A combinação de programas de estímulo de curto prazo e aumento de imposto sinaliza aos agentes que a inflação estrutural vai continuar mais alta e por mais tempo, afirmou o ex-presidente do Banco Central Roberto Campos Neto.
“[A isenção] do Imposto de Renda, a [nova tarifa social] de energia elétrica, são todos sinais de que vai se estimular a demanda de curto prazo e fazer pagar quem tem poupança. E isso é sinal de inflação estrutural mais alta por um período muito mais prolongado. A questão fundamental é como sair disso, como quebrar esse ciclo. Os diversos anúncios de programas vão dando ao mercado a sensação de que isso vai continuar por muito tempo”, afirmou Campos Neto, que participa do B.Side Day, em São Paulo.
O ex-presidente do Banco Central ponderou que essa combinação não é singular ao Brasil, mas realidade em todo o mundo pós-pandemia. O que se viu a partir de 2020, disse, foi uma escalada dos programas de distribuição de renda que não foram totalmente desmontados desde então. E que, das 112 medidas de ajuste fiscal mapeados por ele desde então, 90% implicaram em aumento de imposto.
“Curiosamente, não é só aumento de imposto, mas cobrar mais sobre o estoque de poupança e também sobre as empresas. No Brasil, não é diferente. A diferença é que o déficit nominal brasileiro é um dos mais altos do mundo. Olhando os próximos anos, a menos que tenhamos um choque fiscal, teremos um juro nominal de 8% ou 9% e, com dificuldade de se fazer um déficit primário zero, a dívida vai subir entre 3 pontos e 5 pontos porcentuais por ano”, alertou.
“Então, é preciso gerar esse choque fiscal sim ou sim. A questão é: quais variáveis econômicas serão necessárias para produzir e quem vai fazer.”
Campos Neto – que reiterou não ter desejo de voltar à política – afirmou que qualquer governo eleito será confrontado com essa necessidade, de direita ou esquerda. Ele ressaltou, por outro lado, que a credibilidade da nova gestão irá influenciar o tamanho da dificuldade de execução do projeto.
“Quanto menor a credibilidade, mais difícil será realizar o ajuste.”
O ex-presidente do BC, que deve assumir em julho o cargo de vice-presidente e chefe global de políticas públicas do Nubank, quando termina seu período de quarentena, evitou entrar em detalhes sobre o pacote de medidas anunciadas no domingo, mas criticou a alta do IOF.
“É um imposto que, a longo prazo, restringe capitais. Quanto mais a gente mostrar que não é sobre taxar quem quer sair, mas estimular quem quer entrar, mais vai incentivar esse processo (de entrada de investimentos)”, defendeu.
Fonte: Valor Econômico

