Um fundo imobiliário dos Estados Unidos com US$ 10 bilhões em ativos está ficando sem liquidez depois que investidores passaram a solicitar seu dinheiro de volta, ameaçando provocar um acerto de contas para um setor abalado pelo aumento de custo das dívidas e temores sobre “valuation” (avaliação de valor) de imóveis.
O Starwood Real Estate Investment Trust (Sreit), um dos maiores fundos imobiliários não listados dos EUA, sacou mais de US$ 1,3 bilhão de sua linha de crédito não garantida de US$ 1,55 bilhão desde o começo de 2023, devido a pesados pedidos de resgate.
O fundo, administrado pela Starwood Capital de Barry Sternlicht, entrou em 2023 sem recorrer à linha de crédito, mas agora tem apenas cerca de US$ 225 milhões em dinheiro para sacar, segundo os últimos registros desta semana.
No ritmo atual dos saques, o Sreit ficará sem crédito e sem dinheiro já no segundo semestre, a menos que contraia mais empréstimos ou venda mais ativos imobiliários.
O fundo da Starwood e um concorrente maior, administrado pela Blackstone Group, captaram e investiram dezenas de bilhões de dólares em propriedades comerciais pouco antes de as taxas de juros nos EUA começarem a subir em 2022, gerando comissões substanciais para seus controladores de private equity e consultores financeiros que vendem fundos para clientes ricos.
Ao contrário dos fundos imobiliários (Reits) negociados publicamente, nos quais os investidores estão livres para vender ações no mercado aberto, os Reits privados podem controlar as retiradas e evitar uma venda imediata de ativos. Mas ainda assim os investidores conseguiram tirar bilhões de dólares anualmente dos fundos da Starwood e da Blackstone, em meio às preocupações crescentes com as avaliações imobiliárias.
No ano passado, os investidores sacaram US$ 2,6 bilhões do Sreit e US$ 12,4 bilhões do Breit, o fundo imobiliário da Blackstone. Os saques no Breit diminuíram acentuadamente nos últimos meses, permitindo ao fundo atender totalmente aos pedidos mensais de retiradas pela primeira vez desde o fim de 2022, mas no Sreit os pedidos de saques continuam em níveis recordes.
A Blackstone convenceu alguns investidores de que conseguirá suportar a tempestade no setor imobiliário comercial em parte porque tem uma exposição menor que a da Starwood a setores como o de apartamentos nos EUA, e maior a áreas aquecidas, como a de centros de dados.
No primeiro trimestre deste ano, a Starwood, com sede em Miami, concedeu uma parcela cada vez menor dos pedidos de resgate. Investidores solicitaram US$ 1,3 bilhão de seu dinheiro de volta, mas receberam apenas US$ 501 milhões em uma base pro rata (proporcional), devido a um teto sobre as retiradas trimestrais estabelecido em 5% dos ativos líquidos. Em março, apenas cerca de um quarto desses pedidos foram atendidos.
A liquidez total do fundo imobiliário da Starwood estava em US$ 752 milhões em 30 de abril, composta por US$ 446 milhões em dinheiro em caixa, US$ 225 milhões em empréstimos disponíveis em sua linha de crédito e cerca de US$ 45 milhões em títulos de dívida disponíveis para venda, segundo documentos protocolados na quarta-feira. No entanto, um documento separado encaminhado na segunda-feira mostrou que o Sreit deveria cumprir outros pedidos de resgate de mais US$ 200 milhões em 1º de maio, esgotando rapidamente esse saldo de caixa.
“A liquidez não é uma coisa em que as pessoas pensam na alta, mas pode se tornar uma preocupação repentinamente”, diz Phil Bak, presidente-executivo da Armada Investors, que aplica em fundos listados de investimentos em imóveis. “Quando se trata dos Reits privados, as preocupações com a liquidez vinham sendo descartadas, mas elas voltarão a ser primordiais.” A Starwood não quis comentar.
Uma fonte familiarizada com o fundo disse que ele terá maior liquidez ainda este mês, depois da venda de ativos que será encerrada em breve. A Starwood poderá vender outros ativos para levantar recursos, disse a fonte. O fundo também anunciou um plano para alienar US$ 1 bilhão em imóveis por meio de acordos especiais de eficiência fiscal com indivíduos de alta renda.
A situação também destaca a alavancagem e a métrica de avaliação do Sreit, que investe em imóveis residenciais, além de armazéns industriais e instalações de autoarmazenamento. A carteira vai de blocos de apartamentos no Arizona a centros de logística na Noruega. Também inclui um empréstimo concedido à Blackstone para a aquisição do grupo australiano de hotéis e cassinos Crown Resorts.
Os alugueis de apartamentos nos EUA poderão ficar sob pressão este ano, à medida que uma oferta recorde de novas moradias chegar ao mercado, segundo a Yardi Matrix, uma provedora de dados sobre o setor imobiliário. Essas previsões pesaram sobre as avaliações dos Reits públicos investidos em habitações multifamiliares nos EUA, com as ações da Mid-America Apartments e da Camden Property Trust caindo mais de um terço desde o pico alcançado no fim de 2021.
O valor patrimonial líquido declarado da Starwood caiu mais de 15% em relação ao pico de setembro de 2022, de quase US$ 10 bilhões. No geral, os fundos privados se recusaram a reduzir o valor de seus ativos tanto quanto os listados caíram em valor.
A dívida elevada da Starwood, de US$ 15 bilhões, também se compara desfavoravelmente aos empréstimos nos Reits públicos, deixando-a com uma relação de alavancagem de 57% de seus ativos brutos, cerca de duas vezes maior que a dos fundos públicos da categoria. Os limites sobre o grau de alavancagem que ela pode assumir complicam sua tarefa de atender as retiradas: manter sua relação de alavancagem estável significaria vender cerca de US$ 1,1 bilhão em propriedades para gerar US$ 500 milhões para retiradas, após o pagamento de dívidas.
O grupo vendeu US$ 2,2 bilhões em propriedades em 2023. Se ele vendesse novas propriedades a valores menores do que assumiu, uma reavaliação para menos do valor de seus ativos também agravaria os números de sua dívida.
Mesmo depois das vendas de imóveis em 2023, as despesas com juros do Sreit subiram 12% em relação ao ano anterior, para um recorde de US$ 154 milhões no primeiro trimestre de 2024, alimentadas por retiradas adicionais de suas linhas de crédito, sobre as quais ele paga juros de mais de 7,5%.
Fonte: Valor Econômico
