A sequência expressiva de recordes alcançada pelo Ibovespa nos últimos dias surpreendeu participantes do mercado. Se fatores externos eram os principais responsáveis pela valorização da bolsa brasileira até outubro, nas últimas semanas quem assumiu o protagonismo foram as questões domésticas. O principal índice da bolsa brasileira atingiu a 15ª sessão consecutiva de alta na sessão de ontem, ao subir 1,60%, aos 157.749 pontos. Esse foi, inclusive, o 12º recorde de fechamento consecutivo do indicador.
Somente nessas últimas 15 sessões, o Ibovespa saltou 9,5%. Parte do bom desempenho da bolsa local guarda relação com as expectativas renovadas dos agentes em torno da política monetária, diante das apostas de que o ciclo de flexibilização da Selic deve, enfim, ter início no primeiro trimestre de 2026. Essa percepção, inclusive, foi reforçada pela leitura abaixo do esperado do IPCA de outubro e pelos sinais mais suaves emitidos pela ata da reunião de semana passada do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC).
“A bolsa até pode cair por algum motivo específico, mas uma alta muito forte só acontece pela combinação de vários fatores”, afirma Jerson Zanlorenzi, chefe da mesa de ações e derivativos do BTG Pactual. A soma de ações descontadas e crescimento dos resultados corporativos explica a sequência de 15 pregões consecutivos de alta, em um ambiente de forte apetite global por ativos de risco em mercados emergentes.
“Mas o movimento não é só no Brasil. Fomos varridos por esse otimismo com emergentes. Bolsa barata e fluxo internacional fizeram o mercado andar no primeiro semestre”, observa Zanlorenzi, em um ambiente que ainda contempla duas reduções nos juros pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano) e um aumento da probabilidade de mais um corte no fim deste ano.
O profissional do BTG observa que, desde setembro, o mercado passou a precificar o início do ciclo de cortes da Selic. Para ele, inclusive, o tamanho do futuro ciclo de alívio na Selic será até mais relevante do que o momento exato em que o BC começará a reduzir as taxas, seja em janeiro ou março.
“Há chance de o BC promover um ciclo de cortes mais intenso, já que o mercado costuma subestimar a sua magnitude. Podemos ver a Selic cair para 11%”, afirma Zanlorenzi. “Mas, mesmo que a taxa no fim do ciclo fique em 12% — nosso cenário-base —, isso ainda representaria uma redução de 3 pontos percentuais no próximo ano, o suficiente para trazer de volta investidores institucionais e pessoas físicas, que ficaram totalmente de fora da renda variável.”
O retorno desses perfis de alocadores pode estar apenas no início, explica Zanlorenzi. Os sinais da mudança de comportamento são vistos, primeiro, na diminuição dos fluxos de renda fixa e no aumento de aportes em fundos multimercados para, assim, serem observados na bolsa local.
A visão é compartilhada por João Caruso, cogestor e analista de renda variável da Vinland Capital, para quem a queda dos juros pode até ser, eventualmente, antecipada diante dos números de inflação mais favoráveis. Assim, a bolsa tende a responder à mudança na política monetária, o que seria favorável para as empresas ligadas ao ciclo econômico.
“À medida em que os juros caem, tem muito espaço para a bolsa andar, tanto pela melhora na condição de lucratividade das companhias quanto pela procura do investidor por maior risco quando de fato as taxas caírem. É uma combinação explosiva”, diz Caruso. “Não é porque a bolsa subiu que não pode subir mais. Podemos ver níveis acima do que vemos hoje, sem contar com as questões eleitorais, que não estão precificadas ainda”, enfatiza.
No contexto de Ibovespa nas máximas, outros papéis têm acompanhado. De acordo com os cálculos do Valor Data, 18 ações de empresas que compõem o índice também estão em nível recorde — casos dos papéis preferenciais do Itaú Unibanco, das units do BTG e das ações ordinárias da Equatorial e da Sabesp.
Ainda que tenha subido de forma bastante expressiva recentemente, a bolsa brasileira ainda negocia a 9,5 vezes o preço sobre lucro (P/L), longe da máxima de 11,5 vezes, segundo cálculos do BTG.
O estrategista de ações da Genial Investimentos, Filipe Villegas, também defende que a bolsa segue com preços atrativos, juntamente com uma combinação de temporada de balanços sólidos. “O que justificou essa última pernada de alta mais forte foi a expectativa de inflação mais baixa no Brasil, que foi o grande divisor de águas”, diz. “Considerando que a Selic pode ficar abaixo de 12%, há um motivo para vermos esse movimento bastante positivo na bolsa brasileira”, acrescenta.
Outro motivo considerado essencial para a trajetória dos mercados no país é a corrida eleitoral de 2026. Para Caruso, da Vinland, embora a eleição esteja bastante distante, as narrativas e movimentos das últimas semanas em torno das sondagens eleitorais acabaram provocando um ajuste na curva de juros, o que teve reflexos na bolsa.
Levantamentos de alguns institutos que têm sido acompanhados diariamente por participantes do mercado indicaram perda de fôlego na popularidade do governo — o que contribuiu, ainda que marginalmente, para o bom desempenho dos ativos domésticos.
Caruso explica que as ações consideradas de “duration” mais longo, ou seja, mais sensíveis a mudanças nas taxas de juros de longo prazo, sentem mais os ruídos eleitorais. “É longo o caminho de definição de eleição e deve ter volatilidade à medida em que os candidatos forem escolhidos.”
Já Villegas, da Genial, aponta que o mercado segue acompanhando o processo eleitoral e que as pesquisas recentes sobre o pleito influenciaram, em alguma medida, o rali do Ibovespa. Para ele, a possibilidade de alternância do poder pode impulsionar as ações brasileiras. “As declarações do governo sobre a operação no Rio [contra o Comando Vermelho] repercutiram mal. Isso pode afetar a aprovação do governo. A oposição tem uma outra frente para trabalhar nesse próximo ano”, afirma.
Fonte: Valor Econômico

