Por Gabriela Ruddy e Fábio Couto — Do Rio
05/08/2022 05h03 Atualizado há 3 horas
Com a queda no preço internacional do barril de petróleo e a pressão do governo federal para redução nos preços dos combustíveis, a Petrobras anunciou ontem um corte de R$ 0,20 no preço médio de venda do diesel nas refinarias às distribuidoras. A partir de hoje, a estatal passa a vender o litro do diesel, em média, a R$ 5,41, o que corresponde a uma queda de 3,56%.
Essa é a primeira redução do diesel desde que o atual presidente da companhia, Caio Paes de Andrade, assumiu o cargo, em junho. Andrade foi indicado à vaga pela União depois críticas do presidente Jair Bolsonaro à política de preços da estatal. Desde a posse de Andrade, a Petrobras já fez dois cortes nos preços da gasolina, em julho, mas ainda não havia alterado o diesel, vendido a R$ 5,61 o litro desde 17 de junho, quando sofreu aumento de 14,26%. Essa também foi a primeira redução no preço do diesel desde maio de 2021.
O ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, comemorou o anúncio nas redes sociais: “Redução de 20 centavos no preço do litro do diesel! Passo a passo e com a graça de Deus os resultados vão aparecendo! Brasil porto seguro do investimento”, disse em um post no Twitter. A medida, porém, deve ter impacto nulo na inflação (ver reportagem Efeito sobre inflação é praticamente inexistente, apontam economistas)
Na semana passada, a estatal aprovou uma nova diretriz para a política de preços que reforçou a supervisão do conselho de administração em relação às decisões tomadas pela diretoria-executiva. Segundo fontes, não houve uma reunião no conselho de administração para debater a redução do diesel, mas os atuais conselheiros foram informados antes sobre o anúncio.
Nas estimativas da Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e de Lubrificantes (Fecombustíveis), a redução deve corresponder a uma queda de R$ 0,18 para a composição do produto comercializado nos postos, considerando a mistura obrigatória de 90% de diesel A e 10% de biodiesel ao produto final. No entanto, o presidente da entidade, James Thorp Neto, lembra que a queda depende das distribuidoras e da decisão individual de cada posto.
Nos cálculos da Associação Brasileira dos Importadores dos Combustíveis (Abicom), antes da queda, o diesel vendido pela Petrobras estava 9% acima da paridade internacional, o que significava possibilidade de redução de R$ 0,46 no preço médio do litro.
O presidente da Abicom, Sérgio Araújo, afirma que a decisão por não zerar completamente a diferença em relação aos preços internacionais ajuda a estatal a reduzir eventuais desgastes caso ocorra um novo aumento nos preços internacionais nas próximas semanas. “Isso dá mais fôlego para que a Petrobras não tenha que reajustar novamente os preços em breve”, diz.
Segundo Araújo, nos patamares atuais os preços do diesel viabilizam importação por empresas menores, o que é importante para ajudar a garantir o abastecimento nacional. Cerca de 30% da demanda brasileira de diesel depende de importações, pois a capacidade de refino atual é capaz de atender por volta de 70% do que é consumido no Brasil.
O Goldman Sachs estima que os preços do óleo diesel nas refinarias da Petrobras estão 11% acima do preço de paridade de importação (PPI) depois do corte. Em relatório, o Itaú BBA também disse que há espaço para que a Petrobras possa reduzir preços dos combustíveis, com a tendência de queda nos preços do petróleo e um estreitamento da margem entre as cotações do petróleo bruto ante os preços do diesel e da gasolina. Nos últimos meses, com os receios de desabastecimento de produtos refinados no mundo, os preços dos derivados subiram mais do que as cotações do óleo cru.
Luiz Carvalho, analista do banco UBS, acredita que as recentes mudanças no mercado internacional pelo medo de uma recessão global, bem como um menor consumo do óleo diesel no mercado internacional, permitiram a redução dos preços da Petrobras. Para o analista, a decisão da Petrobras foi totalmente técnica, sem sinal de interferência política.
Ontem, o Brent, principal referência internacional para o petróleo, fechou o dia em US$ 94,12 o barril no contrato negociado para outubro, queda de 2,75%. O WTI, principal referência americana, encerrou o dia ontem a US$ 88,54 na negociação para setembro, menor preço desde o início do conflito na Ucrânia.
Apesar da redução recente nos preços, na semana passada, o diretor de comercialização e logística da Petrobras, Cláudio Mastella, havia dito que o cenário para o diesel era “desafiador”. “Daqui até o final do ano, a tendência é de fortalecimento do diesel, ao contrário da gasolina”, disse em entrevista coletiva na sexta-feira.
O analista Ilan Arbetman, da Ativa Investimentos, afirma que o corte no diesel causou surpresa depois da fala de Mastella. O analista acreditava em uma manutenção ou até um possível aumento no diesel, pois, mesmo com a tendência de queda no preço internacional do produto nos últimos dias, ainda existem riscos de problemas de desabastecimento para os próximos meses. Ele lembrou que a política da empresa é de não repassar volatilidades ao mercado interno.
“Recebi a notícia da queda do diesel com surpresa. Dada essa conjuntura, esperava que houvesse a manutenção de um ‘colchão’. Havia matematicamente, sim, espaço para que esse corte fosse feito, mas pensando na política da companhia, de não considerar movimentos conjunturais, e sim estruturais, e levando em consideração as falas da diretoria, se esperava uma manutenção”, disse o analista.
Segundo Arbetman, mesmo com a tendência de queda no preço internacional do diesel nos últimos dias, ainda há alta volatilidade no mercado internacional e existem riscos de problemas de desabastecimento para os próximos meses. Isso ocorre por causa da queda nos estoques internacionais do diesel, além das dúvidas sobre o fornecimento de gás da Rússia para a Europa, o que poderia levar a um aumento na demanda pelo diesel.
“A chegada do inverno na Europa e a colheita da safra no Brasil fazem com que a demanda suba, enquanto na parte da oferta há uma curva plana, sem maiores colocações. Esse descasamento entre oferta e demanda pode continuar”, afirmou.
Para a analista do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), Carla Ferreira, o corte no diesel acompanhou o movimento do mercado internacional, mas a proximidade das eleições presidenciais acaba dando um fator político ao assunto: “O fator político está sempre envolvido, mas neste caso, [a redução nos preços] casou com o mercado internacional”, disse.
Fonte: Valor Econômico