O acordo comercial firmado entre os Estados Unidos e a União Europeia no domingo (27) imporá uma tarifa de 15% sobre medicamentos importados da Europa. As farmacêuticas fabricam alguns de seus maiores e mais conhecidos medicamentos de sucesso lá, incluindo Botox, o medicamento contra câncer Keytruda e populares medicamentos para perda de peso como Ozempic.
A alíquota é muito menor que as taxas de até 200% que o presidente Donald Trump havia ameaçado. Ainda assim, os novos custos de importação devem adicionar bilhões de dólares em despesas para a indústria farmacêutica e podem levar a aumentos de preços de alguns medicamentos. Isso pode se traduzir em custos mais altos para os americanos, tanto em despesas diretas quanto em prêmios de seguro de saúde mais elevados.
A taxa de 15% é definitiva e não será afetada pelas tarifas relacionadas à segurança nacional que Trump deve impor sobre produtos farmacêuticos fabricados em outras partes do mundo, segundo um funcionário da Casa Branca e altos funcionários da Comissão Europeia. Este resultado é uma espécie de vitória para a indústria farmacêutica, que temia que os medicamentos da Europa fossem atingidos com altas taxas relacionadas à segurança nacional. Espera-se que ambos os conjuntos de tarifas farmacêuticas entrem em vigor simultaneamente em algum momento do próximo mês, disseram os funcionários.
A indústria farmacêutica depende de uma complexa cadeia de suprimentos global: a produção da maioria dos medicamentos acontece em vários países, com fábricas em todo o mundo lidando com diferentes estágios do processo. A Europa é talvez a peça mais importante da rede global que produz medicamentos de marca —aqueles com proteção de patente e tipicamente preços altos e margens de lucro gordas.
Produtos farmacêuticos são a principal exportação da Europa para os Estados Unidos. Autoridades europeias expressaram preocupações nos últimos meses de que tarifas farmacêuticas poderiam levar as empresas a reduzirem investimentos, às custas de empregos, fábricas e receita fiscal.
A Irlanda, em particular, tornou-se um centro de fabricação farmacêutica, em parte porque fazer negócios lá ajuda as empresas farmacêuticas a reduzirem suas contas fiscais gerais. Quase todas as maiores farmacêuticas têm fábricas lá. No ano passado, a Irlanda enviou aos Estados Unidos US$ 50 bilhões em produtos farmacêuticos, a maioria dos quais fabricados por empresas farmacêuticas multinacionais.
A Europa fabrica os ingredientes ativos para 43% dos medicamentos de marca consumidos nos Estados Unidos, de acordo com a U.S. Pharmacopeia, uma organização sem fins lucrativos que monitora a cadeia de suprimentos de medicamentos. Nenhuma outra região produz uma parcela maior.
A Europa também fabrica ingredientes ativos para 18% dos medicamentos genéricos consumidos nos Estados Unidos, que têm preços mais baixos e representam a grande maioria das prescrições dos americanos.
Certos medicamentos genéricos fabricados na Europa estarão isentos da nova tarifa, disse Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, no domingo. A Casa Branca e a Comissão Europeia não responderam aos pedidos de comentário sobre quais medicamentos genéricos estariam isentos.
A ameaça de tarifas sobre medicamentos genéricos, que têm margens estreitas, levantou preocupações sobre o agravamento da escassez. Especialistas que acompanham as cadeias de suprimentos farmacêuticos disseram que não estavam preocupados que medicamentos de marca produzidos na Europa entrassem em escassez porque eles têm margens de lucro altas.
As novas tarifas serão pagas pelas farmacêuticas que importam produtos acabados ou ingredientes para os Estados Unidos. Espera-se que muitas tentem repassar pelo menos parte dos custos para empregadores e programas governamentais como o Medicare, que cobrem a maior parte das despesas com medicamentos prescritos para os americanos.
Pacientes cujo seguro exige que paguem uma franquia ou uma porcentagem do preço de um medicamento poderão eventualmente enfrentar custos diretos mais altos para alguns medicamentos. Em alguns casos, no entanto, acordos contratuais e a ameaça de pesadas penalidades financeiras podem impedir os fabricantes de aumentar drasticamente os preços.
Alguns prêmios de seguro de saúde já estão programados para aumentar. Seguradoras em Nova York, Oregon e Maryland recentemente informaram aos reguladores que as tarifas estavam levando-as a buscar aumentos maiores nos prêmios no próximo ano para certos planos de saúde do que teriam feito de outra forma.
A indústria farmacêutica fez um intenso lobby contra as tarifas, dizendo que as empresas farmacêuticas poderiam gastar menos em pesquisa e fabricação nos Estados Unidos como resultado. “Tarifas não são a resposta para promover maior produção doméstica desses produtos”, disse o principal grupo de lobby da indústria farmacêutica, PhRMA, em um comunicado em maio.
Por meses, Trump tem prometido impor tarifas punitivas sobre produtos farmacêuticos importados. Seu objetivo, segundo ele, é trazer mais fabricação de volta aos Estados Unidos.
Em abril, o governo Trump abriu uma investigação sobre se as importações de medicamentos e ingredientes farmacêuticos ameaçavam a segurança nacional da América. Trump conduziu a investigação sob uma autoridade legal conhecida como Seção 232, que ele usou para justificar tarifas sobre carros e outras indústrias.
Com os medicamentos da Europa isentos das tarifas da Seção 232, essas taxas agora ameaçam duas das outras regiões mais importantes na rede de produção global da indústria farmacêutica: Índia e China, ambas com foco em medicamentos genéricos. A Índia tem negociado um acordo comercial que poderia abordar sua gigantesca indústria de medicamentos genéricos e evitar tarifas relacionadas à segurança nacional dos Estados Unidos.
Fonte: Folha de S.Paulo