A guerra comercial lançada pelo presidente Donald Trump se intensificou ontem, com retaliações da China e da província canadense de Ontário contra os EUA, e da China contra tarifas do Canadá sobre seus carros elétricos. Essa crescente tensão comercial alavancou os temores de que os aumentos de tarifas, os cortes de gastos e as mudanças geopolíticas de Trump podem levar a maior economia do mundo a uma recessão.
Em meio à forte queda nos mercados de ações — o índice S&P 500 fechou em baixa de 2,7% — a Casa Branca buscou minimizar os temores de uma contração do PIB no primeiro trimestre e preocupações com a inflação. Em uma entrevista à CNBC, Kevin Hassett, que lidera o Conselho Econômico Nacional, disse que havia muitos motivos para estar otimista sobre a economia dos EUA. Segundo ele, as tarifas de Trump sobre o Canadá, China e México já estavam tendo o efeito pretendido de trazer a indústria e os empregos de volta aos EUA.
Hassett disse que com certeza haveria “alguma turbulência” neste trimestre, decorrente dos efeitos da rápida implementação das tarifas de Trump e do que ele chamou de a “herança de Biden”.
Trump e sua equipe têm repetidamente criticado a economia que herdaram do democrata Joe Biden. Mas quando Trump assumiu o cargo em janeiro, o crescimento do PIB havia excedido amplamente a tendência por dois anos, os gastos do consumidor estavam fortes e o desemprego ainda estava perto de baixas históricas.
Vários indicadores recentes, no entanto, apontam para uma tendência de desaceleração, e a pesquisa de expectativas do consumidor do Fed de Nova York, divulgada ontem, revelou que as famílias americanas estão “mais pessimistas com relação a sua situação financeira para o ano que vem em fevereiro, enquanto as expectativas de desemprego, inadimplência e acesso ao crédito se deterioraram notavelmente”.
Desde ontem, uma série de produtos agrícolas americanos, desde frango e carne bovina até grãos, está sujeita a novos impostos chineses de 10% a 15%. Os carregamentos que partiram antes de segunda-feira e que chegarem à China por volta de 12 de abril estarão isentos, como parte de um esquema de transição, segundo Pequim.
A China anunciou a retaliação logo após uma nova tarifa adicional de 10% imposta por Trump sobre todos os produtos chineses entrar em vigor em 4 de março.
Pequim surpreendeu no fim de semana ao anunciar planos de impor uma tarifa de 100% sobre o sobre o óleo de colza e as ervilhas exportados pelo Canadá, além de uma de 25% sobre a carne suína e outros produtos agrícolas do país, a partir de 20 de março. Para justificar a medida, o governo chinês citou a decisão do Canadá, em outubro, de impor tarifas sobre veículos elétricos e metais chineses, que considerou uma violação das regras do comércio internacional.
Uma forma de interpretar a medida contra o Canadá é que se trata de um método da China para “tentar dissuadir países de alinharem suas políticas comerciais às de Trump”, disse Bert Hofman, professor do Instituto do Leste da Ásia, da Universidade Nacional de Singapura e ex-economista do Banco Mundial, à “Nikkei Asia”.
A rede de TV estatal CCTV chamou as novas tarifas sobre o óleo de colza e outros produtos de “uma forte contramedida contra a escolha errada do Canadá” e um alerta para países que possam querer anunciar tarifas contra a China “em troca de os EUA não imporem tarifas adicionais sobre eles”.
A China importou US$ 46 bilhões em bens do Canadá em 2024, 6% a mais do que no ano anterior, segundo dados da alfândega chinesa. Mas nos últimos anos passou a depender menos das mercadorias canadenses. Por exemplo, do total de óleo de colza importado pela China em 2024, só 0,03% veio do Canadá, uma forte queda em comparação aos mais de 90% que importava em 2016, uma vez que a China passou a comprar mais de outros países, como a Rússia.
Com suas respostas às duas rodadas de tarifas de 10% dos EUA, o governo do presidente da China, Xi Jinping, parece determinado a mostrar que não recuará, apesar dos custos econômicos.
A segunda rodada retaliatória da China abrange mais de US$ 22 bilhões em importações provenientes dos EUA, uma escalada em relação aos US$ 14 bilhões em fontes de energia importadas dos EUA taxadas em fevereiro.
Também ontem, Doug Ford, governador de Ontário, a província mais populosa do Canadá, anunciou a cobrança imediata de uma sobretaxa de 25% a 1,5 milhão de lares e empresas americanas em resposta à guerra comercial de Trump. Ontário fornece eletricidade para os Estados de Minnesota, Nova York e Michigan.
Ford disse que o adiamento de um mês das tarifas de Trump significa nada além de mais incerteza. A província do Quebec também está considerando tomar medidas semelhantes com as exportações de eletricidade para os EUA.
Fonte: Valor Econômico

