Por Harriet Clarfelt e Brooke Masters — Financial Times, de Nova York
12/04/2024 05h02 Atualizado há 5 horas
Os fundos de investimento do mercado monetário que incluem dívida privada de primeira linha (“prime”), segmento que movimenta US$ 674 bilhões, deverá encolher pelo menos um terço este ano nos EUA. Isso porque as grandes gestoras de investimentos estão fechando alguns desses veículos com objetivo de não pagar pelas atualizações necessárias para cumprir os novos regulamentos.
Gestoras de recursos como Federated Hermes, Capital Group e Vanguard afirmam que pretendem fechar esses fundos, num montante de mais de US$ 220 bilhões em ativos, ou convertê-los em outros produtos antes da entrada em vigor das regras da Securities and Exchange Commission (SEC, a CVM americana) no começo de outubro, que imporão o pagamento de uma taxa obrigatória sobre grandes resgates.
Outros gestores afirmam que ainda estão decidindo o que fazer, mas analistas do Bank of America (BofA) e executivos do setor preveem fechamentos e conversões adicionais à medida que o prazo final for se aproximando.
Diferentemente dos fundos do mercado monetário centrados na dívida pública, os fundos prime são capazes de manter “commercial papers” de prazos curtos, incluindo dívida bancária. Sob as novas regras, os fundos prime institucionais terão de impor uma taxa sobre as saídas sempre que os resgates líquidos superarem 5% dos ativos líquidos em um único dia.
As novas normas visam evitar debandadas de investidores como as vistas no começo da pandemia em 2020, quando grandes resgates levaram os fundos de primeira linha a vender ativos com descontos e infligir perdas aos investidores que permaneceram na aplicação.
Mas vários grandes gestores vêm optando por fechar os fundos prime ou convertê-los em veículos voltados para a dívida pública, que não estarão sujeitos às novas regras. Eles afirmam que os critérios constituem um fardo “operacionalmente difícil” e “altamente prescritivo” que irá elevar os custos e complicar as estruturas dos fundos.
As novas exigências visam proteger especificamente os investidores dos fundos de primeira linha, que oferecem retornos maiores que os chamados fundos monetários “governamentais”.
No entanto, alguns participantes do mercado alertam que a diminuição do número de fundos institucionais de primeira linha reduzirá a diversificação das carteiras dos investidores e encolherá o conjunto de compradores da classe de ativos dos commercial papers, que movimenta US$ 1,3 trilhão. No fim de janeiro, os fundos prime mantinham mais de US$ 310 bilhões em commercial papers não securitizados e lastreados em ativos, ou cerca de um quarto de todo o mercado, segundo o Federal Reserve (Fed, banco central americano).
“Será uma luta realmente árdua demonstrar que o fardo adicional vale o custo de vários pontos-base que teríamos preservado com a sua manutenção no formato original”, diz John Croke, chefe de renda fixa ativa da Vanguard. A casa está convertendo um fundo interno de US$ 89 bilhões, usado pelos cotistas para fazer gestão de caixa, de um veículo composto por títulos de primeira linha para dívida soberana.
A Capital Group está fazendo a mesma coisa com seu fundo de US$ 135 bilhões. O interesse continua firme nos fundos de varejo de primeira linha, que não serão afetados pelas novas taxas de liquidez da SEC. Os ativos líquidos desses fundos aumentaram 48% em março, sobre o mesmo período do ano passado, para US$ 750 bilhões, segundo a Crane Data.
“Nos ameaçaram de morte com uma grande flutuação de preços e agora querem nos afogar com taxas de resgate” — Chris Donahue
Mas os gestores de fundos estão preocupados com a demanda institucional reduzida. Companhias que dependem dos commercial papers ainda “serão capazes de obter financiamento, mas a que preços e com que prazos?”, pergunta Chris Donahue, presidente-executivo da Federated Hermes, que fechou um de seus fundos de primeira linha e fundiu dois outros produtos.
A SEC continua comprometida com as novas taxas. “Como disse o presidente Gensler, os fundos institucionais de primeira linha e os institucionais isentos de taxas, que representam apenas 10% do espaço do mercado monetário, enfrentaram os maiores saques nos últimos períodos de estresse”, disse um porta-voz da SEC. “As taxas de liquidez que fazem parte das regras finais para os fundos do mercado monetário ajudarão a gerir os riscos em tempos de turbulências, para proteger os investidores.”
O setor também vem criticando a maneira como as taxas de liquidez foram impostas. A SEC propôs inicialmente um método diferente para lidar com os grandes resgates, conhecido como “swing pricing” (flutuação de preços), que exigiria que os gestores incluíssem o impacto dos saques no cálculo do valor líquido dos ativos de seus fundos. Mas depois da resistência dos gestores de recursos, a SEC optou pelas taxas de liquidez obrigatórias, sem oferecer um período adicional de consulta.
Muitas gestoras ainda estão tentando “descobrir” como implementar a regra, diz Eric Pan, presidente-executivo do Investment Company Institute (ICI), observando que há demanda para os fundos do mercado monetário de primeira linha e que vários provedores “farão o máximo para tentar atender essa demanda”.
Ainda assim, “a regra deveria ter sido proposta novamente”, diz Pan, acrescentando que “a SEC claramente não entendeu as complexidades e as dificuldades de se implementar uma taxa de liquidez obrigatória”.
Donahue, da Federated, diz: “Eles nos ameaçaram de morte com uma grande flutuação de preços e então nos afogaram com as taxas de liquidez. E quando você acorda do afogamento simulado e vê que não está morto, você deveria se sentir feliz. Esse não é um bom padrão de regulamentação”.
Fonte: Valor Econômico

