A temporada de balanços do terceiro trimestre reforçou a percepção de resiliência das companhias listadas, mas a avaliação de analistas do mercado é de que não trouxe grandes mudanças sobre as tendências observadas ao longo de 2025. Para eles, o desempenho recente do Ibovespa, que superou momentaneamente os 160 mil pontos, pode ser atribuído principalmente aos números corporativos e às expectativas em torno da política monetária.
Segundo Filipe Villegas, estrategista de ações da Genial Investimentos, os resultados vieram predominantemente positivos, e sem mudanças de direção. “As companhias que vinham entregando bons resultados continuaram assim, e as que estavam com números fracos seguiram fracas. A temporada não trouxe um ‘game changer’”, afirma. Ainda assim, ele avalia que os balanços serviram como um “vetor de sustentação” para um mercado já inclinado ao otimismo.
Marcos Praça, diretor de análise da Zero Markets Brasil, segue linha semelhante, e destaca a capacidade das companhias de atravessar um período prolongado de juros elevados. “As empresas foram resilientes com Selic a 15%. A expectativa de corte de juros no início de 2026 leva o mercado a reprecificar as ações”, analisou Praça. Para ele, o movimento de consolidação do índice próximo às máximas reflete que “o mercado ainda busca mais alta”.
Ao se falar em recorte setorial, os bancos tiveram o melhor desempenho, de acordo com Flavio Conde, head de renda variável da Levante. “Com exceção do Banco do Brasil, o setor apresentou resultados sólidos e pode passar por revisões para cima nos preços-alvo”, afirma. Praça também destacou o desempenho de Nubank, Itaú e BTG no período.
Entre as commodities, a Vale reportou números acima do previsto, beneficiada pelo minério de ferro acima de US$ 110 por tonelada. Conde destaca, ainda, a possibilidade de antecipação de dividendos pela companhia em dezembro, o que contribui para sustentar as ações na faixa dos R$ 65.
A Petrobras também mostrou resultados considerados positivos, ainda que dentro do esperado. A estatal deve revisar para baixo seu plano de investimentos, diante do recuo do petróleo em relação ao período em que o plano foi originalmente elaborado. “Com o barril a US$ 65, vários projetos perdem rentabilidade, o que torna razoável uma redução dos investimentos”, explica o especialista da Zero Markets.
Seguradoras como BB Seguridade e Caixa Seguridade mantiveram tendência de resultados financeiros fortes, favorecidas pelo nível atual de juros. Na avaliação de Conde, o único setor que frustrou expectativas foi o de educação. Para ele, os números foram abaixo do previsto para o período.
Valorização maior, mas com limites
A leitura entre os analistas é convergente no sentido de que o Ibovespa não opera em níveis baratos, mas nem por isso esgotou o potencial de alta. Para Villegas, apesar de tecnicamente “esticado”, o índice segue amparado pelos fundamentos. “A alta rápida deixa a Bolsa mais suscetível a movimentos táticos, mas o pano de fundo continua positivo”, afirma.
Conde lembra que o avanço até próximo dos 160 mil pontos tornava provável algum ajuste. “As projeções para dezembro estavam em 150 a 155 mil. Quando o índice bate quase 160 mil, a realização é natural.”
O consenso entre os analistas também é claro no que diz respeito à taxa Selic, cuja trajetória será decisiva para a Bolsa em 2026. Para Villegas, um eventual corte é o elemento central no cenário para a renda variável. “A queda de juros é o evento transformador para a Bolsa. Ela melhora resultados e provoca migração de renda fixa para ações”, afirma. Ele considera mais provável que o corte inicial ocorra no primeiro trimestre.
Praça, da Zero Markets, também vê o ciclo de flexibilização como potencial catalisador. Em seu entendimento, “cada dado de inflação abaixo do esperado reforça a perspectiva de corte e eleva a precificação dos ativos”. Praça estima que, se a Selic recuar para algo próximo de 12,25%, o Ibovespa tende a manter trajetória positiva. Por outro lado, uma eventual interrupção do ciclo comprometeria a performance. “Se parar em 13%, o impacto na Bolsa seria significativo”, alerta.
“A queda de juros no Brasil é o fator mais provável e o que tem maior efeito sobre a Bolsa”, resume Villegas. Praça reforça: “A força para a alta está nos cortes. A fraqueza está na chance de o BC segurar por mais tempo”.
Apesar disso, os especialistas destacam que os balanços ajudaram a “dissipar narrativas negativas”, e que os resultados mostram uma economia mais resiliente do que algumas leituras sugeriam.
Pontos de atenção para 2026
O cenário fiscal é apontado como o principal risco para o futuro. Na visão de Praça, medidas de apelo político em ano eleitoral podem pressionar as contas públicas — e, na visão dele, o mercado também não precifica ainda uma deterioração mais forte nos anos de 2027 e 2028.
As eleições de 2026 são citadas pelos três analistas, embora em intensidade distinta. Villegas afirma que uma alternância de poder seria interpretada como positiva. Conde, por sua vez, considera que a possibilidade de derrota do atual governo “não está no preço”.
Fonte: Capital Aberto

