, os descontos aplicados às vendas de créditos cujos pagamentos estão em dia estão relativamente baixos e são guiados em parte pelos aumentos das taxas de juros.
A firma de investimentos imobiliários Kennedy-Wilson, por exemplo, aceitou pagar US$ 2,4 bilhões, US$ 0,92 por dólar, pelo bloco de empréstimos do PacWest que tinha um valor principal agregado de US$ 2,6 bilhões. As ações do PacWest subiram quase 20% após o anúncio da transação.
“Estamos recebendo mais ligações […] como resultado do que o PacWest conseguiu executar com a Kennedy-Wilson”, disse um investidor de crédito imobiliário. “Todos os bancos regionais estão olhando para o preço das ações e dizendo ‘o mercado realmente gostou disso e devemos executar algo semelhante’.”
De acordo com duas das fontes que tomaram conhecimento do processo de vendas do HSBC, os créditos estão atraindo lances que os avaliam na faixa média de 90% a 100% do valor de face – o que significa que o banco teria uma perda de até 5%.
O HSBC ainda não decidiu se está disposto a sofrer perdas com a venda ou de que tamanho elas poderiam ser, de acordo com outra fonte a par do processo. O HSBC não quis comentar o assunto.
Fonte: Valor Econômico

