Por Andy Bounds, Alice Hancock e Peter Campbell, Financial Times — Bruxelas e Londres
13/09/2023 09h36 · Atualizado
A União Europeia (UE) anunciou ontem uma investigação antissubsídio sobre os carros elétricos da China, na tentativa de proteger as fabricantes europeias antes que sejam alijadas do mercado, por menor competitividade dos preços, pelas rivais chinesas.
Embora os veículos elétricos importados da China representem atualmente apenas uma pequena parcela do mercado do bloco, seu volume está crescendo rapidamente e poderá atingir 15% em dois anos — numa reedição do que a UE vivenciou com os painéis solares mais de dez anos atrás.
“Não podemos perder nossa indústria automobilística” disse um diplomata da UE.
O bloco europeu vai proibir a venda de carros novos com motor a combustão a partir de 2035, para cortar as emissões de carbono, e teme que seus substitutos elétricos sejam de chineses, não europeus.
A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, anunciou a investigação, o que marca uma nova escalada das tensões com Pequim em torno de uma série de políticas destinadas a reduzir a dependência do bloco em relação à potência asiática.
“Os mercados globais estão agora inundados com carros elétricos chineses mais baratos”, disse Von der Leyen. “Enormes subsídios estatais” estão mantendo os preços artificialmente baixos e distorcendo o mercado europeu, disse ela.
Segundo uma autoridade da UE, os subsídios possibilitam que carros importados da China sejam vendidos a preços cerca de 20% inferiores aos dos veículos elétricos (VEs) europeus. Se a comissão considerar que as montadoras europeias estão sendo lesadas, poderá cobrar tarifas, provavelmente na faixa dos 10% aos 15%. Prevê-se que a investigação dure nove meses.
Quaisquer medidas, se adotadas, também prejudicarão investidores estrangeiros beneficiados por subsídios no exterior, o que potencialmente inclui a Tesla americana e a sueca Polestar, entre outras. Elas afetarão veículos a bateria, mas não os híbridos.
“As produtoras da UE na China serão consideradas exportadoras chinesas… portanto, terão de lutar por sua própria alíquota tarifária”, disse Arnoud Willems, do escritório de advocacia Baker McKenzie.
Segundo ele, a medida será apenas moderadamente eficaz, pois não inclui baterias importadas. Uma tarifa de 10% já incide sobre os carros importados da China.
Há dez anos, a UE viu seu setor de energia solar perder a disputa com os produtos baratos importados da China — que eram comprados pelos europeus com subsídios de seus próprios governos. A Comissão Europeia impôs tarifas em 2012, mas as suspendeu seis anos depois porque não conseguia alcançar suas metas de geração de energia renovável sem o produto chinesa, após muitos fornecedores internos terem fechado as portas.
“Não permitiremos que o nosso mercado seja inundado por veículos elétricos supersubsidiados que ameacem nossas empresas, como ocorreu com os painéis solares”, disse Laurence Boone, a ministra para Assuntos Europeus da França. Robert Habeck, o ministro da Economia da Alemanha, também apoiou a investigação voltada para carros elétricos.
O setor automotivo da UE responde por quase 13 milhões de empregos e por 7% da economia do bloco, segundo a Acea, a entidade de classe das fabricantes europeias. Banca, além disso, quase 33% dos gastos totais em pesquisa e desenvolvimento. “Quando se perde escala, não se consegue manter o nível de investimentos e perde-se competitividade”, disse uma autoridade da UE.
Além de concorrer com veículos elétricos mais baratos vindos da China, as fabricantes europeias também dependem de baterias fabricadas por empresas chinesas na Europa ou na China. Esse problema é mais difícil de enfrentar com tarifas, em parte porque já estão construindo fábricas de baterias, de controle chinês, por toda a Europa, e porque as montadoras ocidentais já incorporaram baterias de empresas como BYD, CATL ou Envision a seus modelos.
A China acredita que a tecnologia de baterias seja sua oportunidade estratégica para dominar a indústria automobilística.
Tu Le, fundador da empresa de assessoria Sino Auto Insights, sediada em Pequim, disse que a investigação anunciada ontem “diz tanto sobre a falta de competitividade dos VEs europeus quanto sobre o medo dos políticos de que as fabricantes da UE não consigam projetar e produzir VEs competitivos no curto prazo”.
Medidas de defesa de comércio exterior contra a China não são incomuns, mas este é o maior processo, desde que a UE começou a endurecer sua posição com relação à China, no ano passado, em parte estimulada por pressões dos EUA e pelo apoio de Pequim à Rússia na guerra contra a Ucrânia.
Valdis Dombrovskis, o responsável por comércio exterior da Comissão Europeia, visitará Pequim na semana que vem a fim de discutir as relações comerciais entre os dois países. Ele disse ao “Financial Times” em agosto que também pressionará a China a reduzir seu enorme superávit comercial com a UE, que dobrou, para quase 400 bilhões, em 2022.
A Comissão disse que a participação dos veículos elétricos chineses no mercado da UE deu um salto a partir de quase zero para 8% em três anos, e que alcançará 15% dentro de mais dois anos se não forem tomadas medidas.
Se a Comissão propuser tarifas, muitos países-membros poderá barra-las. Diplomatas da UE observaram que Berlim e outras capitais relutam em adotar uma postura dura demais contra Pequim por temer retaliação contra os negócios de suas montadoras na China.
Enquanto os grupos franceses Renault e Stellantis foram diretos ao falar das ameaças, os lucros das montadoras alemãs Volkswagen, Mercedes-Benz e BMW são muito dependendentes do mercado chinês, e temem estimular sentimentos antieuropeus entre compradores chineses.
“Se você reexaminar os últimos 30 anos, a abertura de mercados e o crescimento puxados pela Organização Mundial de Comércio (OMC) têm sido vantajosos para todos”, disse na semana passada ao “FT” o CEO da Mercedes-Benz, Ola Källenius.
Fonte: Valor Econômico
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