Os rendimentos dos Treasuries americanos aprofundaram sua queda ontem, depois que bancos passaram a projetar cortes nos juros dos Estados Unidos já no início de 2024. A revisão dos bancos veio após a postura mais branda (“dovish”, no jargão do mercado) adotada pelo presidente do Federal Reserve (Fed), Jerome Powell, ao dizer na quarta-feira que há “um senso geral de que o banco central vai começar a discutir os cortes de juros em breve”. Diante do comentário, vários bancos adiantaram suas previsões para a data do primeiro corte, alguns para março. E a expectativa ajudou a retirar os prêmios da curva de juro, com o rendimento da nota de dez anos caindo para um patamar abaixo de 4% pela primeira vez desde 8 de agosto.
No fim do dia, a taxa do título encerrou a 3,910%, de 4,025% na véspera e em seu menor fechamento desde 26 de julho. Em 23 de outubro, o rendimento chegou a bater os 5,022% no pico intradiário, depois de Powell sinalizar que o Fed manteria os juros elevados por mais tempo.
A taxa do título de 30 anos também teve forte queda ontem, de 4,178% para 4,036%. Na ponta curta dos Treasuries, o movimento foi moderado: a taxa da nota de dois anos caiu de 4,433% para 4,399%. Já as bolsas de Nova York voltaram a subir e o Dow Jones renovou seu recorde histórico, com alta de 0,43%, aos 37.248,35 pontos.
A sinalização de Powell de que os cortes de juros podem entrar no radar fez com que o mercado começasse a precificar seis cortes de 0,25 ponto percentual, terminando o ano que vem no intervalo de 3,75% a 4%, de atuais 5,25% a 5,5% – o que representaria um corte total de 1,5 ponto em 2024. O Goldman Sachs, por exemplo, antecipou sua expectativa de início do ciclo de flexibilização monetária do Fed. Antes, o banco projetava reduções nas taxas apenas na segunda metade de 2024. Agora, a equipe comandada pelo economista-chefe Jan Hatzius espera que o Fed comece a flexibilizar o grau de aperto monetário em março. “Prevemos agora três cortes consecutivos de 25 pontos-base em março, maio e junho”, o que levará a taxa dos Fed funds à faixa de 4,50% a 4,75%. Após essa primeira etapa, os economistas do Goldman Sachs esperam que o banco central americano efetue reduções de 0,25 ponto percentual por trimestre, até levar as taxas ao intervalo de 3,25% a 3,50%, o que ocorrerá somente em 2026.
A continuidade da desinflação também contribui para as perspectivas de mais cortes. O banco britânico Barclays antecipou sua expectativa de início do ciclo de redução dos juros americanos de dezembro para junho de 2024. Em relatório enviado a clientes, os economistas do Barclays apontam que a leitura mais suave do índice de preços ao produtor (PPI, na sigla em inglês) dos EUA referente a novembro e a falta de resistência de Powell para conter as expectativas de redução dos juros apoiam a expectativa de início dos cortes mais cedo. “Ficamos surpresos com a relutância do Fed em reagir à notável flexibilização das condições financeiras ao longo do último mês”, dizem os profissionais, ao notarem, ainda, que Powell não manifestou preocupação de que o afrouxamento das condições financeiras pudesse prejudicar os objetivos do Fed.
“Powell, além de simplesmente reconhecer o progresso alcançado até agora em seus comentários, também pareceu otimista sobre o caminho a seguir. Mais importante ainda, ele não tentou confrontar as atuais expectativas do mercado de cortes substanciais nas taxas no próximo ano. Vemos isso como um sinal poderoso de que o Fed está pronto para cortar os juros antes do que esperávamos”, afirmou Bill Papadakis, estrategista-sênior de macro da Lombard Odier. Segundo ele, agora o banco suíço espera quatro cortes de 0,25 ponto em 2024, ante dois anteriormente.
Já o Citi está prevendo um primeiro corte de juros pelo Fed em julho, de 0,25 ponto percentual, abrindo as portas para uma redução de 1 ponto percentual cheio em 2024, de acordo com projeção de Andrew Hollenhorst, economista-chefe para os EUA do banco. “As autoridades do Fed irão dizer que os cortes são consequências de desaceleração da inflação, mas pensamos que também são motivados por preocupações crescentes de que ocorrerá uma recessão sem uma flexibilização das condições financeiras”, afirma.
Fonte: Valor Econômico
