Por Eduardo Magossi — De São Paulo
04/09/2023 05h03 Atualizado há 6 horas
O Federal Reserve (Fed) vai manter os juros elevados até os EUA entrarem em recessão, na visão de Jeffrey Sherman, diretor de investimentos da gestora de recursos DoubleLine, que tem quase US$ 100 bilhões de ativos sob gestão, a maior parte em renda fixa. Em entrevista ao Valor, durante uma rápida passagem pelo Brasil para visitar clientes, Sherman disse que assim como o Fed demorou para reconhecer que a inflação não era transitória, mas persistente, e demorou para começar a subir os juros, vai levar tempo para cortar. Isso deve ocorrer apenas no segundo trimestre de 2024.
“Devemos ficar felizes pela economia americana estar crescendo, pelas empresas não terem quebrado, mas não devemos extrapolar a experiência atual porque quanto mais o Fed mantiver os juros elevados, mais a economia será afetada. Com os juros elevados, o custo de financiamento das empresas está aumentando, elas podem sobreviver por um tempo, mas chegará um ponto em que a lucratividade tem que aumentar para equilibrar a equação”, afirmou.
Sherman diz que há um otimismo nos mercados pela perspectiva de o Fed encerrar seu ciclo de alta. “Mas parar de subir não significa que ele vai cortar logo”, adverte. Para ele, os juros permanecerão em um patamar elevado até, pelo menos, o segundo trimestre de 2024. “A economia parece bem e existe a percepção de que o PIB vai chegar aos 5% no terceiro trimestre” disse, citando dado divulgado pela distrital do Fed de Atlanta.
Além disso, o Fed mede o fortalecimento da economia pelo mercado de trabalho, que sempre vai responder com defasagens. “Ninguém demite com antecedência porque acha que vai ter recessão, mas porque a empresa está com problemas ou as condições econômicas estão difíceis. Então se você usa o mercado de trabalho para direcionar sua política econômica, o reconhecimento de que o sistema está com problemas pode vir tarde demais”, comentou.
O custo de financiamento das empresas está aumentando, elas podem sobreviver por um período”
Por isso, Sherman acredita que um pouso suave na economia será muito difícil. “A cada dia que passa com juros elevados, fica mais difícil para as empresas”, reitera, lembrando que, depois da Segunda Guerra, durante os ciclos de aperto monetário, o pouso suave só ocorreu quando o desemprego subiu entre 0,5% e 1%. Na força de trabalho americana, que hoje é de 170 milhões de pessoas, 0,5% daria 850 mil pessoas, calcula. “Não é muito. São menos de 1 milhão de pessoas que, desempregadas, podem levar a uma recessão”, disse.
Ele lembrou que a criação de empregos durante os últimos 12 meses não foi observada nas empresas que compõem o índice S&P 500, as grandes companhias, que se financiam em seus bancos locais e regionais. “Esses consumidores médios não pagam o juro básico do Fed, atualmente em 5,5%, para esses bancos regionais, mas uma taxa 3 pontos percentuais acima, chegando aos 8,5%. Para algumas empresas, os juros ultrapassam os 10%”, afirma. Nesse cenário, muitas empresas médias têm dificuldade em obter crédito e os bancos regionais têm receio de emprestar diante da vulnerabilidade que enfrentam.
Outro ponto, segundo ele, que pode indicar que o estresse bancário americano ainda não terminou é que, apesar do juro básico elevado, os bancos pagam pouco pelos depósitos de seus clientes, que cada vez mais têm buscam os fundos conservadores do “money market”, que pagam 5%. “Por que eu vou deixar meu dinheiro parado nos bancos se eu posso ganhar 5% nos fundos? Quanto mais pessoas descobrirem isso, mais vão sacar seus recursos dos bancos e migrar para esses fundos, o que poderá causar mais estresse.”
Diante deste cenário, Sherman afirma que vem aumentando a exposição na renda fixa, de um pouco menos de 80% para perto de 90%. No dólar, a parcela é grande no curto prazo mas ele afirma que, no longo prazo, seu portfólio está contra o dólar, na ponta de venda. “O dólar ainda vai subir no curto prazo mas a recessão vai ser muito negativa para a moeda.” Para ele, as bolsas americanas hoje não estão mais embutindo os juros elevados, mas sim o fenômeno da inteligência artificial. “Está sendo como o ‘blockchain’ há alguns anos”, afirma.
Sherman disse também que, na América Latina, o Brasil está entre os cinco principais mercados para a DoubleLine. No total do portfólio investido nos emergentes, 12% estão no Brasil, basicamente em títulos do governo. “Apostamos muito no país e no futuro queremos montar um escritório aqui.”
Fonte: Valor Econômico