O Estado de S. Paulo.21 Jan 2023 ADRIANA FERNANDES
O novo texto de reforma tributária será mesclado da Proposta de Emenda à Constituição (PEC 110) do Senado e da PEC 45, em tramitação na Câmara, para a construção da proposta do governo Lula a ser apresentada até abril, de acordo com compromisso assumido pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
Segundo apurou o Estadão, a proposta deve permitir a devolução do imposto cobrado no preço dos produtos em forma de crédito para famílias de baixa renda, num cenário de eliminação da isenção do Pis/cofins dos produtos da cesta básica – política considerada distorcida pela atual equipe econômica. Hoje, os itens da cesta básica são isentos, mas o beneficio alcança pobres e ricos. A isenção acabaria, mas as famílias com menor renda receberiam a devolução do imposto embutido nos produtos que compram.
O governo ainda não bateu o martelo se vai fazer um modelo de IVA dual (um tributo federal e outro dos Estados e municípios), previsto na PEC 110. Ou criar logo o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), o IVA nacional, que reúne todos os impostos sobre consumo e está no desenho da PEC 45. A expectativa é de que a equipe econômica opte pela criação do IBS, substituindo cinco tributos – PIS, Cofins, IPI (federal); ICMS (estadual) e ISS (municipal).
Segundo a diretora de cursos da York University e coordenadora executiva do grupo de trabalho sobre IVA do Núcleo de Estudos Fiscais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Melina Rocha, o agronegócio em geral possui uma série de regime e tratamento especiais e tem medo de perdê-los porque a reforma do IVA propõe e extinção de benefícios e regimes diferenciados de tributação.
“Mas eles não veem que as vantagens que a reforma vai trazer, especialmente para os exportadores. É um grande benefício, em termos de possibilidade de compensação de crédito e devolução do crédito acumulado”, diz Melina, que participou como técnica do texto da PEC 110. Ela aposta que o secretário de reforma tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, fará um resgate da PEC 45, já que foi um dos seus autores técnicos. Segundo ela, deve-se manter mecanismo da PEC 110 para compensação de perdas na transição para a Zona Franca de Manaus.
ZONA FRANCA. “A negociação foi feita com eles, mas achamos que a própria questão da PEC não ter sido votada na foi por conta da pressão da Zona Franca e do agronegócio”, destaca a tributarista, que lembra que faltou quórum na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) para a votação. Segundo ela, um dos grandes pontos de discussão é o IPI. Na PEC 110, o relatório manteve o IPI para trazer o apoio da Zona Franca. Já na PEC 45, o IPI é extinto e é incorporado.
Vanessa Rahal Canado, do Insper e ex-assessora do Ministério da Economia para a reforma tributária, atribui as resistências do agronegócio e de serviços ao fato de que os setores olham apenas a foto de curto prazo, sem ver o impacto na cadeia como um todo. É o caso do produtor rural, que tem uma alíquota nominal de zero e não quer ser taxado com uma alíquota de 25% do IBS.
“É essa fotografia que eles olham, mas como o imposto é creditável para a próxima fase da cadeia, a alíquota de 25% para o produtor rural, na dinâmica de compras e vendas, é melhor que o zero e a isenção”, diz.
A maioria dos produtores rurais, devido a um incentivo, opera como Pessoa Física porque a apuração é mais vantajosa do que na pessoa jurídica. Entre os incentivos, que o agronegócio não quer perder é o incentivo do crédito presumido do custo com a compra de insumos. Na sua avaliação, foi muita positiva a decisão de priorizar a reforma do consumo ao invés do Imposto de Renda. “Em termos de prioridade, é mais relevante. Vamos ver o Brasil crescer com a aprovação do IVA”, diz.
ÁRVORE E FLORESTA. Pelos cálculos do Professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Edson Domingues, todos os setores ganham, em maior ou menor grau. “O setor de serviços tende a ganhar um pouco menos do que o industrial. A agricultura tende a ganhar também em termos gerais”, diz. Ele considera que há um entendimento um pouco equivocado do que seria a nova estrutura tributária com o IVA.
Domingues diz que o setor já participou de discussões com o setor agrícola e de serviços, que segundo ele têm dificuldade de perceber as vantagens da reforma. “O setor é uma árvore e não olha a floresta. Parte da resistência vem daí. A reforma tende a homogeneizar a carga tributária com imposto igual para todo mundo com débitos e créditos”, explica.l
“Mas eles (o agronegócio) não veem que as vantagens que a reforma vai trazer, especialmente para os exportadores. É um grande benefício, em termos de possibilidade de compensação de crédito e devolução do crédito” Melina Rocha – Professora da FGV
Fonte: O Estado de S. Paulo
