Por Victor Rezende, Igor Sodré, Gabriel Roca e Matheus Prado — De São Paulo
07/06/2022 05h03 Atualizado há 4 horas
No dia em que o rendimento da T-note de dez anos voltou a superar o nível de 3%, o aumento na percepção do risco fiscal ajudou a penalizar os ativos domésticos. Enquanto as discussões no Congresso Nacional sobre o projeto que impõe um teto na cobrança do ICMS seguem a todo vapor, declarações do presidente Jair Bolsonaro, que pressionou o ministro da Economia, Paulo Guedes, por uma solução para os combustíveis, pesaram no sentimento do mercado.
O dólar encerrou a segunda-feira negociado a R$ 4,7956, em alta de 0,35%, enquanto o Ibovespa recuou 0,82%, aos 110.186 pontos. O comportamento do mercado acionário brasileiro destoou do sinal de Nova York, onde o Dow Jones subiu 0,05%; o S&P 500 avançou 0,31%; e o Nasdaq ganhou 0,40%.
A discussão em torno dos preços dos combustíveis ajuda a piorar a visão para o risco de intervenção política e para o risco fiscal, avalia Rafael Pacheco, economista da Guide Investimentos. “O governo tem discutido formas de ampliar os subsídios para combustíveis com medidas que piorariam a trajetória das contas públicas do país. Há alguma preocupação de que uma medida tomada às pressas possa configurar esse risco de piora das contas públicas”, nota.
Não por acaso, os juros de longo prazo, que tendem a ser mais sensíveis às discussões sobre a política fiscal, se ajustaram em alta firme no pregão de ontem. A taxa do DI para janeiro de 2027 subiu de 12,295% para 12,405%, enquanto a do DI para janeiro de 2029 avançou de 12,38% para 12,48%.
O viés de alta dos juros de longo prazo tem se mostrado ainda mais forte nos últimos dias. Em relatório semanal enviado a clientes, profissionais do Santander observam que “o movimento pode ter sido influenciado pelo ‘sell-off’ [venda] dos juros do Tesouro americano, bem como por possível preocupação com as perspectivas fiscais, dada a perda substancial de receita e/ou aumento de gastos que poderia resultar das iniciativas para conter os preços de energia”.
Ontem, no exterior, o juro da T-note de dez anos, que ultrapassou os 3% novamente, foi o principal destaque nos mercados. No fim do dia, a taxa estava em 3,049%, na medida em que os agentes voltam a colocar nos preços cenários de juros mais altos à frente, dadas as pressões inflacionárias agudas no curto prazo nos Estados Unidos.
Enquanto a perspectiva para a política do Federal Reserve (Fed) continua inclinada a um cenário de aperto mais intenso, a mesma leitura é observada no Brasil. A deterioração das expectativas de inflação, confirmada ontem na divulgação parcial do Boletim Focus, deu aval a uma nova rodada de avanço dos juros de curto prazo. A taxa do DI para janeiro de 2024 subiu de 13,03% para 13,115%.
O cenário que aponta para uma Selic ainda mais alta tem sido alimentado por indicadores do mercado de trabalho mais fortes que o esperado. Ontem, foi a vez de o Caged surpreender, ao mostrar abertura de postos de trabalho mais forte que o consenso do mercado. Na semana passada, a taxa de desemprego já havia surpreendido, com um resultado bem mais forte que o esperado pelos agentes.
“Para o trabalho de controle e reancoragem das expectativas de inflação, o dado veio contra o Banco Central”, diz o economista-chefe da RPS Capital, Victor Candido. “Um nível de desemprego menor indica que teremos mais pressões inflacionárias à frente, agora podendo ser lideradas pela inflação de serviços”, avalia o profissional.
O cenário de juros em alta também impede uma recuperação mais firme do Ibovespa. Os analistas da Ativa Investimentos, inclusive, dizem enxergar uma bolsa “de lado”, com fundamentos que impedem um ciclo de baixa e sem gatilhos para uma sequência de alta consistente. “Olhando o ‘copo meio vazio’, os mercados devem permanecer sem gatilhos claros de alta até as eleições”, dizem.
Fonte: Valor Econômico

