Por Anaïs Fernandes e Pedro Borg — De São Paulo
28/02/2024 05h01 Atualizado há 5 horasPresentear matéria
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No Brasil para participar dos encontros do G20, a secretária do Tesouro dos Estados Unidos, Janet Yellen, elogiou a aprovação da reforma tributária no país, disse que ele está bem posicionado para a transição verde e colocou os EUA à disposição para ajudar o Brasil a se integrar mais às cadeias globais.
“Parabenizo o ministro [da Fazenda, Fernando] Haddad e o Brasil pela realização de uma reforma tributária verdadeiramente histórica. Isso melhorará a facilidade de fazer negócios aqui, inclusive para as empresas americanas que desejam investir”, afirmou Yellen ontem durante evento da Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham Brasil) em São Paulo. Haddad também participaria, mas não pode comparecer após ser diagnosticado com covid. Em seu lugar, compareceu a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima do Brasil, Marina Silva.
À tarde, Yellen e Haddad realizaram uma reunião bilateral virtual, em que discutiram a forte relação entre os países e exploraram oportunidades de cooperação em objetivos comuns de crescimento inclusivo e sustentável, além do combate às alterações climáticas, informou a assessoria do Tesouro americano em nota. “Os Estados Unidos aguardam com expectativa um ano produtivo de envolvimento com o Brasil no G20”, diz.
No evento da Amcham, Yellen afirmou ser vital que o Brasil crie condições para que o setor privado invista e cresça.
Para a secretária, o país está particularmente bem posicionado para a transição global à neutralidade de carbono, considerando, por exemplo, a vantagem de uma rede energética que já se baseia em grande parte em energias renováveis. “Existem oportunidades significativas para o setor privado, incluindo as empresas americanas, em toda a economia verde do Brasil, desde o fomento adicional da sua transição para energia limpa até investimentos na indústria de alimentos e cosméticos à base de plantas”, exemplificou.
Há também, segundo ela, uma enorme oportunidade para o Brasil se tornar mais integrado às cadeias de valor globais, “e os Estados Unidos serão um forte parceiro do Brasil nesse esforço”, disse.
Medidas no sentido de endereçar tarifas externas elevadas e avançar na adoção de códigos e normas da OCDE, por exemplo, poderiam tornar o Brasil ainda mais atraente para os investidores estrangeiros, “criando oportunidades adicionais para ambas as nossas economias”, disse Yellen. A própria transição energética, apontou, vai exigir aportes sólidos em infraestrutura e tecnologia, gerando oportunidades tanto para o Brasil quanto para os EUA.
Yellen disse esperar que o Brasil, como parceiro da administração de Joe Biden, colabore com as iniciativas para cadeias de suprimentos limpas. “Há muitos programas que o governo Lula lançou para promover investimentos em energia limpa e acho que há um grande papel para a Amcham, de informar as empresas”, disse Yellen a Abrão Neto, CEO da Amcham, que mediou o debate. Na ocasião, a Amcham apresentou a Yellen e Marina uma série de propostas para aprofundar as relações Brasil-EUA, com foco em economia de baixo carbono, cadeias de fornecimento, comércio e investimentos.
A uma plateia de empresários Yellen afirmou ainda que os EUA estão empenhados em iniciativas multilaterais na região. Ela mencionou o trabalho do brasileiro Ilan Goldfajn à frente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), que “tem liderado reformas importantes e abrangentes”, inclusive “para posicionar a instituição para melhor apoiar o crescimento do setor privado da região para alimentar a transição verde”, disse.
“Os EUA, juntamente com outros acionistas, esperam concluir um aumento de capital para o braço do setor privado do BID no próximo mês”, acrescentou.
Sobre a economia americana, Yellen disse que ela dá sinais de resiliência e não deve enfrentar uma recessão neste ano, ainda que o crescimento de 2024 possa ser menor do que o de 2023. “Espero, sim, um crescimento sólido”, afirmou.
Ela ressaltou que, mesmo em um cenário de mercado de trabalho aquecido, a inflação está convergindo para a meta, algo que deve se manter neste ano. “Sou muito otimista com a economia americana no restante do ano”, disse.
Segundo Yellen, os resultados mostram que a fonte da inflação recente foi a pandemia e seus efeitos. “Estamos comprometidos em reduzir ainda mais a taxa de inflação”, afirmou.
Com boas perspectivas para 2024, os EUA estão agora concentrados no crescimento a longo prazo, segundo Yellen.
“Estamos muito satisfeitos com as respostas”, disse a secretária sobre a tríade de leis do governo Biden para incentivar investimentos em infraestrutura, indústria e energia limpa – Bipartisan Infrastructure Law, CHIPS and Science Act e Inflation Reduction Act.
Yellen falou em uma agenda econômica moderna pelo lado da oferta, o que, segundo ela, “é sobre fazer investimentos públicos inteligentes e bem focados” para impulsionar também os privados.
A secretária abordou ainda os reflexos dos conflitos atuais na economia global, minimizando os impactos econômicos da guerra na Faixa de Gaza e reforçando os apelos para que a Câmara dos Representantes dos EUA aprovem novo pacote de ajuda à Ucrânia.
Ao abordar o conflito no Oriente Médio, Yellen ressaltou pedidos recentes feitos ao primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, para que o país libere recursos da Autoridade Palestina e restabeleça a permissão para que pessoas que vivem na região possam trabalhar em Israel. “O Tesouro está preocupado com a economia de Israel e a da Cisjordânia. Escrevi ao primeiro-ministro para falar sobre minhas preocupações”, disse Yellen.
Questionada sobre o uso de ativos russos congelados no contexto da guerra na Ucrânia, uma discussão que começa a avançar na Europa, mas ainda não ganhou tração nos EUA, Yellen disse que, no caso americano, qualquer ação de confisco ou uso de ativos russos requer uma nova legislação e que o assunto precisa ser discutido em conjunto com parceiros do G7.
Marina também abordou o contexto de guerras. “É praticamente indizível o que está acontecendo no mundo. Obviamente, todos nós queremos a paz”, afirmou.
Ela acrescentou que o não enfrentamento da questão climática também pode ser um vetor de instabilidades, por exemplo, “se não formos capazes de ter suprimento de alimento com preços acessíveis para os povos do mundo”. “Nesse sentido, o Brasil é um país que pode ajudar, desde que o mundo reduza as emissões e nós façamos o dever de casa para evitar que a gente vire um deserto”, afirmou.
Marina disse que as “vantagens comparativas” do Brasil para a transição verde não podem ser vistas apenas como “vantagens competitivas”. “É um esforço de pegar nossas vantagens comparativas e trabalhar no terreno da colaboração”, disse, citando “vantagens colaborativas”.
Fonte: Valor Econômico

