Por Victor Rezende, Igor Sodré e Augusto Decker — De São Paulo
05/08/2022 05h03 Atualizado há 3 horas
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Bastou uma sinalização mais clara do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central quanto ao fim do ciclo de elevação da Selic para o mercado partir para um rali expressivo no pregão de ontem. A indicação do colegiado de que, em setembro, avaliará a necessidade de um ajuste residual na taxa básica derrubou os juros futuros, na medida em que os participantes do mercado aguardavam o sinal do BC para montar posições que apostassem na queda dos juros. O fluxo de entrada nos mercados de juros e de renda fixa ajudou a derrubar o dólar e, diante de uma queda tão intensa nas taxas futuras, o Ibovespa exibiu alta firme – até ensaiou retornar aos 106 mil pontos ao longo da sessão.
Toda a curva de juros se ajustou em forte queda no pregão de ontem, com destaque para as taxas de médio e de longo prazo. A taxa do DI para janeiro de 2025 caiu de 12,47% para 12,09%, enquanto a do DI para janeiro de 2029 recuou de 12,65% para 12,30%.
Embora o Copom tenha mantido a porta aberta para um ajuste residual na Selic em setembro, a mudança na comunicação do colegiado, de que irá avaliar se uma alta adicional será necessária, reforçou, entre os participantes do mercado, a percepção de que o ciclo pode ter sido encerrado na quarta-feira, quando a Selic chegou a 13,75%. Parte do mercado ainda aponta chance de um aumento de 0,25 ponto em setembro, enquanto casas como Bradesco, Barclays, Itaú Unibanco e Banco do Brasil mantiveram inalteradas as projeções de Selic a 13,75% no fim do ano.
No mercado de juros, a disposição a risco foi grande e, já nos primeiros negócios do dia, as taxas exibiam quedas relevantes. O movimento se intensificou ao longo do pregão, na medida em que mais “players” montaram posições na tentativa de capturar o movimento de recuo das taxas.
O Citi, por exemplo, montou posição aplicada (que ganha com a queda dos juros) no DI para janeiro de 2025. “Gostamos desse ponto da curva para capturar mais cortes”, revelaram os estrategistas Andrea Kiguel e Dirk Willer, em relatório enviado a clientes, onde justificam a posição.
Eles notam que a taxa de um ano passou a operar abaixo do nível da Selic, o que, historicamente, indica que os ciclos tendem a mudar de direção, a menos que haja eventos de aversão a risco que inviabilizem a dinâmica no mercado. Para Kiguel e Willer, “os riscos para o ‘trade’ incluem outro choque inflacionário global ou a inércia mais forte do que o esperado, o que tornaria o BC mais ‘hawkish’ [duro] em relação às expectativas, além do ruído eleitoral”.
Na visão do economista-chefe da RPS Capital, Victor Candido, “na hora em que o fim de ciclo é anunciado, as posições vão na mesma direção e o juro prefixado derrete”. Ele avalia que o movimento é natural, mas ressalta que, apesar de estar comprado e de gostar dessa posição, tem dúvidas sobre a sustentabilidade do movimento à frente.
“Acho que o nível dos juros neste ciclo vai ser mais alto do que o mercado quer acreditar. Tem muito estímulo na economia e o governo está colocando ainda mais em uma economia com o hiato do mercado de trabalho fechado. Acho que a atividade vai continuar desafiadora para o BC. O que pode ajudar, e que já tem contribuído bastante, é o fato de os preços das commodities, especialmente do petróleo, estarem caindo bastante e isso anima ainda mais o mercado com o ‘trade’ de juros mais baixos”, diz Candido.
Surpresas adversas na frente fiscal e nos cenários de atividade econômica até podem inclinar o Copom a agir novamente em setembro, mas a decisão do colegiado na quarta-feira deu a impressão de que a autoridade monetária “preferiria deixar os juros onde estão”, aponta o economista-chefe para Brasil do Barclays, Roberto Secemski, cujo cenário-base indica que o ciclo de aperto chegou ao fim com a Selic em 13,75%.
Para ele, se as expectativas inflacionárias de médio prazo não mudarem tanto até a reunião de setembro, o Copom pode manter os juros inalterados em 13,75%. “É claro que surpresas adversas na frente fiscal, mercado de trabalho e/ou crescimento também podem inclinar o BC a agir, mas nossa impressão é que, tudo o mais constante, ele preferiria deixar os juros onde estão, também pela extensão do horizonte relevante em 2024 (quando deseja evitar o risco de ficar abaixo da meta)”, diz Secemski.
O bom humor do mercado com a queda dos juros se refletiu em uma demanda maior por títulos públicos prefixados no leilão semanal realizado pelo Tesouro Nacional, que aumentou a oferta de papéis. O Tesouro conseguiu vender integralmente 9 milhões de LTNs com vencimento em janeiro de 2025, além de 300 mil NTN-Fs, papéis prefixados de prazo mais longo, que costumam ser demandados pelo investidor estrangeiro.
Na avaliação de Laszlo Lueska, sócio e gestor da Octante Capital, o Copom mais suave do que o esperado, ao indicar o fim do ciclo de aperto monetário, “gerou otimismo nos estrangeiros, que trouxeram dólares hoje para aplicar em prefixado”. Não por acaso, em um dia de dólar mais fraco no mundo, o mercado de câmbio doméstico conseguiu se beneficiar. Assim, o dólar encerrou o pregão de ontem cotado a R$ 5,2219, em queda de 1,06%.
O Ibovespa se valeu da queda expressiva dos juros longos e encerrou o dia em alta de 2,04%, aos 105.892 pontos, no maior nível desde 10 de junho. “A recuperação não será uma linha reta. Teremos volatilidade, mas uma grande restrição ao Brasil parece estar ficando para trás. Meu cenário para Brasil é menos negativo do que a média do mercado, a despeito dos riscos (fiscal e político). Parece haver bastante prêmio de risco nos ativos locais e margem de segurança”, diz o CIO da TAG Investimentos, Dan Kawa.
As maiores altas do Ibovespa foram, exatamente, de ações de empresas ligadas à atividade econômica local, como os setores de varejo e construção. As ações ordinárias do Magazine Luiza ganharam 13,99% e as da Via subiram 12,60%.
Fonte: Valor Econômico

