Por Felipe Saturnino — De São Paulo
12/04/2022 05h03 Atualizado há 4 horas
Comentários feitos ontem pelo presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, foram recebidos pelo mercado como um sinal de que a autoridade pode revisar seu plano de voo para a política monetária, o que se refletiu em forte ajuste nos juros futuros. Como resultado, os investidores passaram a projetar uma taxa Selic ainda maior no fim do ciclo de alta, próxima dos 13,5%, o que significa que o BC acabaria por estender o processo de aperto.
No fim da sessão regular na B3, a taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2023 subiu de 12,97% para 13,085%, e a do DI para janeiro de 2024 escalou de 12,43% para 12,65%. Em vencimentos mais longos, a taxa do DI para janeiro de 2027 foi de 11,50% para 11,635%.
O economista-chefe da Apex Capital, Alexandre Bassoli, afirma que as falas de Campos abriram a possibilidade de reavaliação do cenário do BC, o que ficou evidente pelo forte avanço das taxas de mercado. Para Bassoli, o IPCA de março chancela a perspectiva de um aperto mais longo. “A inflação está muito disseminada e a tendência da inflação subjacente é de alta.” Se o BC encerrar as altas de juros em maio, o risco é de uma desancoragem ainda maior das expectativas de inflação para 2023, diz.
De acordo com o último Boletim Focus divulgado pelo BC, de 28 de março, a mediana de IPCA para 2023 subiu de 3,75% para 3,80% – acima do centro da meta, de 3,25%. No mercado, a inflação para ano que vem embutida no contrato de futuro de cupom de IPCA (DAP) era maior, de 6,38%, na sexta, segundo a Necton.
A Apex prevê taxa básica final de 13,25%, com alta de 1 ponto em maio e outra de 0,5 ponto, em junho, mas Bassoli pondera que “os riscos são muito assimétricos no sentido de ciclo mais longo e taxa terminal maior do que isso”.
Na Claritas, a avaliação é que o BC segue dando argumentos contudentes para parar o aperto em maio, mas a deterioração do quadro inflacionário deve fazer a autoridade monetária buscar um juro maior que 12,75%.
“Estamos confortáveis com uma previsão de Selic de 13,25% porque achamos que o Copom ainda ressalta que fez um ajuste grande da taxa e, além disso, o horizonte é só 2023 e, depois, 2024, ou seja, o BC não está reagindo à inflação corrente”, diz a economista-chefe, Marcela Rocha. De acordo com ela, Campos indicou que o BC tem consciência de que a inflação está espalhada além de serviços, atingindo bens industriais e salários. “Esses fatores continuam enviesados para cima, indicando que o movimento de inflação é muito mais generalizado do que apenas a alta de combustíveis”, diz.
Na leitura de Vitor Martello, economista da Parcitas Investimentos, a manutenção de núcleos de inflação (medidas que desprezam itens voláteis, como alimentos e energia) em patamares elevados além de junho justificariam apertos acima dos 13,25% projetados pela gestora.
“Para uma inflação menos pressionada, o câmbio é uma variável bastante importante. O bom desempenho do real no início do ano mostra que o canal de transmissão da política monetária para a moeda está funcionando”, avalia o economista.
Ele projeta que o dólar encerrará o ano a R$ 4,80, contribuindo com um IPCA de 6,6% em 2022 e de 3,5% em 2023. “Acho que o Focus ainda não incorporou essa força do câmbio”, afirma. O dólar comercial prosseguiu ontem em sua trajetória de queda, com recuou de 0,41%, negociado a R$ 4,6899 no fechamento do pregão. A moeda já cai 16% no acumulado de 2022.
Prevendo aperto ainda maior do que os pares está o economista-chefe do MUFG Brasil, Carlos Pedroso, que ressalta que as projeções de inflação para 2023 não se estabilizaram. Isso significa, avalia ele, que os fatores caminham “na direção de uma Selic no final de ciclo mais elevada do que o BC tinha indicado nos comunicados oficiais”. O cenário para política monetária do banco contempla aumento de juros para 13,50% ao fim do ciclo, em junho.
“As expectativas para 2023 em diante são cruciais para averiguar se a inflação está dentro da meta almejada. Deterioração adicional pode redundar em aperto ainda mais forte”, completa. (Colaborou Igor Sodré)
Fonte: Valor Econômico


