O Federal Reserve (Fed, banco central americano) retomou o ciclo de afrouxamento monetário nos Estados Unidos e anunciou um corte de 0,25 ponto percentual na taxa de juros de referência, para 4,25% a 4% ao ano. A decisão era amplamente esperada pelo mercado e foi a primeira redução deste ano, após meses de uma abordagem de maior cautela diante da incerteza das tarifas comerciais e de mudanças na política econômica.
Agora, o gráfico de pontos, que reúne as projeções dos diretores para a política monetária, aponta para mais duas diminuições de mesma magnitude até o fim de 2025, o que implicaria em cortes nas duas próximas reuniões, em outubro e dezembro.
A votação, no entanto, contou com o dissenso de Stephen Miran, diretor indicado por Donald Trump para a vaga de Adriana Kugler e que assumiu o cargo nesta semana. Ele votou a favor de uma redução mais expressiva, de 0,50 ponto, em um momento que o presidente dos EUA tem realizado diversos ataques ao banco central americano e pedido por juros mais baixos.
No comunicado, a autoridade monetária destacou o enfraquecimento do mercado de trabalho nos últimos meses, o que fez com que os investidores reajustassem suas projeções e passassem a esperar mais cortes na segunda metade do ano. “Os ganhos de empregos diminuíram, e a taxa de desemprego subiu ligeiramente, mas continua baixa. A inflação aumentou e permanece um pouco elevada”, disse o comunicado.
Apesar disso, o tom de Jerome Powell, presidente do Fed, não foi tão “dovish” (mais propenso a cortes de juros) quanto esperado por parte do mercado, o que fez os ativos americanos oscilarem durante a coletiva de imprensa, com os rendimentos dos Treasuries e o dólar atingindo as máximas do dia. Ele definiu o corte de ontem como uma “contenção de riscos” e afirmou que o banco central deve seguir em uma abordagem “reunião a reunião”.
“No momento, continuamos esperando que a inflação suba, mas talvez não tanto quanto esperávamos há alguns meses. O repasse das tarifas para a inflação tem sido mais lento e menor. O mercado de trabalho enfraqueceu, então o argumento para que haja uma pressão persistente diminuiu”, disse. O presidente do Fed também afirmou que mantém sua visão de que o impacto das tarifas comerciais sobre a inflação americana será pontual.
Segundo Powell, não houve apoio para uma redução de 0,50 ponto. “Fizemos altas e cortes de juros muito grandes nos últimos cinco anos, e tende-se a fazer isso em momentos em que sentimos que a política está em um ponto que precisa se mover rapidamente. Esse não é de forma alguma o caso agora”, ele comentou.
O comunicado foi acompanhado do Sumário de Projeções Econômicas (SEP), relatório divulgado trimestralmente pelo Fed que reúne as projeções dos dirigentes para a economia americana. Segundo o gráfico de pontos, a maior parte do comitê vê espaço para mais duas reduções de 0,25 ponto nos juros neste ano, o que implicaria em cortes nas próximas duas reuniões, em outubro e dezembro. Em junho, o consenso era de apenas dois cortes em 2025 e agora a estimativa média vai em linha com a do mercado.
No entanto, ainda é possível ver uma certa divergência entre os dirigentes do Fed, visto que um membro defendia manutenção de juros, enquanto seis apostavam em apenas um corte, dois projetavam duas reduções e um via espaço para juros mais baixos em 1,50 ponto percentual. Nem todos os diretores que participam do gráfico de pontos votam nas decisões de política monetária neste ano.
A mediana das projeções dos dirigentes do Fed para os juros neste ano ficou entre 3,5% e 3,75%, enquanto o ponto-médio para os juros no fim do ano que vem passou a ser de 3,4%, o que indicaria uma redução adicional de 0,25 ponto em 2026. Para 2027, o Fed passou a projetar mais cortes de juros, com a taxa dos Fed funds em 3,1%, abaixo dos 3,3% projetados em junho. Em 2028, o consenso é o mesmo. No longo prazo, a estimativa para taxa dos Fed funds ficou em 3%, no mesmo nível do último gráfico de pontos.
O Fed também aumentou suas projeções para a inflação e o crescimento em 2026. A projeção para o índice de preços de gastos com consumo (PCE) foi mantida em 3% em 2025, mas a estimativa para 2026 subiu de 2,4% para 2,6%. Para 2027 e 2028, as previsões se mantiveram em 2,1% e 2%, respectivamente.
Para o núcleo do PCE, a projeção segue em 3,1% para 2025, subiu de 2,4% para 2,6% em 2026 e se manteve inalterada em 2,1% para 2027. As estimativas para 2028 e para o longo prazo ficaram em 2%. As projeções para o crescimento do PIB subiram de 1,4% para 1,6% em 2025, de 1,6% para 1,8% em 2026, e de 1,8% para 1,9% em 2027. As estimativas permaneceram em 1,8% tanto para 2028 quanto no longo prazo.
Andrew Hollenhorst, economista-chefe do Citi para os Estados Unidos, se diz mais confiante com sua projeção de cortes nas próximas quatro reuniões do Fed após os comentários mais “dovish” de Powell. “Deve ficar mais claro nos próximos dados que a demanda por trabalho perdeu força e que a inflação subjacente, fora alguns possíveis efeitos tarifários pontuais, está desacelerando”, ele afirmou em nota.
Por outro lado, Michael Feroli, economista-chefe para o J.P. Morgan nos Estados Unidos, avalia que, enquanto o gráfico de pontos e o comunicado da decisão foram mais dovish do que o esperado, a coletiva de Powell foi mais hawkish. “Ele minimizou a importância do gráfico de pontos e caracterizou a decisão como um corte de contenção de riscos, o que lança dúvidas se o movimento é necessariamente o início de um longo ciclo de afrouxamento”, afirmou em nota. Ainda assim, o banco está confortável em esperar por outro corte nas taxas na próxima reunião, bem como nas duas seguintes.
Fonte: Valor Econômico

