A China provavelmente está enfrentando mais de 1 milhão de casos e cerca de 5 mil mortes por covid todos os dias, segundo análise da Airfinity. Esses número estão em total contraste com os dados oficiais de poucos milhares de casos e menos de dez mortes desde que Pequim abandonou sua política de covid-zero no início do mês
A Airfinity, uma empresa de pesquisa na área de saúde com sede no Reino Unido, disse que usou modelagem baseada em dados regionais chineses para produzir números. Sua análise de risco de mortalidade sugere que entre 1,3 a 2,1 milhões de pessoas podem morrer no atual surto de covid na China. Análises de outros grupos de modelagem também previram até 2,1 milhões de mortes.
A Airfinity estima que a onda atual de covid na China pode ter dois picos de 3,7 milhões por dia em meados de janeiro nas regiões onde os casos estão aumentando no momento, e de 4,2 milhões por dia em março com o vírus avançando em outras províncias.
No momento, os casos de covid estão aumentando mais rapidamente em Pequim e na província de Guangdong, no sul, segundo a empresa. De acordo com seu site, em 2020 ela construiu “a primeira plataforma dedicada de análise e inteligência de saúde covid-19 do mundo, que agora é a fonte confiável de tomadores de decisão e mídia globalmente”.
Após protestos generalizados contra rígidas regras de combate à doença no fim de novembro, a China começou neste mês a desmontar sua política de covid-zero, que causou um grande impacto financeiro e psicológico em seus 1,4 bilhão de habitantes.
A Comissão Nacional de Saúde da China informou ontem que registrou 2.966 novos casos na quarta-feira, sem registro novas mortes. Nesta semana, um importante especialista chinês disse que só as mortes causadas por pneumonia e insuficiência respiratória após teste positivo de covid seriam classificadas como causadas pela doença.
A diretora de vacinas e epidemiologia da Airfinity, Louise Blair, disse que essa mudança na definição pela China contrasta com outros países, que registram as mortes por covid dentro de um período de tempo de um teste positivo. Isso significa que “é improvável que os dados oficiais sejam um reflexo verdadeiro do surto que está ocorrendo em todo o país”, disse Blair, em comunicado. “Essa mudança pode minimizar a extensão das mortes observadas na China”.
Os dados oficiais também contrastam com crescentes relatos de que os hospitais estão sobrecarregados com pacientes e os crematórios estão trabalhando muito além de sua capacidade.
Um hospital de Xangai alertou a sua equipe para se preparar para uma “batalha trágica” contra a covid-19, pois espera que metade dos 25 milhões de habitantes da cidade esteja infectada até o fim da próxima semana. O Shanghai Deji Hospital postou em sua conta WeChat na noite de quarta-feira uma estimava de que havia cerca de 5,43 milhões de positivos na cidade e que 12,5 milhões no principal centro comercial da China serão infectados até o final do ano. A postagem não estava mais disponível no WeChat na tarde ontem.
A rápida propagação da altamente transmissível variante ômicron ameaça interromper a atividade em suas potências econômicas à medida que os trabalhadores adoecem e muitas pessoas se isolam em casa. Escolas e universidade retomaram o ensino a distância, assim como muitos escritórios voltaram ao regime de home office. O resultado são ruas vazias nas grandes cidades do país.
O tráfego nas maiores cidades da China caiu para o nível mais baixo desde o feriado do Ano Novo Lunar no início do ano. Uma medida dos níveis de congestionamento nas 15 principais cidades está 45% abaixo de janeiro de 2021, segundo índice compilado pela BloombergNEF com base nos dados de tráfego da Baidu.
A queda no tráfego é ainda maior do que a ocorrida durante os períodos de lockdown, como o que parou Xangai em abril e maio e uma série de restrições semelhantes em cidades ao redor o país em outubro e novembro.
A economia de Xangai encolheu quase 14% no segundo trimestre, quando o lockdown no centro financeiro e comercial fechou fábricas, reduziu os gastos do consumidor e interrompeu as operações no maior porto do mundo.
Desta vez, muitos moradores estão optando por ficar em casa — seja porque estão infectados ou porque tentam evitar contrair o vírus. A operadora do metrô cortou os serviços devido à queda no número de passageiros e ao adoecimento dos funcionários. O uso do metrô de Xangai caiu 51% na última semana em comparação igual período de 2019, segundo análise da Bloomberg dos dados de trânsito. Isso se compara a um mês atrás, quando o número de passageiros do metrô estava 18% abaixo do mesmo período três anos antes.
O tsunami do covid-19 na China está gerando preocupação de que uma nova variante perigosa do vírus possa surgir pela primeira vez em mais de um ano. A situação na China é única pelo caminho percorrido durante a pandemia. Enquanto quase todas as outras partes do mundo lutaram contra a doença e adotaram vacinas com tecnologia de mRNA (RNA mensageiro) em graus variados, a China evitou ambos. O resultado é uma população com baixos níveis de imunidade enfrentando uma onda de doenças causadas pela cepa mais contagiosa do vírus.
Apesar da escalada de casos, Pequim continua a descartar os últimos vestígios da política covid-zero e planeja reduzir os requisitos de quarentena para viajantes estrangeiros a partir de janeiro, segundo reportou a Bloomberg.
Fonte: Valor Econômico

