Grupo francês Edenred não está sozinho no setor de mobilidade na busca pelo engajamento de terceiros para reduzir gases poluentes – Localiza, Buser e Uber também têm programas nessa linha
Por Italo Bertão Filho e Naiara Bertão — De São Paulo
12/07/2022 05h01 Atualizado há 5 horas
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_63b422c2caee4269b8b34177e8876b93/internal_photos/bs/2022/a/x/9txU5hRIGSWf4Rmzw4vw/12emp-300-edenred-b6-img01.jpg)
Douglas Pina, da Edenred: programa inclui recomendações de troca de combustíveis fósseis por fontes renováveis — Foto: Divulgação
O grupo francês Edenred, dono da marca Ticket, está lançando um programa de sustentabilidade global que pretende contribuir para a compensação e redução de emissões de gases do efeito estufa gerada pelos clientes da Ticket Log, marca da companhia que trabalha no mercado de gestão de frota e mobilidade no país.
Hoje, a frota da Ticket Log no país emite anualmente 4,8 milhões de toneladas de gás carbônico (CO2). Com o novo programa, chamado de Move for Good, e que está sendo lançado no Brasil simultaneamente ao México, Argentina e Alemanha, o grupo quer reduzir e compensar as emissões de gases poluentes (GEE) referente a ao escopo 3, ou seja, as emissões indiretas, que, no caso da empresa, têm origem em seus clientes. Os clientes da Ticket Log são empresas que gerenciam frotas, desde serviços essenciais, de telefonia, de transporte de medicamentos, saúde, entre outras atividades.
Apenas no Brasil, a companhia calcula um potencial de compensação de 4,4 toneladas de CO2 equivalente e 13,3 milhões de litros de combustível até o fim do ano. Para isso, pretende adaptar tecnologias de inteligência artificial, que já estão em uso desde 2019 e são dedicadas a recolher dados de abastecimento para otimização do consumo de combustível, para quantificar e compensar também as emissões.
“Dessa forma, a Edenred espera que os clientes consigam reduzir gradativamente suas emissões de GEE”, avalia Douglas Pina, diretor-geral de frota e mobilidade da Edenred Brasil. “O novo programa também inclui recomendações de troca de combustíveis fósseis por fontes renováveis de energia e compensação de carbono para permitir que nossos clientes compensem seu impacto no meio ambiente com facilidade, sem precisar fazer grandes adaptações em sua frota”, completa.
LEIA TAMBÉM:
O cliente terá um custo de adesão ao programa e, a partir daí, a Edenred, por meio da Ticket Log, cuidará da compensação das emissões por meio de compra de crédito de carbono gerado em 24 projetos socioambientais certificados, como de desmatamento evitado, recuperação de metano de aterros e emissões evitadas por meio da geração de energia limpa gerada em centrais hidrelétricas.
Os dados das emissões da frota são calculados todo mês por uma solução tecnológica da Ticket Log em parceria com a GreenPrint. De forma automatizada, o cliente pode ver em um portal o volume de GEE gerados, quanto foi compensado e a evolução dos resultados, além de materiais de comunicação, com dicas sobre boas práticas e informações sobre os projetos. O cliente pode, ainda, fazer o download da certificação anual das compensações, legitimadas e auditadas pela consultoria Ernst & Young.
Há dez anos a Ticket Log mantém ainda outro programa, o Programa de Crédito de Carbono, que oferece aos clientes a oportunidade de gerar créditos por meio de troca do combustível fóssil por renovável no abastecimento da frota, com no mínimo 95% de etanol, que é neutro em emissões. De lá para cá, foram registrados mais de 40 mil créditos gerados. O projeto agora faz parte do novo programa.
Outras empresas do setor de mobilidade também estão tentando engajar clientes na jornada de descarbonização. Uma delas é a locadora de veículos Localiza, que lançou este ano o programa Neutraliza, que possibilita aos clientes compensarem suas próprias emissões quando utilizam os carros da empresa. As quantias variam entre R$ 0,99 e R$ 1,99 por dia, a depender do tipo de contrato do cliente, e são revertidas em aquisição de créditos de carbono pela Localiza.
Para desenvolver a iniciativa, a locadora fechou uma parceria com a WayCarbon, consultoria especializada em soluções de carbono. Com isso, a Localiza quantificou suas emissões de gases do efeito estufa provenientes de sua frota, que conta hoje com 300 mil veículos em todo o país. Foi identificado, por exemplo, que em 2020 esses veículos foram responsáveis por 96% da poluição da empresa.
LEIA TAMBÉM:
Carla Leal, diretora de Growth da WayCarbon, explica que, depois de estudo minucioso sobre hábitos e preferências dos clientes da Localiza, foram estabelecidos parâmetros que, aliados ao banco de fatores de emissão do Climas, permitiram realizar o cálculo das emissões da empresa e formular o inventário de GEE.
Segundo a locadora, todos os carros bicombustíveis são abastecidos com etanol, que emite menos quatro vezes menos GEE em comparação à gasolina. Porém, alguns clientes, quando já estão com o carro e precisam abastecer, preferem a gasolina, o que adiciona desafio para o mapeamento.
“Mais importante que compensar é reduzir. Como parte dos esforços para reduzir emissões, além de abastecermos cerca de 99% da nossa frota com etanol, a Localiza investiu em seu potencial de contribuir para a promoção do abastecimento de carros com biocombustíveis”, explica Emerson Gomes, gerente de Legalização da Localiza, ao Prática ESG. Ele se refere à mudança na política de abastecimento de carros administrativos e de reembolso de viagens: passou a ser recomendada a utilização do etanol nos veículos corporativos.
A companhia faz a neutralização das emissões diretas de suas operações (escopo 1) por meio da compra de créditos de carbono gerados pelo Instituto Ekos. Nos gases emitidos a partir do consumo de energia (escopo 2), a empresa busca contratos de energia limpa, como solar. Agora, começa a compensar também as emissões de clientes (escopo 3).
Outras companhias do setor que estão tentando engajar os clientes a reduzir emissões são a Uber e a Buser, de compartilhamento de carro e ônibus. Em ambos os casos, é oferecido ao passageiro a possibilidade de neutralizar a poluição do trajeto.
No caso da Uber, a categoria Uber Planet está presente no Brasil em nove cidades, como São Paulo e Rio, e custa, em média, 5% a mais do que uma viagem com o UberX. Segundo a companhia, desde que chegou na América Latina, no segundo semestre de 2021, as viagens feitas com usuários que utilizaram o Planet conseguiram compensar mais de 47 mil toneladas de CO2.
Já a Buser oferece essa possibilidade na hora da compra da passagem por alguns reais a mais. Nos primeiros três meses de programa, foram mais de 2 mil toneladas de CO2 equivalente. A empresa fez seu próprio inventário e compensa os GEE desde 2020. Em 2021, foram emitidas aproximadamente 200 toneladas de CO2 equivalente, neutralizadas no início de 2022. A Buser já havia neutralizado suas emissões referentes ao ano de 2020.
Tanta a Uber quanto a Buser contam com a Carbonext, consultoria e gestora de projetos de crédito de carbono, para medir e compensar a pegada de carbono produzida pelas viagens e os créditos de carbono são comprados de projetos de preservação de áreas de risco de desmatamento em especial, na Floresta Amazônica.
Para Priscila Miguel, coordenadora do Centro de Excelência em Logística e Supply Chain da Fundação Getulio Vargas, a preocupação das empresas de transporte com essa agenda é recente, mas vem crescendo. “Temos visto uma movimentação para a renovação da frota, para a adoção de carros elétricos, por exemplo. A intenção de mensurar o impacto e de ter um transporte mais sustentável já vem de mais tempo, mas nos últimos três o setor começou a tomar ações efetivas para poluir menos”, avalia.
Hoje, 48% das emissões de CO2 são do setor de transporte no Brasil. A infraestrutura para elétricos e o preço dos veículos são apontados como desafios. O carro elétrico mais barato do mercado brasileiro, Kwid E-Tech, da Renault, é cotado em cerca de R$ 150 mil. Além disso, a infraestrutura de abastecimento dos elétricos ainda é pequena e está concentrada nos grandes centros.
“Há uma espécie de trade-off. As empresas pensam em transformar a frota, mas também enfrentam o custo”, analisa Miguel. “Por isso, acredito que o processo de transformação poderá ser um pouco mais lento no Brasil, com uma conscientização maior por parte de empresas, mas também um custo maior para a troca. O movimento hoje ainda é muito de conscientização”, completa Miguel, da FGV.
LEIA TAMBÉM:
Para tentar impulsionar justamente a infraestrutura para veículos sustentáveis no país, nove empresas, entre elas o aplicativo de transporte 99 a montadora CAOA Chery, a rede de distribuição de energia Ipiranga, as companhias de recarga de veículos elétricos Tupinambá Energia e Zletric, a produtora de biocombustível Raízen e as locadoras Movida e Unidas criaram, em abril, a Aliança pela Mobilidade Sustentável.
As principais metas são: aumentar a participação dos veículos elétricos entre carros novos para 10% das vendas até 2025 (hoje em 2%), criar 10 mil estações públicas de carregamento em todo o Brasil até 2025 (atualmente existem cerca de 1.500), colocar em circulação 300 automóveis elétricos da 99 ainda esse ano e chegar a 10 mil até 2025. A 99 ainda oferece aos motoristas parceiros de São Paulo e Belo Horizonte financiamento para a instalação de kit GNV (gás natural).
A infraestrutura e o preço dos veículos elétricos são apontados como desafios.
Fonte: Valor Econômico