Por Fernanda Guimarães e Talita Moreira — De São Paulo
10/04/2024 05h02 Atualizado há 4 horas
A combinação de amplo mercado consumidor, economia diversificada e considerada “amigável” geopoliticamente eleva o potencial do Brasil de atrair o capital estrangeiro, mas o país ainda enfrenta uma ausência de gatilhos para a entrada desse fluxo, afirma o vice-presidente de atacado do Santander Brasil, Renato Ejnisman.
O mais evidente deles é a queda de juros nos Estados Unidos, que tem sido postergada diante da persistência de sinais inflacionários no país, o que tem mantido os investidores financeiros mais distantes dos ativos de risco. Por outro lado, ressalta, a falta de clareza sobre o Brasil também tem pesado contra os investimentos vindos de fora.
Isso não quer dizer, contudo, que o país não possa atrair o capital estrangeiro. “Não faltam teses para se investir no Brasil”, diz Ejnisman em entrevista ao Valor . O executivo completou recentemente seu primeiro ano à frente da área de atacado do Santander, depois de cerca de 15 anos no banco de investimento do Bradesco e no Next, banco digital da Cidade de Deus.
Por enquanto, segundo o executivo, o país não tem conseguido aproveitar um momento que é propício para a entrada de dinheiro de fora. Ao contrário, apenas neste início de ano, o Brasil viu mais de R$ 20 bilhões em capital estrangeiro escoarem da bolsa local. É o oposto do que acontece em outros países emergentes. A Índia, por exemplo, tem atraído dinheiro como novo polo de crescimento econômico, depois da perda do brilho da China. O México tem recebido investimentos fortemente ancorado na tese do “nearshoring”, tendência de aproximação da produção ao público consumidor.
Isso significa, na visão de Ejnisman, que as vantagens competitivas brasileiras precisam ser mais bem exploradas. O país é relevante no agronegócio e tem uma matriz energética grande e limpa, um foco de atenção dos investidores estrangeiros. Há também potencial em projetos de infraestrutura. E o Brasil poderia ainda se beneficiar do “friendshoring”, a destinação dos centros de produção a países mais “amigáveis”, diante das tensões geopolíticas no mundo.
No entanto, questões domésticas também voltaram a ganhar destaque nas últimas semanas, especialmente a ingerência em grandes empresas com participação do Estado – sobretudo Vale e Petrobras, ações muito procuradas por estrangeiros. “Ambas têm um peso muito grande no índice [Ibovespa]. Com o índice caindo, investidores ajustam posições”, diz.
Se na bolsa o capital estrangeiro tem se distanciado neste ano, o capital que vem ao país por meio das fusões e aquisições (M&A, na sigla em inglês) está aumentando, com o peso de operações “crossborder” (sobretudo, estrangeiros comprando empresas brasileiras) ganhando corpo. Ao longo das últimas semanas, o “pipeline” de mandatos (operações em fase de preparação) com esse perfil tem crescido dentro do banco, o que sinaliza o interesse dos investidores de mais longo prazo no país. Ejnisman pretende que o Santander amplie sua posição nesse mercado, ganhando espaço dos concorrentes.
Desde a chegada do executivo ao comando da área de atacado do banco, a equipe mudou de perfil e aumentou cerca de 10%. Para ficar à frente de mercado de capitais, com foco em renda variável e M&A, trouxe no ano passado Leonardo Cabral, que estava no Credit Suisse. Outros executivos do banco suíço, vendido ao UBS no ano passado, também foram contratados. As operações de renda fixa são comandadas por Sandro Marcondes, que está no Santander desde 2018 e, antes disso, foi diretor financeiro da Neoenergia e já trabalhou no Banco do Brasil.
Ejnisman afirma que tem procurado fazer com que o banco de atacado do Santander adote uma postura mais ativa frente aos clientes, de forma que os mandatos de operações no mercado de capitais não sejam apenas consequência do balanço que a instituição financeira tem. Não que esse fator seja ruim, ao contrário. O executivo frisa que a capacidade do banco de oferecer crédito é uma vantagem competitiva em relação aos demais bancos estrangeiros no Brasil, que não têm a mesma força local. Porém, não pode ser o único fator de atratividade.
Segundo Ejnisman, o banco vem tentando mostrar aos clientes que tem o conhecimento local e também a experiência setorial ao redor do mundo, e pode combinar ambos. “Não queremos nos alavancar apenas na relação comercial. Temos que ser uma usina de ideias”, afirma. “Tem um lado mais estratégico que já existia, mas a gente deu um novo foco a ele e a resposta [dos clientes] foi rápida.”
Outra frente que tem sido reforçada, segundo o executivo, é a área de médias empresas – o chamado “middle market”. O banco passou a usar mais intensamente dados que já tem sobre esses clientes para fomentar transações. Com essas informações é possível identificar, por exemplo, companhias que buscam uma capitalização, ou identificar empresas que não têm sucessores e podem se interessar por uma operação de M&A. Hoje, em número de transações, aquelas que envolvem companhias de médio porte já chegam a representar metade do “pipeline” do banco, segundo Ejnisman.
Na renda variável, a expectativa do banco é que possa haver alguma retomada de IPOs (ofertas iniciais de ações, na sigla em inglês) ainda em 2024, após uma seca de mais de dois anos. Porém, segundo Cabral, a volta deve ser concentrada em operações de grande porte. “Liquidez é um fator muito importante hoje”, diz.
Enquanto isso, as operações de renda fixa vivem um momento aquecido, com forte redução de taxas após as mudanças nas regras para títulos incentivados. “Os spreads estão no patamar mais baixo em cinco anos”, afirma Marcondes.
Fonte: Valor Econômico

