Por Liane Thedim — Do Rio
10/01/2024 05h01 Atualizado há 5 horas
Juros altos, crise de crédito logo na virada do ano, cenário internacional instável: uma combinação que fez com que os títulos de renda fixa isentos fossem as grandes estrelas de 2023. Balanço divulgado ontem pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) mostra que os investimentos nesses papéis cresceram 35,5% frente a 2022, somaram R$ 283,9 bilhões até novembro e drenaram os recursos dos fundos de investimento, que, no ano, amargaram captação líquida negativa de R$ 127,9 bilhões. Foi o segundo ano seguido no vermelho – em 2022, os resgates superaram os investimentos em R$ 129 bilhões.
Os títulos isentos que vêm atraindo a atenção são as letras de crédito imobiliário (LCIs), do agronegócio (LCAs), certificados de recebíveis do agronegócio (CRAs) e imobiliários (CRIs), letras imobiliárias garantidas (LIGs) e debêntures incentivadas. Pedro Rudge, vice-presidente da entidade, destaca que, quando se levam em conta também os demais investimentos em renda fixa comumente oferecidos no mercado (CDBs, títulos públicos e debêntures tradicionais, além da caderneta de poupança), o total sobe para R$ 393,1 bilhões, um avanço de 15,1% em novembro de 2023 frente a dezembro de 2022.
“Tivemos concorrência e oferta maiores desses produtos, que têm sido bastante atrativos no cenário que vivenciamos em 2023 e que talvez continue nos primeiros seis meses de 2024, com juros ainda altos e investidores buscando instrumentos mais seguros e isentos de Imposto de Renda”, comentou Rudge.
No ano, os resgates dos fundos de renda fixa superaram em R$ 59,8 bilhões as aplicações e os dos multimercados, em R$ 134,3 bilhões. Já fundos de investimentos em direitos creditórios (FIDCs), fundo de investimento em cadeias agroindustriais (Fiagros) e fundos de investimento em Participações (FIPs), os chamados estruturados, têm saldo positivo de R$ 66,2 bilhões. O patrimônio líquido total dos fundos fechou 2023 em R$ 8,3 trilhões, com crescimento de 11,5% frente ao ano anterior.
“A saída dos multimercados chamou a atenção. Ela pode ser explicada pela instabilidade do cenário macroeconômico em 2023, que dificultou as estratégias dos gestores e fez o retorno ficar abaixo do CDI”, afirmou. “Os últimos dois anos foram bastante desafiadores, mas multimercados, ações e fundos imobiliários tendem a ganhar tração um ambiente de juros menores.”
Em agosto, o Banco Central (BC) começou o ciclo de afrouxamento monetário do país e, em quatro reuniões, levou a Selic de 13,75% ao ano para 11,75%. O mercado espera que o ritmo de cortes de 0,5 ponto percentual se mantenha em 2024, podendo a taxa chegar ao fim do ano abaixo de 9%.
O patrimônio líquido total dos fundos fechou 2023 em R$ 8,3 trilhões, com crescimento de 11,5% frente ao ano anterior
O vice-presidente da Anbima disse que a tributação dos fundos exclusivos fechados, aprovada no fim de novembro pelo Congresso, começou a causar uma movimentação maior de recursos a partir de outubro. Como, segundo ele, a grande maioria se enquadrava na classe de multimercados, “uma parcela não muito relevante” dessa captação líquida negativa pode ter sido reflexo desse movimento de migração.
O balanço de 2023 feito ontem pela Anbima mostrou ainda que a rentabilidade média no ano dos fundos multimercados perdeu para o CDI (13,1% ao ano). O melhor desempenho ficou com os da categoria juros e moedas, com média de 12,8% em 2023; seguidos dos multimercados livres, com 10,5% no ano; dos de estratégia específica, com 10,1%; e dos que têm alocação no exterior, com 9,1%. Enquanto isso, os fundos de renda fixa crédito livre tiveram rendimento médio de 13,6% no ano, os indexados, de 13,3%, os simples, de 12,4%, e os que investem em títulos soberanos, de 12,2%.
Já as ações, embora tenham apresentado forte volatilidade no ano, encerraram com retornos médios de 23,6% (fundos de ações livres), 21,7% (atrelados a índices da bolsa), 19,3% (investimentos no exterior) e 14,9% (concentrados em “small caps”). O Ibovespa fechou com alta de 22,3%. “Quem teve visão de longo prazo, não se assustou e manteve o dinheiro nos fundos, portanto, se beneficiou. Essas oscilações são normais e esperadas. Por isso a diversificação é importante, já que ameniza as variações”, disse Rudge. “O brasileiro tem o costume de tentar adivinhar qual classe vai melhor naquele ano, mas ideal é ter um mix.”
Segundo a Anbima, dezembro teve saídas líquidas de R$ 74,5 bilhões da indústria de fundos, concentradas em renda fixa e multimercados, que impactaram o resultado em todo o segundo semestre, que até então estava positivo. “Dezembro pode ter sido um ponto fora da curva. O setor público, por exemplo, tem um perfil de fazer movimentações concentradas, com saídas em dezembro e entradas em janeiro”, explicou. Dos R$ 49,3 bilhões que saíram em dezembro dos fundos de renda fixa, conforme os dados da entidade, por exemplo, R$ 21,78 bilhões eram de entes do poder público.
Fonte: Valor Econômico

