Por Gabriel Caldeira — De São Paulo
28/09/2023 05h03 Atualizado há 4 horas
Investidores nos Estados Unidos têm sido lenientes com a resiliência apresentada pela economia do país nos últimos meses, a despeito da campanha de aperto monetário do Federal Reserve (Fed) que elevou o juro básico local ao maior patamar desde 2001, segundo avaliação de Bhanu Baweja, estrategista-chefe do UBS Investment Bank. Para ele, os efeitos da alta de juros ainda serão plenamente sentidos pela economia real americana, o que resultará em indicadores mais fracos à frente e uma correção que se estenderá para os mercados de ações e renda fixa, com chance de o índice S&P 500 cair até 12% em relação aos seus patamares mais elevados em 2023.
Baweja enxerga os mercados americanos precificando um cenário de inflação comportada e atividade resiliente à frente, mesmo não tão forte. “Embora seja uma imagem bonita, é uma imagem estática. Seguindo em frente, acho que muitas coisas vão mudar”, diz o estrategista em entrevista exclusiva ao Valor. O profissional visitou o escritório do UBS em São Paulo para um evento com clientes organizado pela sede do banco suíço.
Na visão de Baweja, os investidores americanos têm “extrapolado” para o futuro o cenário otimista descrito por ele, e a continuação dos efeitos do aperto monetário e o esgotamento do dinheiro disponível para o consumo nos EUA apontam para uma economia mais fraca nos próximos meses. Especificamente em relação ao mercado acionário, o estrategista entende que os preços das ações em Nova York estão muito esticados em relação ao nível dos juros. Somando esses três fatores, ele acredita que o S&P 500 deverá cair entre 10% e 12% desde a sua máxima de 2023. Em agosto, o índice recuou 1,77%, e até aqui acumula baixa em torno de 5% em setembro.
Os “valuations” das ações do setor de tecnologia em Nova York estão particularmente elevados, segundo Baweja. Embora assuma visão otimista quanto ao setor a longo prazo, ele argumenta que os lucros esperados pelo mercado para o próximo trimestre não são compatíveis com o que as empresas podem entregar, e os preços das ações refletem múltiplos consistentes com juros reais negativos nos EUA.
Com as ações americanas sobrevalorizadas, o estrategista destaca sua preferência por títulos de renda fixa. “Preferimos títulos a ações porque o prêmio de risco das ações [indicador que mede o retorno adicional em relação ao de um investimento seguro em Treasuries] está chegando perto dos níveis mais baixos dos últimos 100 anos. Os dois únicos períodos em que ele foi ainda mais baixo foram antes da Grande Depressão de 1929 e antes do estouro da bolha da Nasdaq no final da década de 1990”, destaca Baweja.
O estrategista recomenda a compra de Treasuries de prazo mais longo, como a T-note de dez anos. Os rendimentos do título têm batido seus maiores níveis desde 2007 repetidas vezes este ano, sob a percepção de que o Fed manterá os juros altos por conta da economia resiliente nos EUA. Assim, Baweja recomenda a compra antes que o mercado de renda fixa também se ajuste ao enfraquecimento da atividade.
“Os mercados estão extrapolando o forte crescimento atual não apenas em ações, mas também na renda fixa, onde realmente não se espera que as taxas caiam. Embora os juros venham a cair lentamente, acho que elas cairão muito mais rápido do que o que os juros futuros estão sugerindo”, projeta.
A leitura de Baweja conflita com as últimas sinalizações dadas pelo Fed de que manterá os juros acima de 5% até o fim de 2024. Alguns dirigentes do banco central americano chegaram a ponderar sobre estender o aperto monetário caso a inflação não responda como esperado.
Ao contrário do mundo desenvolvido, boa parte das economias emergentes já começou a cortar juros, entre elas o Brasil. Para Baweja, isso abre espaço para algumas oportunidades no país, mas o mercado local de renda fixa ainda tem a preferência do estrategista em relação às ações brasileiras e ao real.
Enquanto os juros globais seguem puxando os rendimentos da renda fixa doméstica e pesando sobre o Ibovespa, Baweja considera ideal manter a posição comprada em contratos de Depósito Interfinanceiro (DIs). Se as previsões do UBS se confirmarem, porém, as ações podem ganhar fôlego com o ciclo de cortes de juros pelo Banco Central. “Nesse momento, podemos reconsiderar a compra de ações. Atualmente, porém, achamos a renda fixa mais atraente, em um momento em que a demanda doméstica está boa, mas não espetacular”, avalia.
Já em relação ao real, Baweja considera “difícil” que o câmbio local tenha desempenho superior a moedas pares nos próximos seis a 12 meses, uma vez que espera cortes de juros mais agressivos pelo BC do que pelo Fed. Assim, o diferencial de juros em relação aos EUA vai diminuir, o que tende a reduzir a atratividade da moeda brasileira.
Fonte: Valor Econômico

