Por George Steer — Financial Times, de Nova York
28/03/2024 05h02 Atualizado há 5 horas
As ações de baixa capitalização (“small caps”) dos Estados Unidos estão com o pior desempenho em relação às grandes empresas em mais de 20 anos, o que ressalta o quanto os investidores têm perseguido as ações das gigantes de tecnologia, enquanto grupos menores são pressionados pelas taxas de juros elevadas.
O índice Russell 2000 subiu 24% desde o início de 2020 e ficou bem atrás do ganho de mais de 60% do S&P 500 ao longo do mesmo período. A disparidade no desempenho abala uma norma histórica de longo prazo, segundo a qual as empresas de baixa capitalização e rápido crescimento tendem a garantir retornos melhores para os investidores que conseguem aguentar a volatilidade maior.
Segundo analistas, o tamanho atípico da diferença entre os dois índices, acompanhados com muita atenção, se ampliou nos últimos anos, à medida que as ações de small caps, com balanços relativamente fracos e poder de fixação de preços modesto, foram mais prejudicadas pela inflação alta e pelo forte aumento nos custos do crédito, o que desanimou investidores.
“Invisto em small caps há quase 30 anos e desde 2016 ou 2017 não se vê muito dinheiro entrando nesse mercado”, disse Greg Tuorto, gestor de carteiras do segmento na Goldman Sachs Asset Management.
“É preciso um pouco de cobiça, é preciso um pouco desse espírito animal, talvez uma melhora na área de fusões e aquisições ou um boom no mercado de ofertas públicas iniciais (IPO), para que as small caps decolem de verdade”, acrescentou ele.
O S&P sobe de forma constante desde o início de novembro, e os fortes ganhos e o entusiasmo dos investidores a respeito do ímpeto da inteligência artificial geram lucros enormes para empresas do tipo da Nvidia e da Meta.
Por outro lado, a recuperação das empresas de baixa capitalização que ganhara força nos últimos meses de 2023 se esvaiu este ano, o que ampliou ainda mais a já grande diferença de desempenho. As ações de grupos de serviços públicos e telecomunicações, como a empresa de banda larga Gogo, a Vertex Energy e a Middlesex Water, estão entre as que foram afetadas.
Sem contar um breve período de desempenho superior ao do mercado em 2020, durante as fases iniciais da pandemia, as ações de small caps têm ficado atrás das empresas maiores desde 2016.
Nos anos 2000, antes de as taxas de juro do mundo todo caírem a perto de zero na sequência da crise financeira, as ações negociadas com pouca frequência e pouco acompanhadas por analistas tinham, em média, um desempenho superior ao das maiores empresas. Analistas atribuem esse padrão a uma combinação de ineficiência do mercado com o potencial de crescimento explosivo das futuras líderes de mercado.
“Quando você acerta com as small caps, não acerta 20% mais do que Wall Street, suas estimativas de ganhos e receitas podem ser o dobro de onde o consenso está… Isso leva a um ganho de preço mais significativo”, disse Tuorto, cuja carteira é dominada por ações como as de Shake Shack e Wingstop, assim como por varejistas.
Embora haja sinais de que a recuperação do mercado acionário começou a se ampliar para além das maiores ações de tecnologia, a inflação persistente e um mercado de trabalho resiliente contribuíram para que recentemente os traders passassem a aceitar que os juros podem continuar elevados por um período maior do que eles esperavam há apenas alguns meses.
No pior cenário possível, em que o Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) se veja obrigado a manter as taxas como estão por vários meses ou até mesmo a elevá-las, provavelmente as empresas menores serão as mais atingidas. Cerca de 40% da dívida nos balanços do Russell 2000 é de curto prazo ou de taxa flutuante, em comparação com cerca de 9% no caso das empresas do S&P.
Os lucros do quarto trimestre das empresas do Russell 2000, das quais cerca de 30% não são lucrativas, caíram 17,6% em comparação com o mesmo período do ano anterior, segundo dados do London Stock Exchange Group (LSEG). Os ganhos das empresas do S&P, em contrapartida, cresceram cerca de 4%, embora grande parte disso tenha sido impulsionada pelas ações de tecnologia das chamadas Sete Magníficas.
Seja como for, a não ser que haja uma recessão, a expectativa é que os lucros das small caps melhorem à medida que as taxas de juro comecem a baixar. Na semana passada, o presidente do Fed, Jerome Powell, manteve as taxas inalteradas e sinalizou uma preferência por um corte equivalente a 0,75 ponto percentual este ano, o que empurrou o Russell 2000 para cima em um ponto percentual a mais do que o S&P naquele dia.
“Se os lucros [das small caps] aumentarem, as pessoas comprarão as ações”, disse David Lefkowitz, chefe para ações dos EUA no UBS. “E os ganhos devem crescer.”
Os analistas esperam, em média, crescimento de 14% nos lucros das empresas do Russell 2000 este ano.
“O acesso ao capital tem melhorado, as condições financeiras estão mais relaxadas, os mercados de alto rendimento estão totalmente abertos e a emissão de ações começou a crescer realmente”, disse Lefkowitz.
Para Jill Carey Hall, estrategista de ações dos EUA e chefe de estratégia de pequenas e médias empresas dos EUA no Bank of America, as avaliações mais baixas das small caps são um bom sinal para os retornos. Historicamente, a negociação no setor se dava em múltiplos semelhantes aos do S&P 500, mas por causa da disparada das ações de grande capitalização nos últimos meses, hoje é negociado com um desconto quase recorde.
“Antes desta, a única vez que vimos múltiplos relativos tão baratos foi durante 1999 e 2000, e aquela década acabou sendo ótima para as small caps”, disse ela.
Fonte: FT / Valor Econômico

