16 Feb 2023 CÍCERO COTRIM SÃO PAULO THAÍS BARCELLOS BRASÍLIA
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse ontem que o governo deverá anunciar em março a nova regra fiscal que substituirá o teto de gastos. Antes, ele havia prometido apresentar a proposta até abril, para que fosse discutida com a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).
Em evento do BTG Pactual, Haddad disse que a ideia de antecipar a nova regra foi dada pela ministra do Planejamento, Simone Tebet, e pelo vice-presidente e ministro do Comércio, Indústria, Serviços e Desenvolvimento, Geraldo Alckmin. Eles defenderam que seria positivo discutir a regra antes de apresentá-la ao Congresso.
O ministro disse que nenhum outro país adota uma regra como o teto de gastos, mas defendeu uma nova âncora exigente no Brasil. “Eu sou a favor de metas exigentes, porque, se não, você não trabalha. Se você botar meta de inflação, meta fiscal, não demandante, o Estado para de trabalhar. Então, tem de ser demandante, tem de ser rigoroso, tem de ser exigente, mas um ser humano tem de conseguir fazer aquilo”, disse.
Haddad não deu nenhum detalhe sobre a nova regra fiscal. Mesmo assim, foi suficiente para melhorar o humor do mercado financeiro: o Ibovespa, que havia aberto o dia em queda, apresentava alta depois das declarações e fechou o pregão na casa de 109.600,14 pontos, com alta de 1,62%. Ao Estadão, o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, defendeu a fixação de uma regra de controle de gastos no novo arcabouço fiscal.
Para o economista André Perfeito, a fala do ministro soou como música aos ouvidos do mercado. “A percepção é de que, como já havia comentado, de fato a Fazenda e o Banco Central (BC) estão trabalhando juntos para baixar os juros. O episódio das rusgas entre BC e Planalto está praticamente superado”, comentou. “Falta muito ainda para concretizar as iniciativas apontadas, mas o mercado agora tem assuntos ‘concretos’ para debater”, afirmou.
HARMONIA. No evento, Haddad disse também que faz parte do seu trabalho harmonizar a política fiscal com a política monetária e construir a narrativa sobre o tema. “Esse jogo de construção de narrativa, de harmonização das políticas fiscais e monetária, de harmonização do discurso do Estado com a sociedade, isso faz parte do trabalho do Ministério da Fazenda, não faz parte do trabalho de um economista necessariamente”, afirmou.
Ao falar sobre a reforma tributária, Haddad disse que um sistema coerente reduziria a possibilidade de que políticos ajam para beneficiar setores específicos. “Como você não tem um sistema tributário coerente, ninguém vai notar um parafuso em um Frankenstein. É isso que está acontecendo no Brasil: você tem um monstrengo e vai colocando um parafuso, ninguém nota”, disse. Ele acrescentou que os benefícios tributários estão entre as principais causas de distorção do País e que a complexidade do sistema tributário causa litigiosidade.
Haddad afirmou também que a ansiedade do mercado com as primeiras medidas do governo é compreensível. “Entendo ansiedade do dito mercado, essa meninada que fica na frente do computador dando ordem de compra, ordem de venda”, disse Haddad. “Cada espirro lá gera uma enorme turbulência.” Ele afirmou ter dito ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva que o início do governo seria difícil, mas a incerteza iria se dissipar à medida que novas medidas na área econômica fossem anunciadas. •
No mesmo evento do BTG Pactual em que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, prometeu adiantar o substituto do teto de gastos, ontem, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), afirmou que um eventual texto “radical” sobre o novo arcabouço fiscal não terá sucesso no plenário do Congresso. Na visão do deputado, a âncora deve ser “razoável”, “equilibrada” e “moderada”.
“Eu não canso de dizer que o próprio ministro (Fernando) Haddad se sentou numa mesa com todas as lideranças da Câmara na discussão da PEC da Transição, e fizemos um acordo para que o texto que vier (do arcabouço fiscal) seja um texto médio, que possa angariar apoio de base de mudança constitucional, ou seja, um texto radical para um lado ou para outro não terá sucesso no plenário do Congresso”, disse Lira, no evento. “Esse compromisso foi feito na presença de todos os líderes, da oposição ao governo, para que o Ministério da Economia (Fazenda) e do Planejamento possam fornecer ao Congresso Nacional um texto médio, conceituado, razoável, equilibrado, que trate de responsabilidade fiscal sem esquecer a justiça social, mas não descambe nem para um lado, excessivamente, nem para outro, que seja um texto moderado”, emendou.
AUTONOMIA DO BC. Em meio às críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Banco Central (BC), Lira voltou a afirmar que não vê no Congresso nenhuma possibilidade de mudança em relação à autonomia do BC. O deputado disse acreditar que Lula e o presidente do BC, Roberto Campos Neto, “são duas pessoas que vão saber dialogar”.
Na visão de Lira, as tratativas públicas sobre a política monetária não ajudam a economia. “Foi um avanço, uma conquista dos últimos anos. Acho que o Brasil caminha na direção do que o mundo pensa. O Banco Central independente cuida da nossa moeda, cuida do sistema monetária. É lógico que ninguém está acima de qualquer crítica. Eu penso, tanto pelo que eu conheço do presidente Lula, recentemente, nas conversas que tivemos, como do presidente Roberto Campos, que são duas pessoas que vão saber dialogar”, disse Lira.
O presidente da Câmara afirmou não ver problema em Campos Neto ir ao Congresso explicar a taxa de juros, como querem parlamentares do PT e de outros partidos governistas, mas disse que a ida do banqueiro central ao Legislativo não pode ocorrer por “achismos” e questões ideológicas. “Mas eu tenho certeza de que, se houver um convite, pelas conversas e pelas entrevistas que eu ouvi, com bastante sensatez, ele vai, e essas coisas se esclarecerão”, declarou Lira. •
Fonte: O Estado de S. Paulo

