Por Sagarika Jaisinghani e John Cheng — Bloomberg
22/12/2022 05h02 Atualizado há 4 horas
Os investidores que estão prontos para virar a página no pior ano para as ações desde a crise financeira global devem se preparar para mais sofrimento em 2023. Esta é a mensagem dura dos principais estrategistas do Morgan Stanley, Goldman Sachs e outros, que alertam que as ações terão novas quedas no primeiro semestre, já que os lucros das empresas deverão sentir o impacto do crescimento econômico mais fraco e da inflação, que deverá permanecer alta, ao mesmo tempo em que os bancos centrais continuarão duros em suas políticas monetárias.
Uma recuperação virá no segundo semestre, assim que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) parar de aumentar as taxas de juros, afirmam esses estrategistas. Mas a melhora deverá ser discreta, o que deixará os preços das ações apenas moderadamente mais altos que no fim de 2022.
Uma recuperação virá no segundo semestre, assim que o Federal Reserve parar de aumentar as taxas de juros
“Os riscos enfrentados pelos mercados de ações neste ano não acabaram e isso me deixa nervoso com as perspectivas, especialmente no primeiro semestre”, diz Mislav Matejka, estrategista global de ações do J.P. Morgan Chase.
A média dos 22 estrategistas consultados pela Bloomberg aponta para o índice S&P 500 encerrando o ano que vem nos 4.078 pontos – cerca de 7% acima do nível atual. A previsão mais otimista é de uma valorização de 24%, e a mais pessimista indica uma queda de 11%.
Na Europa, uma pesquisa parecida com 14 estrategistas projeta um ganho médio de cerca de 5% para o índice Stoxx 600. A cautela reflete um grande número de desafios que vão do aperto monetário à guerra na Ucrânia e à crise energética na Europa. O primeiro deles já ajudou a atenuar uma recuperação recente das ações. Até mesmo as notícias melhores sobre a inflação vieram com uma grande ressalva, porque não desviaram os bancos centrais de seu objetivo de mantê-la sob controle.
O tom agressivo do Fed e do Banco Central Europeu (BCE) na semana passada provocou grandes quedas nos preços das ações e lembrou os investidores de que a hora da tão esperada mudança de política não será simples. E, como se essa mensagem não estivesse sendo suficientemente transmitida, o Banco do Japão a enfatizou na terça-feira com um ajuste duro na política de rendimento dos bônus.
Anos seguidos de baixa são raros para as ações nos EUA e portanto, após a queda deste ano, a probabilidade é pequena de que elas voltem a registrar uma nova desvalorização anual em 2023. Desde 1928, o S&P 500 só caiu por dois anos seguidos em quatro ocasiões: a Grande Depressão, a Segunda Guerra Mundial, a crise do petróleo da década de 70 e o estouro da bolha pontocom no começo deste século.
A equipe do J.P. Morgan acredita que o S&P 500 cairá em direção às mínimas vistas em 2022, antes que uma mudança na política do Fed alimente uma recuperação no segundo semestre que deixará o indicador cerca de 10% mais alto que o nível atual. Em seu pior momento neste ano, em outubro, o índice caiu 25%, para 3.577 pontos.
Os principais gestores de recursos também estão prevendo um começo difícil para 2023, com os ganhos desviados para o segundo semestre, segundo uma pesquisa divulgada pela Bloomberg News neste mês.
Aqueles que estão adotando uma visão mais otimista podem apontar para a resiliência da economia dos EUA, o ritmo mais lento da elevação das taxas de juros e a reabertura da China depois dos rígidos “lockdowns” impostos para controlar a disseminação da covid.
Mas, apesar de tudo isso, uma das principais visões de consenso entre os estrategistas é a de que os mercados de ações ainda não estão refletindo uma perspectiva econômica no geral pessimista. Christian Mueller-Glissmann e Cecilia Mariotti, do Goldman Sachs, disseram no fim do mês passado que seu modelo implica uma probabilidade de 39% de o crescimento dos EUA desacelerar nos próximos 12 meses, mas os ativos de risco estão embutindo nos preços uma chance de apenas 11%.
Michael Wilson, do Morgan Stanley – que aposta firmemente em uma fase de baixa do mercado e que ficou em primeiro lugar na pesquisa “Institutional Investor” deste ano -, vê o índice S&P 500 caindo até 21% mais no primeiro trimestre. Uma recuperação posterior o levará o a 3.900 pontos no fim do ano, implicando ganho de cerca de 2% em relação ao fechamento de segunda-feira.
Atrelados à deterioração as perspectivas econômicas estão os lucros corporativos. Embora tenham mostrado uma resiliência notável à inflação descontrolada em 2022, eles deverão cair no ano que vem à medida que a pressão sobre as margens aumentar e a demanda mais fraca criar um risco maior de estagflação. Wilson alertou nesta semana que a queda dos lucros poderá igualar a observada durante a crise financeira de 2008 e que isso não está precificado nas ações.
Uma pesquisa do Bank of America também mostrou que os gestores de fundos esperam uma deterioração nas perspectivas de lucros para 2023, o que os tem deixado mais otimistas com os bônus do que com as ações. O posicionamento relativo desses profissionais em ações, em relação à renda fixa, está no nível mais baixo desde 2009. “Não esperamos que o cenário de crescimento construtivo deste ano persistirá em 2023”, diz Dubravko Lakos-Bujas, estrategista do J.P. Morgan e o segundo colocado na pesquisa Institutional Investor. Ele acredita que os lucros cairão 9% nos EUA, 10% na zona do euro e 4% no Japão.
Segundo Sharon Bell, estrategista do Goldman Sachs, a queda dos lucros na Europa poderá não ser tão ruim quanto nas recessões típicas. Nas contrações anteriores, os lucros caíram cerca de 30%, mas desta vez a queda poderá se limitar a 8%, em parte devido ao impulso dado às empresas de artigos de luxo e a mineradoras pelo afrouxamento das regras de combate à covid-19 na China.
Na Ásia, a decisão de Pequim de mudar sua política de tolerância zero com a covid também melhorou as perspectivas para as ações no país. Estrategistas do Morgan Stanley, como Jonathan Garner, continuam bastante posicionados em ações de mercados emergentes da região, em comparação aos mercados desenvolvidos, uma vez que estão “mais confiantes de que um novo ciclo de alta está começando”.
Enquanto isso, a equipe da Nomura Holdings diz que as recessões no Ocidente permitirão à Ásia ter um desempenho superior, uma vez que as ações na região estão mais baratas e oferecem uma perspectiva fundamental melhor. Segundo Mehvish Ayub, estrategista de investimentos sênior da State Street Global Advisors, “2023 é um ano em que as previsões de crescimento global foram bastante afetadas”.
“As perspectivas são incertas e há muita volatilidade. As ações continuam sob pressão.”
Fonte: Valor Econômico

