Quando as preocupações com a eleição presidencial de 2026 ainda não tinham dominado a atenção dos investidores, relatos de saída de dólares na etapa matutina do pregão circularam entre participantes do mercado, que passaram a acompanhar de perto quaisquer notícias sobre dividendos.
O dólar, que abriu o dia em queda, começou a destoar de outros mercados emergentes no Brasil e se firmou em alta contra o real mesmo antes das discussões políticas ficarem no centro das atenções. Depois do “efeito Flávio”, o câmbio passou a sofrer bem mais e a moeda americana, que começou o dia em R$ 5,30, chegou a tocar R$ 5,48 durante a tarde.
“Está sendo, de fato, o primeiro dia em que está ocorrendo uma saída por dividendos”, afirmou um gestor de moedas ainda durante a manhã de sexta-feira.
A XP, inclusive, montou um monitor diário de saída potencial de dólares e passou a divulgar os dados a seus clientes. De acordo com a XP, foram anunciados até o momento R$ 56,3 bilhões de dividendos extraordinários e juros sobre capital próprio (JCP) desde o fim de outubro e, desse total, a corretora estima que 65% se referem a papéis de propriedade de estrangeiros, com potencial de ser remetido ao exterior.
“Desse potencial, R$ 22,9 bilhões serão pagos ainda em dezembro (US$ 4,3 bilhões)”, nota a XP.
“Existe alguma apreensão no mercado”, nota o estrategista-chefe da BTG Pactual Asset Management, Tiago Berriel. “Não é muito claro como essa mudança na legislação deveria afetar o fluxo neste fim de ano, até porque foi aprovada, no Senado, uma extensão de prazo que limitaria o impacto, mas, sob incerteza, talvez as pessoas ajam. Na dúvida, pode ser que exista uma demanda adicional por fluxo [de saída]”, nota o profissional, que já foi diretor do BC.
No “call” mensal da casa, Berriel avalia que é preciso monitorar de perto os fluxos neste fim de ano, mas observa que pode ter havido uma antecipação e que a sazonalidade histórica de um fluxo cambial negativo no fim de ano não necessariamente se materializa em um aumento da volatilidade cambial. “Não acredito que teremos uma fonte de volatilidade muito grande, porque é algo antecipável. O problema é quando se tem muito fluxo e o fundamento está apreendendo alguma notícia fiscal ruim ou condições de política monetária, mas não há nada nessa linha.”
Desde meados de outubro, a Occam tem mantido uma posição vendida em real contra o peso chileno, justamente por adotar uma postura mais cautelosa com o fluxo cambial no fim deste ano.
“O fluxo segue negativo. Foram US$ 7 bilhões em saída no último mês e a atenção, agora, fica basicamente no que vai acontecer ao longo do mês de dezembro. Tradicionalmente, é um mês mais desafiador para o fluxo por conta das remessas, mas, agora, ganha um contorno adicional por conta dos possíveis efeitos da nova tributação dos dividendos e sobre qual será o impacto em cima das remessas”, diz o gestor de moedas Fernando Chibante, da Occam.
Em comentários feitos no “call” mensal da gestora, Chibante lembra que dezembro de 2024 foi um mês “caótico” ao se observar o fluxo cambial, já que houve uma saída recorde de US$ 26,4 bilhões e uma intervenção expressiva do Banco Central, de US$ 21,6 bilhões. “É um mês para ficarmos atentos em relação aos próximos desdobramentos na parte de fluxo”, alerta o profissional.
É nesse sentido que Chibante mantém posição vendida no real, ou seja, aposta na desvalorização da moeda brasileira em relação ao peso chileno. “Mesmo com o carrego [“carry”] mais negativo por conta do diferencial de juros, é um período bastante desafiador para o real neste mês. Será interessante acompanhar isso.”
Fonte: Valor Econômico
