Por Valor, com Nikkei Asia — São Paulo
07/08/2023 12h37 Atualizado há 16 horas
Relatório do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais de Washington (CSIS, na sigla em inglês) adverte que os EUA e seus parceiros têm sido lentos para identificar e combater a guerra política da China. Um dos casos que apontam para essa evidência veio à tona na semana passada, quando o Departamento de Justiça dos Estados Unidos anunciou que dois militares da Marinha dos EUA foram presos sob acusação de compartilhar segredos de Estado com a China em troca de dinheiro, o que se tornou novo capítulo das investidas do líder chinês Xi Jinping.
As informações enviadas à China supostamente por Wenheng Zhao e Jinchao Wei, que tinham autorizações de segurança dos EUA, incluíam projetos de um sistema de radar em Okinawa, Japão, e detalhes das modificações na cabine de comando do navio de assalto anfíbio USS Essex.
Esses casos de espionagem podem ser considerados parte do que o diplomata americano George Kennan descreveu como “o uso de todos os meios sob o comando de uma nação, menos a guerra, para atingir seus objetivos nacionais”.
Atividade sem precedentes
O novo relatório do CSIS, intitulado “Competindo sem lutar: a estratégia de guerra política da China”, ressalta essas estratégias. Embora todos os países se envolvam em algum nível com a guerra política, o tamanho e o escopo da atividade de Pequim não têm precedentes, segundo os autores da pesquisa, liderados pelo vice-presidente sênior do CSIS, Seth Jones.
Um exemplo disso foi o caso de Daryl Morey, gerente geral do time de basquete Houston Rockets, que expressou apoio aos manifestantes de Hong Kong, em 2019, ao escrever “Fight for Freedom”. Isso levou uma “turba de trolls” a atacar o executivo, com mais 170 mil tweets enviados da China.
As contas pró-governo da China mencionaram Morey mais de 16 mil vezes e aproximadamente 4,7 mil das respostas incluíram “NMSL”, um acrônimo chinês que significa “sua mãe está morta”. “Este alto volume de atividade é ainda mais anômalo, dado que o Twitter foi banido na China”, disse o relatório.
Invasões de campanhas americanas
Outro exemplo trazido pelo relatório é como entidades ligadas ao governo chinês invadiram as campanhas presidenciais de 2008 do senador John McCain e o do então senador Barack Obama, para obter informações sobre a política em relação à China de cada candidato. Um item aparentemente roubado foi rascunho de carta de McCain para Ma Ying-jeou, o recém-eleito presidente de Taiwan, no qual McCain prometeu apoio ao relacionamento EUA-Taiwan.
Antes que a equipe de McCain finalizasse a carta, a Embaixada da China ligou para reclamar, segundo o relatório, que cita Randall Scriver, então assessor de campanha de McCain. “Certamente me pareceu estranho que eles estivessem tão bem informados”, lembrou Scriver.
“A guerra política inclui ferramentas de Estado que os governos podem usar para mudar o equilíbrio de poder a seu favor sem lutas, como desinformação, operações cibernéticas, operações de inteligência e coerção econômica”, diz o relatório. Se bem-sucedida, a guerra política pode ser muito mais barata do que a força bruta, que muitas vezes pode ter altos custos.
Reposta a Pequim
A equipe do CSIS propõe a criação de um órgão no Conselho de Segurança Nacional para coordenar uma resposta aos esforços de Pequim de desestabilizar o país. A equipe deve identificar as vulnerabilidades chinesas e explorá-las, enfraquecendo o poder, a influência e as relações da China no exterior, segundo os autores do relatório.
As sugestões incluem abrir um buraco no Grande Firewall da China – que bloqueia ou censura centenas de milhares de sites e aplicativos – para permitir que o povo da China acesse sites como Google, YouTube, Instagram, Reddit, Wikipedia, WhatsApp e LinkedIn.
Os EUA precisam “aumentar os recursos e o apoio a programas que forneçam assistência tecnológica e de outra natureza a indivíduos e organizações dentro e fora da China para romper o Grande Firewall. As populações geralmente desejam acesso a outras fontes de notícias, não apenas informações da mídia controlada pelo Estado”, segundo o relatório.
Objetivos da China
O objetivo da guerra política da China é claro, segundo os autores: expandir a influência do Partido Comunista Chinês e enfraquecer os EUA e aliados. Mas eles também enfatizam que um dos objetivos da guerra política é evitar conflitos armados.
“A China sob Xi Jinping está preocupada de forma incomum em proteger sua imagem no exterior e combater as críticas”, diz o relatório. Isso pode ser em parte um desejo de preservar o governo do partido e evitar a oposição e a instabilidade doméstica, observa o documento.
O CSIS também aponta que a China entende os EUA muito melhor que os EUA entendem a China.
“Pequim investe recursos substanciais para entender os Estados Unidos”, diz o relatório, “inclusive na tradução de documentos e na exploração dos contornos da cultura e política dos EUA”. Para Washington, fazer mais para entender como a China vê a concorrência com os EUA pode ser um primeiro passo.
Fonte: Valor Econômico

