Por Raphael Di Cunto, Marcelo Ribeiro, Beatriz Olivon e Andrea Jubé — De Brasília
05/07/2023 05h01 Atualizado há 8 minutos
O relatório do deputado Beto Pereira (PSDB-MS) sobre o projeto do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) enfrentou resistências de parte do empresariado, dos partidos, do governo e de representantes da Receita Federal e acabou com a votação adiada para passar por ajustes. O tucano passou o dia reunido com diversos partidos para debater o texto, que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), tenta votar nesta quarta-feira.
Pereira incluiu em seu parecer o acordo entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) sobre os casos de empate no Carf, mas não agradou parte do empresariado. A bancada ruralista reclamou da tentativa de gerar caixa “às custas de quem gera emprego e renda”. “No Código Tributário Nacional, no artigo 112, é dito de forma objetiva que, em caso de dúvida sobre a interpretação da legislação tributária que define, deve-se decidir em favor do contribuinte. Ou seja, mesmo que o cenário apresente dificuldades de definição, o voto de qualidade deverá pender para o lado do cidadão”, afirmou a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA). A Confederação Nacional do Comércio (CNC) disse que a medida “é um retrocesso”.
O projeto foi editado pelo governo para tentar voltar com o “voto de qualidade” no Carf, quando o presidente da turma, que é sempre um representante da Receita, desempatava os processos sobre litígios tributários. Isso fazia com que o contribuinte perdesse em 95% das vezes. No governo Bolsonaro, o empate passou a favorecer o contribuinte, o que levou a perdas bilionárias para a União e a proposta de Haddad de retomá-la, com o objetivo de arrecadar R$ 50 bilhões este ano e desestimular práticas tributárias “abusivas”.
O parecer de Pereira acatou o acordo de um “meio-termo”: se o representante do Fisco garantir a vitória da União no critério de desempate, o contribuinte terá que pagar o total da dívida, mas ficará isento de multa de ofício e de responder a processos penais por fraude. Além disso, se quitar o débito sem questioná-lo na Justiça, ficará isento dos juros e poderá pagá-lo em até 12 parcelas, com o uso inclusive de créditos de prejuízo fiscal e de CSLL. Já quem decidir recorrer à Justiça poderá não apresentar garantia em dinheiro ou bens no processo se atestar a “capacidade de pagamento” por um auditoria.
A proposta ainda causou controvérsia entre os partidos, que fizeram seguidas reuniões com Pereira nessa terça-feira para debater o projeto. O relator prometeu ajustes no texto e um novo parecer deve ser protocolado nesta quarta.
Outro impasse criado foi ele ter acatado emenda proposta por auditores para que a Receita Federal possa fazer transação tributária e negociar descontos para pagamento de autuações fiscais antes que sejam inscritas na Dívida Ativa (fase em que a negociação fica a cargo da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional).
O Fórum da Advocacia Pública Federal protestou que falta “competência constitucional” para a Receita executar esta função e que a PGFN faz o controle suplementar para evitar execuções fiscais indevidas. “Transação sem litígio é renúncia de receita, estimula a inadimplência e fere a lei de responsabilidade fiscal”, afirmou a entidade em nota.
Já presidente do Sindifisco, Isac Santos, defendeu que a transação faz mais sentido nas etapas iniciais do contencioso fiscal. “No lançamento da autuação, há uma incerteza sobre se a dívida existe e se inicia uma discussão administrativa. Então faz mais sentido você negociar um desconto e encerrar esse debate logo do que 15 anos depois, quando há inscrição na Dívida Ativa e já se diminuiu a dúvida sobre a dívida existe ou não”, afirmou.
Além dos impasses técnicos, há os políticos. Lira reuniu-se com os ministros da Casa Civil, Rui Costa, e das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, e avisou que os deputados estão insatisfeitos com as promessas não cumpridas, como o pagamento das emendas e a demora em nomear o deputado Celso Sabino (União-PA) para o Ministério do Turismo. Havia expectativa de que a troca ocorresse esta semana, para ser prestigiada pelos colegas, mas o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) viajou para a Argentina sem resolver isso.
Fonte: Valor Econômico

