Com possível revogação, dependendo do cronograma, as receitas de 2024 podem ganhar um reforço de R$ 6 bilhões a R$ 7 bilhões, montante estimado caso o JCP não seja utilizado no ano que vem
Por Lu Aiko Otta, Valor — Brasília
27/07/2023 09h16 Atualizado há 5 horas
Nas discussões internas do governo sobre a formação do pacote de medidas destinadas a elevar a arrecadação em 2024 e, com isso, zerar o déficit orçamentário, a tendência é revogar o Juro sobre o Capital Próprio (JCP), informa fonte.
Isso seria feito junto com a ressalva de que o mecanismo tem méritos, e que um aperfeiçoamento pode ser discutido em seguida. Ainda este ano, informa-se.
Com isso, dependendo do cronograma, as receitas de 2024 podem ganhar um reforço da ordem de R$ 6 bilhões a R$ 7 bilhões. Esse é o montante estimado caso o JCP não seja utilizado no ano que vem. O valor do ganho de receita será menor se, em seu lugar, estiver em vigor outro mecanismo tributário semelhante que atenda ao objetivo de conter o que o governo considera ser hoje um uso abusivo do JCP.
Criado nos anos 1990, o JCP permite que a empresa se remunere pelo uso de recursos próprios. Foi uma forma encontrada para igualar as condições tributárias dessa opção de financiamento em relação a um empréstimo bancário ou no mercado de capitais. Nessas duas últimas hipóteses, os juros pagos na operação são abatidos como despesa, de forma que reduzem o lucro da empresa e, consequentemente, o Imposto de Renda a pagar.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já declarou algumas vezes que há abuso no uso do JCP. Ele comentou que empresas lucrativas não pagam IR porque fazem uma “engenharia tributária” com base no mecanismo.
Assim, o fim do JCP passou a ser uma opção para a equipe econômica compor o pacote de medidas que dará base a um Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2024 em que será projetado resultado primário zero para as contas do governo federal. É a meta prevista no novo arcabouço fiscal. Todo o conjunto seguirá para o Congresso Nacional até o dia 31 de agosto.
A criação de uma versão aperfeiçoada do JCP, disse a fonte, poderá ser discutida ainda este ano. Uma possibilidade é negociar esse novo mecanismo na própria proposição legal que revogará o JCP. Outra hipótese é deixar essa discussão para a segunda etapa da reforma tributária, a que tratará do Imposto de Renda, a ser encaminhada ao Legislativo no final deste ano.
Como mostrou o Valor em sua edição desta quarta-feira (26), o pacote de medidas fiscais para 2024 será composto também pela antecipação de dois “capítulos” da reforma do Imposto de Renda: a taxação dos fundos offshore e dos fundos exclusivos.
Outras medidas ajudarão a reforçar as receitas: a retomada do voto de qualidade do governo nas decisões do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), um programa para empresas que perderam no Superior Tribunal de Justiça (STJ) a disputa em torno do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), a cobrança de impostos sobre apostas online, sobre compras online no exterior. Poderá haver ainda novas rodadas de transação tributária, que concede desconto a empresas que concordem em encerrar litígios com o Fisco.
Haddad descreveu o conjunto como “medidas saneadoras” que buscam recompor a base tributária do governo. Como resumiu um auxiliar seu, a ideia é cobrar tudo o que é devido.
O fim do JCP preocupa as empresas, principalmente as de capital aberto. Também na quarta-feira, o Valor mostrou que o presidente da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca), Pablo Cesário, considera o momento ruim para essa discussão. Isso porque as empresas enfrentam momento muito difícil para a obtenção de crédito via mercados financeiro e de capital. Assim, a opção tem sido utilizar recursos dos sócios – justamente o que será afetado pelo fim do JCP.
No entanto, ele acha que a discussão é válida. A alternativa defendida pela Abrasca é um mecanismo em uso na Europa, chamado Allowance for Corporate Equity (ACE). É uma versão “light” do JCP, que poderia ser utilizado por um número maior de empresas e que, ao mesmo tempo, limitaria os abusos vistos com o JCP.
Fonte: Valor Econômico