Por Adriana Cotias — De São Paulo
10/11/2023 05h05 Atualizado há 6 horas
O câmbio brasileiro parece desvalorizado quando se olha para as projeções para o setor externo no ano que vem, segundo Fabiano Rios, sócio-fundador e executivo-chefe de investimentos (CIO) da Absolute. Ao participar com outros gestores de painel do Macro Vision do Itaú BBA, o executivo apontou que as estimativas recém refeitas pela casa apontam uma conta corrente equilibrada em 2024, “um evento raro, principalmente para economias emergentes”. Sob esse diagnóstico, o real é uma das principais posições do multimercado da asset.
Para a balança comercial, o gestor espera um superávit da ordem de US$ 100 bilhões neste ano. “Este é um momento muito especial. Houve uma desvalorização muito forte nos últimos quatro, cinco anos, em grande parte pelo diferencial de juros [local e externo], que chegou ao menor nível com 2% de taxa nominal, algo impensável”, disse Rios. Em comparação ao peso mexicano, a moeda brasileira teve uma depreciação de 50% em cinco anos, citou, “não é pouca coisa”. Se o Banco Central (BC) brasileiro for cuidadoso no processo de cortes da Selic, há uma boa probabilidade de o real ganhar valor. Ele não arriscou um número. Ontem, o dólar comercial era cotado a R$ 4,9409 – queda de 6,4% no ano.
O exemplo do Chile – que começou a cortar a taxa básica de juros num ritmo mais acelerado, em 1 ponto percentual, e depois teve que reduzir o passo para 0,75 e 0,50 ponto percentual a fim de conter pressões sobre sua moeda – reforça a percepção de que não haverá “aventuras” no Brasil no campo monetário. “É difícil dizer o tamanho do ciclo, depende de lá fora, mas uma conclusão é que o BC tende a ser mais cauteloso, tirou a expectativa que o mercado tinha de que ele aceleraria o ritmo.”
Há muitos paralelos do Chile com o Brasil, disse André Raduan, sócio-fundador e gestor da Genoa Capital por causa da redução do diferencial de juros com os Estados Unidos. “À medida que a economia americana se mostre resiliente e mantenha a taxa de juros elevada, a eficiência da política monetária é testada”, comentou.
A baixa alavancagem de empresas e famílias, que se financiaram a custos menores num passado recente, é uma das razões que levaram as taxas futuras dos títulos do Tesouro americano, os Treasuries, para cima, prosseguiu Raduan. E isso coloca um piso para os juros do resto do mundo, afirmou o gestor. “É o ‘risk free asset’ [a taxa livre de risco] do mundo. É difícil imaginar que o Brasil vá pagar taxas parecidas com às dos EUA, o canal é o câmbio mesmo”, disse.
Para o gestor, o que se viu no Chile foi um teste desse novo mundo. “O país até poderia ter taxas mais baixas porque teve uma desaceleração econômica forte, tem um fiscal arrumado, mas uma taxa terminal perto de 5%, menor que a dos EUA… daí viu a moeda se desvalorizar.”
Raduan acha que o BC brasileiro tem sido, acertadamente, cauteloso no seu ajuste e que pode levar a Selic a 9,5% ou 9% ao ano em 2024. “Se for rápido, enfrenta as taxas altas nos Estados Unidos, se mais devagar, vai encontrar uma taxa mais baixa lá na frente quando os EUA já estiverem pensando em cortar.”
Embora a inflação corrente esteja muito baixa, os vetores que provocaram a desinflação recente não vão estar presentes em 2024, alertou Raduan. Ele calcula um aumento de gastos públicos da ordem de 8% em 2023 e de igual proporção no ano que vem, em função de fatores como a conta dos precatórios e o ajuste do salário mínimo. Os dados de crédito divulgados nesta semana também vieram mais positivos, “o ciclo parece estar virando”, comentou. “Houve uma melhora real, não dá para desprezar, mas para frente o BC tem que terminar [o processo de redução da Selic] com uma postura restritiva, daí tem chance de dar certo.”
Carlos Woelz, sócio-diretor da Kapitalo Investimentos, disse que o BC não necessita dar uma diretriz precisa sobre os próximos passos, como fez após a última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) ao apontar que a redução de 0,5 ponto percentual da Selic, na semana passada, é apropriada para as duas próximas reuniões. O que importa, a seu ver, é o orçamento que o BC tem na cabeça, fazer a comunicação não explicitamente, mas pelos seus modelos de comparação de cenários – assim mantém graus de liberdade para mudar de ideia. O gestor considera que uma Selic entre 9% e 10% ao ano será suficiente para trazer a inflação para perto da meta em 2024.
“Hoje, a política do BC está correta, muito baseada em números. Num momento de mudança gradual [da diretoria], espera-se que mantenha o máximo possível o arcabouço atual”, afirmou Woelz. Para ele seria inútil gerar uma recessão para ancorar as expectativas na véspera das alterações no colegiado porque o “novo BC vai ter que se provar de qualquer jeito”.
O mandato do presidente do BC, Roberto Campos Neto, termina no fim de 2024, mas antes, no início do ano, dois novos nomes vão compor os encontros do Copom: Paulo Picchetti, na Diretoria de Assuntos Internacionais e Gestão de Riscos Corporativos, e Rodrigo Alves Teixeira, que vai assumir a Diretoria de Relacionamento, Cidadania e Supervisão de Conduta. Os primeiros escolhidos pelo governo Lula para a autoridade monetária foram Gabriel Galípolo (Política Monetária) e Ailton Aquino (Fiscalização), que ocuparam seus cargos em julho.
Woelz comentou que o juro real de curto prazo a mercado é um dos mais altos dos últimos anos. Como seus colegas, ele disse não ver problemas no câmbio que poderiam contaminar os índices de inflação. A dúvida é se lá fora a taxa de equilíbrio vai ser mais alta ou se a defasagem entre as elevações de juros e os efeitos na economia ganhou um novo timing. “O Fed parece estar apostando nisso. Há uma chance grande de desaceleração global e ficar aplicado [apostando na queda dos juros] no curto prazo é bom”, afirmou. “O preço é razoavelmente conservador e há chance de pegar o movimento de virada global e levar a níveis mais baixos.”
Fonte: Valor Econômico

