Por enquanto, Biden e Trump lideram com folga as pesquisas para as primárias, o processo de prévias partidárias que define os candidatos dos dois principais partidos americanos.
Segundo a média do agregador de pesquisas RealClear Politics, Biden tem 66,7% das intenções de voto nas primárias do Partido Democrata, bem à frente dos dois desafiantes até agora, Robert Kennedy Jr. (11,9%) e Marianne Williamson (5,6%).
Já no Partido Republicano há ao menos dez candidatos que pontuam nas pesquisas, mas Trump lidera também com folga, com 56,6%, na média da RealClear Politics. Ele tem neste momento a sua maior vantagem sobre o segundo colocado, o governador da Flórida, Ron DeSantis (com 12,7%). Em seguida estão o empresário Vivek Ramaswamy (7,2%) e a ex-governadora Nikki Haley (5,8%).
Ou seja, as pesquisas indicam que Biden e Trump caminham para vitórias esmagadoras. As primárias republicanas começam em 15 de janeiro, no Estado de Iowa. Os democratas ainda não definiram a data de início.
Mas esta campanha eleitoral terá vários situação inéditas e complexas, que podem trazer surpresas ao longo do caminho. Biden (hoje com 80 anos) e Trump (com 77 anos) seriam os dois candidatos mais velhos a disputar a Presidência dos EUA. Trump será o primeiro candidato presidencial americano a fazer campanha enquanto responde a quatro processos judiciais (e pode vir a ser condenado). Biden terá de enfrentar um processo de impeachment aberto no Congresso americano e a ação judicial contra seu filho, Hunter, que pode respingar na sua candidatura.
Apesar de liderarem a corrida das primárias, uma série de pesquisas indica que um percentual recorde de americanos (36%, segundo sondagem da CNN) gostaria que nem Biden nem Trump fossem candidatos. Segundo pesquisa da Associated Press, Biden é visto como velho e confuso, enquanto Trump é visto como corrupto e desonesto.
Ou seja, nunca como agora os americanos desejaram candidatos diferentes dos favoritos atuais. Isso ampliará o escrutínio sobre Biden e Trump nos próximos meses e pode abrir margem para novas candidaturas, dentro e fora dos dois partidos.
O primeiro risco para Biden e Trump está relacionado com a idade. Após os episódios de apagão em público do líder republicano no Senado, Mitch McConnell (de 81 anos), qualquer sinal de fragilidade física ou mental nos próximos 13 meses até as eleições pode ser fatal para os dois favoritos.
Na semana passada, o senador republicano Mitt Romney (candidato presidencial derrotado em 2012) anunciou que não disputará a reeleição. Com 76 anos, ele disse que o país precisa de novos líderes e pediu que tanto Biden como Trump deixassem a disputa.
Trump terá de lidar com os quatro processos judiciais já instaurados contra ele por: 1. tentar interferir nas eleições no Estado da Geórgia; 2. manter indevidamente em sua casa documentos sigilosos americanos; 3. Liderar a rebelião que culminou com a invasão do Congresso americano; 4. Fazer pagamentos ilegais a uma ex-amante para que ela não falasse sobre a relação. Nenhum desses processos deverá ser concluído em última instância até as eleições, de modo que Trump poderá alegar inocência durante a campanha.
O impacto político inicial dos processos parece ter sido positivo para Trump. Ele se consolidou como favorito na corrida pela candidatura republicana e não perdeu apoio nas pesquisas de intenção de voto contra Biden. Ainda assim, possíveis revelações e a constante publicidade negativa podem afetar a sua campanha nos próximos meses.
Nos EUA não existe nada parecido com a Lei da Ficha Limpa e Trump poderá ser candidato mesmo se condenado. Porém, há movimentos que estão tentando barrar a sua candidatura com base na 14ª emenda da Constituição americana, que proíbe alguém que “se engajou em rebelião ou insurreição contra os Estados Unidos” de exercer cargo público. Isso pode se tornar uma nova batalha judicial e acabar na Suprema Corte.
Já Biden será alvo de um processo de impeachment, cujo anúncio foi feito na semana passada pelo presidente da Câmara dos Deputados dos EUA, o republicano Kevin McCarthy, que promete investigar o presidente por “acusações de abuso de poder, obstrução e corrupção”. McCarthy até agora não apresentou nenhuma prova contra Biden. Muitos republicanos se opuseram à abertura de processo, pois temem que ele seja um fiasco. Biden quase certamente será absolvido.
O presidente terá de lidar ainda com o processo contra seu filho, Hunter, que é acusado de manter ilegalmente uma arma enquanto era dependente de drogas. Se for condenado, Hunter poderá ser preso. O efeito eleitoral do caso ainda é incerto.
Com os riscos envolvendo os dois candidatos, há a possibilidade de que novos nomes entrem na disputa eleitoral. Ronald Reagan, por exemplo anunciou sua candidatura em novembro de 1979, a menos de um ano das eleições de 1980. Bill Clinton só entrou na disputa em outubro de 1991.
Do lado republicano, é possível ainda que alguns pré-candidatos desistam, e que a disputa se concentre em torno de menos nomes, o que pode favorecer o surgimento de um candidato anti-Trump no partido. Segundo reportagem recente do jornal “Financial Times”, vários grandes doadores de campanha republicanos temem que Trump perca novamente as eleições e estão aguardando a definição de um candidato anti-Trump para liberar financiamento político.
Além disso, há ainda a possibilidade de que candidatos independentes ou de outros partidos ganhem destaque e afetem o resultado eleitoral. O Partido Verde já anunciou a disposição de candidatar o filósofo e ativista Cornel West, que aparece com 2% a 5% das intenções de voto em três pesquisas recentes. O movimento centrista No Label também estuda o lançamento de uma candidatura alternativa.
Segundo pesquisas e analistas, essas duas candidaturas poderiam tirar votos de Biden e facilitar a vitória de Trump. Pesquisas de intenção de voto nacionais que incluem apenas Biden e Trump estão dando empate técnico — 45,2% para o republicano e 44,8% para o democrata, segundo a média do RealClear Politics. Num cenário tão apertado, West pode tirar votos essenciais de Biden nos Estados mais divididos, dando vantagem a Trump.
Isso já ocorreu antes. Em 1992, o candidato independente Ross Perot obteve 13,9% no país, tirando votos do então presidente republicano George Bush, que acabou derrotado pelo democrata Bill Clinton. Em 2000, o candidato verde Ralph Nader teve mais de 97 mil votos na Flórida, o que possivelmente permitiu que o republicano George W. Bush ganhasse no Estado (por pouco mais de 500 votos) do democrata Al Gore e se elegesse presidente dos EUA.
Fonte: Valor Econômico

